O sortilégio da globalização ou o dilema dos "poras" (Clicar na foto)
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O inicio da «World Cup» traz-me um registo de memória mais ou menos dissimulado pelo tempo que vai inexoravelmente passando sobre nós.
Porque conheço profundamente a África do Sul, país que me acolheu quando a minha voluntariosa e ingénua juventude foi informada de que eu tinha perdido uma guerra que, em Angola, já ninguém dava por ela. Fui à vida e o acolhimento que tive foi logo uma primeira lição. Porque em vez de choradinho, caridade e solidariedade politicamente correcta aprendi que o melhor acolhimento que se pode dar a um necessitado é dar-lhe os meios para trabalhar, numa lógica de vantagem mútua. E foi assim que tive o privilégio de trabalhar e conhecer um país fantástico, onde aprendi o conceito de rigor, o respeito pela primado da competência e profissionalismo, a consciência pelo return on investment (sendo que o meu investment era o meu trabalho) e uma expressão que registei a partir de um anúncio de uma marca de cigarros: Best Value for Money.
Conheci o país de Norte a Sul, seja de Potchefstrom a Cape Point e de Leste a Oeste, ou seja do Transkei a Walvis Bay, na altura ainda parte da SWA. Por estrada e por avião. Numa primeira estadia no Natal, percorri, em trabalho, cidades como Dundee, Vryheid, Newcastle e Pongola. Conheci Umhlanga Rocks (onde assaltaram os gregos e pronuncia-se Humshlanga)…), Elangeni, Thousand Hills, Pietermaritzburg (para quem não sabe, a capital do Natal e não Durban), a Zululand. Passeei de barco em Midmar Dam e subi ao topo do Drakensberg por Sani Pass, chegando mesmo a conhecer Maseru, capital do Lesotho. Viajei vezes sem conta entre Durban e Johannesburg, extasiado pela paisagem e pela qualidade das auto-estradas, passando por Escourt (terra do bacon), Mooi River, Ladysmith, Harrysmith, Bethelem (já no Free State) e, no Reef, conheci as «pedras da calçada» desde o Lion Park a Kyalami (onde assisti à primeira corrida do Rubinho Barricelo e que me foi apresentado por uma amiga comum), Halfwayhouse (restaurante com maior número de pratos do dia do mundo), Hartbeespoortdam (onde vi asa delta pela primeira vez), os jacarandás de Pretoria, o cenário característico das minas de ouro esgotadas e devidamente enquadradas paisagisticamente com «capim Guatemala». Johannesburg itself, com o espantoso Carlton Centre, Hillbrow, os northern Suburbs de Sandton, Randburg, Rosebank e Marlboro, a opulência de Houghton e townships como Alexandra, Tembisa e Soweto, locais que a propaganda actual diz que eram vedados a brancos…) e, já agora, até uma filha me nasceu em Kempton Park. Fui a Suncity primeiro e Lost City mais tarde (passando por Krugersdorp e pelo actual quartel-general dos nossos futebolistas em Magaliesberg), percorri o antigo Western Transvaal e a paisagem idílica de Neslspruit a White River, Barberton, Hazyview, Sabie, o inevitável Kruger Park e fiz algumas vezes o trajecto Johannesburg/Capetown de carro. Ceres (terra dos sumos), deserto do Karoo, Beaufort West, Paarl (vinhas, vinhas e mais vinhas…), Somerset West e Stellenbosch (universidade), Hermanus, Strand, Gordon´s Bay (fabulosa), Hout Bay (igualmente fabulosa e os seus fabulosos fish platters e, de caminho, contemplando as focas nadando por ali…), Mossel Bay e, seguindo depois a Garden Route até Durban, passando Knysna, Port Elizabeth e East London ao longo de, quiçá, uma das mais belas estradas do mundo, são nomes de locais que conheci bem e que registei com emoção.
Podia escrever três vezes mais linhas falando deste país, de pessoas, de assistência média, do «apartheid», dos problemas sociais, do clima, da orografia, um pouco de História e da guerra, da gastronomia, da cultura, mas isto chega para dar o enquadramento à emoção que hoje sinto em rever locais que a televisão me mostra a propósito da World Cup. Toda aquela gente, os carros, os locais onde estão implantados os estádios, o sotaque, os braais e até os assaltos aos hotéis fazem parte de um fenómeno muito próprio, propício a uma análise epistemológica e muito familiar. E por tudo o que disse no princípio do post e pela proximidade gerada por este campeonato do mundo aqui deixo um genuíno
Gaan na Bafana Bafana, toon die "buggers" hoe eg sokker gespeel word. Leer hulle'n les wat hulle nooit sal vergeet nie
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Etiquetas: futebol, South Africa