domingo, setembro 03, 2017

Os "tudólogos" a piar com alacridade e violentos fluxos hormonais



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Não sou obrigado a simpatizar pessoalmente com Cavaco para admitir, sem rebuço, que foi um homem sério, não me roubou (como aconteceu com inúmeros casos de socialistas), produziu obra válida (mau grado a corrente que o acusa das maiores malfeitorias relativamente às pescas e à agricultura) e demonstrou sempre um elevado sentido de Estado, ao mesmo tempo que era frequentemente acossado, como uma lebre perseguida por uma matilha de cães treinados e respectivos caçadores, tocando cornetas e montando cavalos ajaezados de hipocrisia e mau perder.

Cavaco fez um discurso na Universidade de Verão. Li, reli e tornei a reler. Não consegui encontrar qualquer mentira, num discurso meio pobre, num estilo conhecido (mas é o seu estilo) e sem ofensas, mas com evidentes referências a factos que todos nós conhecemos mas que todos nós parecemos perdoar ou, até, achar graça.

O Carmo caiu, a Trindade ruiu. O homem usou o termo “piar”, o homem não citou nomes e estabeleceu paralelismos com outros políticos, incluindo Macron (um presidente de quem ainda não se sabe o que sai dali, Daniel Oliveira dixit)), o homem foi grosseiro e, heresia provinciana, não guardou o respeito institucional devido à forma de referência a sucessores e a antecessores.

Em dois programas de ontem, o Governo Sombra e o Eixo do Mal, Cavaco foi atacado com ferocidade e, que me lembre, apenas Luís Pedro Nunes achou o discurso apropriado e isento dos pecados que os companheiros da alegria do Eixo apontaram com mesquinhez, maldade e evidente parvoíce. Pedro Marques Lopes, um homem que me faz questionar a minha secreta dose de masoquismo por conseguir, ainda, vê-lo ou ouvi-lo, esse então estava possesso e com o seu grau de fúria, se comparado a uma bebedeira, era de coma alcoólico. No Governo Sombra a coisa não foi tão mazinha, até porque razoavelmente disfarçada pelo toque de humor sempre presente, mas isso não amenizou a verrina do RAP, genuinamente embevecido por malhar em Cavaco.

Num país em que abundam a má criação, o mau perder, o vernáculo, a mesquinhez, a ameaça de uns murros, a fraude e a chocarrice idiota de um primeiro-ministro a que se convencionou chamar de hábil, acolitado por uma colecção de “kiss-asses” sem pudor, é estranho ver um grupo de personalidades de televisão explanar uma crítica tão virulenta e com sanha e rancor contra quem mais não fez que um comentário político, em que o pecado maior parece ter sido dizer que os revolucionários “piavam”.


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quinta-feira, agosto 31, 2017

Saudade de gente séria



[6172]

Aníbal Cavaco Silva pode ser feioso, comer bolo-rei com a boca aberta e meio chato na fonética. Mas tem a grande virtude de ser honesto, ter um elevado sentido de Estado  e não precisar de se socorrer de ideologias frustes para dizer o que tem a dizer, em regime factual que só os imbecis ou os mal intencionados poderão rejeitar.

É mais ou menos por isso que se verifica o aparecimento dos porta-vozes do costume ou a habitual verrina das redes sociais que o melhor que arranjaram para criticar Cavaco foi o silogismo do uso do verbo piar, durante a sua intervenção na Universidade de Verão em Portalegre. Em todo o caso uma retórica bem distante e isenta das javardices em uso e abuso de grande parte dos socialistas, desde o vernáculo de Sócrates e Ferro Rodrigues ao marialvismo de Jorge Coelho, Guterres, João Soares e outros que partem as fuças a toda gente oferecem murros e bofetadas ou à pesporrência do falecido Soares, uma espécie de rei sem coroa que ralhava com polícias e produzia alarvidades pouco consentâneas com a sua condição de figura institucional.

É isso. Cavaco falou e disse umas quantas verdades. E a “esquerdofilia” (perdoe-se-me o palavrão) que sossegue e se contenha de dizer disparates. Mesmo comendo bolo-rei de boca fechada. Porque o que Cavaco disse é factual, não é ideológico. E pôs o dedo na ferida. Aliás, em várias feridas. Que nem a loquacidade e o destempero de Marcelo escaparam.

Tenho saudade de gente séria.


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sexta-feira, março 09, 2012

A esquerda iracunda

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O termo «virgens ofendidas» está gasto, é corriqueiro, cliché, fora de uso, redundante, de mau gosto, o que for. Mas não me ocorre outro mais adequado ao corropio da nata da esquerda bem pensante sobre as considerações que Cavaco Silva fez no prefácio do seu livro «Roteiros». Cavaco disse que Sócrates foi desleal a propósito do último PEC. Sócrates ser desleal não é grave por aí além, nem sequer nada que dele não se esperasse, conhecida a peça, o problema é que o ex-primeiro ministro foi institucionalmente desleal e isso é particularmente grave. Porque envolve as instituições e, no caso, a mais alta instituição do Estado.

O bruaá que por aí vai, assim, não é mais do que uma manifestação de claque que não se detém em matéria factual e berra pelas cores da camisola, com a mesma desfaçatez com que insultaria a mãe de um qualquer árbitro de futebol. E quando digo matéria factual refiro-me à dificuldade que tenho em admitir que esta rapaziada socialista que brame aqui pela blogosfera, jornais e televisões não saiba, claramente, que Sócrates é desleal, desconfiável e pouco sério. Sempre foi, não percebo onde está a novidade.
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segunda-feira, setembro 26, 2011

O sorridente gado açoriano

[4425]

Votei Cavaco. Por exclusão de partes, é certo. Mas hei-de reconhecer que me revia na sua seriedade e competência técnica. O tempo, porém, encarregou-se de me estilhaçar a imagem. Cavaco parece-me ser claramente vácuo, de uma ausência e irrelevância arrepiantes e, tal com ainda agora demonstrou na sua viagem aos Açores, meio apatetado perante as investidas de um tiranete idiota e mal formado como Carlos César, que fez do Presidente gato-sapato e não se ensaiou nem um bocadinho para o ofender pessoalmente e aos portugueses que votaram nele.

É a política no seu melhor, são os nossos políticos na sua expressão mais genuína de mediocridade e arrogância de quem nada mais tem para exibir do que isso mesmo. Para além de uma insuportável malquerença, só comparável à das claques de futebol.

Cavaco, nos Açores, foi ignorado, enxovalhado e a única coisa que lhe ocorreu foi referir o sorriso das vacas açorianas contemplando, com deleite, os prados verdes das ilhas. Já uma vez Cavaco se exaltara com o passo estugado de outras vacas a caminho da maquineta que lhes sugaria as tetas por uns minutos. Se eu fosse malicioso diria que Cavaco tem um fascínio acentuado pelo gado vacum. Como não sou, fico-me pelo desencantamento do único homem em que eu votaria nas últimas eleições presidenciais. Convenhamos que é um desalento.
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segunda-feira, janeiro 24, 2011

O verniz


[4038]

Dum comentário que deixei num confrade muito estimado e que por se ajustar a alguns outros confrades que me privilegiam com a sua amizade e leitura, resolvi transformar em post.

- Até ver e salvo «alteração aos estatutos», em democracia ganha quem tiver mais votos. De resto, por um voto se ganha. O exercício recorrente que se faz sobre reacções subconscientes do eleitorado, seja em votos nulos, de protesto ou mera abstenção é perfeitamente inócuo na essência do conceito.

Acresce que na maioria dos casos este exercício se ancora na necessidade (por vezes difícil de entender porque provinda de gente escovada) de se justificar resultados que não são exactamente aqueles que gostaríamos tivessem acontecido, ainda que eu admita que não seja o caso vertente. Cavaco Silva é um caso gritante de como a maioria de um povo vota nele e de como o verniz intelectual acha que esse povo foi uma grandessíssima besta, o que é um manifesto exagero, que nem a morte de Mark Twain. Mas a democracia é assim. E o verniz, também. A democracia tem-se aguentado. O verniz... de vez em quando estala.

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Não há muito mais a dizer...


[4037]

Não vou perder muito tempo com o resultado das eleições. Apenas desfio umas quantas reflexões:

1 – Cavaco Silva ganhou bem. Porque teve a maioria dos votos e, tanto quanto julgo saber, ainda é assim que se ganha as eleições;

2 – Cavaco Silva fez uma campanha limpa, educada e elegante, mau grado não ser reconhecidamente um tribuno para inflamar as hostes como as hostes gostam de ser inflamadas. Ignorou as diatribes dos outros cinco candidatos, «marretas» de serviço ao guião, com a honrosa excepção ao candidato comunista que, seguindo embora as linhas programáticas, pelo menos não perdeu a compostura e mostrou ser uma pessoa educada;

3 – Cavaco Silva deixou-se empolar no discurso da vitória e não resistiu em reagir à vileza da campanha. Poderá ter sido um pouco excessivo, reconheço, mas se ele falou na vileza é porque não há como ignorar que a campanha foi vil - e há alturas na vida em que é preciso chamar os bois pelos nomes;

4 – O folclore da negação da vitória de Cavaco Silva começou segundos depois de se conhecer a projecção dos resultados. Foram tantos os «paineleiros» que de imediato sonegaram o mérito do vencedor para falar em abstenção, problemas de carácter não explicados e o facto repetido à exaustão de que um candidato presidente ganha sempre, que às tantas parecia que Cavaco tinha perdido. Ricardo Costa na SIC Notícias cumpriu bem o seu papel, com aqueles olhitos de esquilo travesso do Central Park e babando-se de vaidade. Também me ficou na retina Miguel de Sousa Tavares, com aquele ar de úlcera péptica e que perorou sobre o ar de «vendetta» de Cavaco. Ficamos assim. E entre a galeria dos preclaros críticos, não posso ainda deixar de referir D. Januário Torgal Ferreira. Na graça do Senhor, na doçura e esperança da Salve Rainha, Mãe de Misericórdia e com a expressão dos degredados filhos de Eva, bolsou uns quantos disparates coléricos sobre a figura do chefe – na circunstância, Cavaco Silva, que é Comandante Supremo das Forças Armadas, onde Torgal Ferreira presta serviço como Bispo;

5 – Dos líderes partidários saliento o discurso inteligente de Sócrates, quando frisou bem que o povo português escolheu a continuidade. Esperemos que o povo seja um bocadinho mais inteligente e que no caso dele não queira a continuidade;

6 – Francisco Louçã tem, necessariamente, que ir ao médico. As veias do pescoço incham, os olhos querem saltar das órbitas, a face ruboriza-se e o homem está claramente à beira de uma crise apoplética um destes dias. Não há que perder muito tempo com semelhante defunto;

7 – Os jornalistas foram iguais a si próprios. A parte cómica foi o homem da SIC, de moto, gritando, com a voz entaramelada pelo frio, que ia tentar que Cavaco baixasse o vidro e dissesse qualquer coisa, 24 de Julho a abaixo. Não sei bem o quê, estava tudo dito. Cavaco não baixou o vidro e o carro acelerou. Uns ingratos, estes presidentes da república;

8 – No país dos «Magalhães» e do Simplex a coisa tinha de dar bota por força da nossa tendência para complicar o que é fácil. Isto nas mesas de voto. Fica por perceber se «a coisa» se ficou a dever à nossa proverbial incúria ou se fez parte de um programa bem mais sofisticado para aumentar a abstenção. Mas também já pouco interessa. De incúrias, estamos esclarecidos e de como os socialistas «salivam» para se meter nestes planos, estamos elucidados.

9 – Eu acho que tanto Carlos César como Santos Silva deveriam demitir-se. Isto se tivessem um pingo de saliva na boca. Terão?

10 – Não é fácil ser prior nesta freguesia. Que não falte a Cavaco Silva o engenho e a saúde para estes cinco anos complicados que aí vêm.

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sexta-feira, dezembro 10, 2010

A alquimia dos idiotas


[3986]

Estava Jardim posto em sossego bebendo a sua poncha e trauteando mentalmente o seu próximo discurso eleitoral, estava Cavaco Silva olhando embevecido para as travessuras dos netos e eis que a blogosfera (alguma) ataca de novo.

Eis senão quando, a trafulhice caciqueira de Carlos César é transformada na listagem de uma série de «malfeitorias» do líder madeirense e do Presidente da República. À boa maneira do futebol, quando o defesa da nossa equipa manda uma tremenda pantufada no avançado que ia marcar golo na nossa baliza, mas desatamos a gritar que o árbitro é uma besta, cheira mal dos pés e aquele avançado (o da quase perna partida…) também já uma vez tinha dado um cotovelada a um dos nosso e nem um sumaríssimo levou.

Eu leio e pasmo. Ainda estive para lincar alguns dos exemplos. Mas acho, verdadeiramente, uma desnecessidade. Tenho a certeza que a maior parte dos bloggers se apercebeu desta pantomina. A de transformar a soltura mental do cacique César na listagem das malfeitorias de Cavaco e Jardim. Estão aqui estão a falar no bolo-rei e na foto de Jardim em cuecas.

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domingo, junho 20, 2010

Patetas e malcriados


Quem acha que Cavaco deveria ter ido ao funeral de Saramago?

[3802]

Uns são patetas, outros são malcriados. Outros, ainda, acumulam. Patetas malcriados o que, convenhamos, é um desiderato pouco invejável. Todos eles afinam pelo mesmo diapasão. Cavaco tinha de ir ao funeral de Saramago. Louçã, esse, chegou a dizê-lo com aquela expressão ameaçadora que costuma usar sempre que diz qualquer coisa. Entenda-se, olhos a saltar das órbitas e «errrrrrres» bem afinados.

Alguém devia explicar a estas luminárias que Cavaco, enquanto Presidente, cumpriu o protocolo. Mandou uma mensagem de respeito pela figura do escritor laureado que faleceu. O mais é folclore da esquerda insuportável, desta esquerda esquizofrénica que na verdade, a única forma que tem de se evidenciar é em berrarias deste género, saudosos, quiçá, das votações de braço no ar. E, claro, de uns quantos repórteres excitados que iam fazendo a pergunta sacramental «…o que acha do Presidente da República não estar presente no funeral?…», sem perceberem que a pergunta, em si, era já um desrespeito assinalável pela figura do falecido. Mas isso não ensinam na faculdade.

Um triste espectáculo!

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sábado, janeiro 02, 2010

A mensagem de Cavaco Silva


Sócrates em traje de domingo

[3561]


Numa empresa, o seu Conselho de Administração jamais produziria as afirmações que o Presidente da República usou na mensagem de fim do ano. Pela simples razão que antes dessas afirmações serem produzidas, os seus principais gestores seriam sumariamente despedidos. Num governo, não é bem assim. Nem o “administrador” tem poderes para actuar em conformidade, nem os gestores têm vergonha na cara para, com uma réstia de dignidade, se demitirem. Daí que, penso, estamos condenados a permanecer na penumbra a que este socialismo, devidamente consagrado pela Constituição e exercido pela mais calamitosa, incompetente e sistematizada equipa governamental de que tenho memória (nem Guterres, valha-nos Deus…) e inexoravelmente condenados ao fracasso e à ignomínia de sermos relegados para a cauda do pelotão dos países ditos ricos e desenvolvidos. Mesmo à beira de uma situação explosiva, como Cavaco claramente avisou.

O discurso de Cavaco tem indubitavelmente a virtude de ser claro e honesto. Mas depois ouvimos a reacção imediata dos seus adversários e percebemos que nada vai mudar. Esta gente não desarma, não desiste e lutará até ao suspiro final pela manutenção do desiderato que laboriosamente construíram e defenderam. Uns. Outros, continuarão a reagir como esta gaja. Só porque sim.


Mensagem de Cavaco, aqui.

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sexta-feira, outubro 02, 2009

Eu já disse e «volto a repetir»: - É por estas e por outras que eu tenho a Helena Matos em elevada conta

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O gajo

Não sei se, como contam os seus próximos, Mário Soares ainda se refere nestes termos a Cavaco Silva. Mas é importante esclarecer que chamar-lhe gajo não me parece nada depreciativo tanto mais que o termo gajo, na fulanização que tem implícita, dá conta daquilo que Cavaco Silva tem sido em Portugal: uma espécie de intruso, um tipo com quem volta e meia se esbarra e que suscita quase sempre uma pergunta meio irritada: “Mas o que quer este gajo?”É preciso que se perceba que o espaço do poder governamental é em Portugal naturalmente socialista. Não por uma qualquer malfeitoria dos socialistas mas sim porque foram os socialistas os grandes vencedores políticos e morais do momento que fundou os compromissos do regime, o 25 de Novembro de 1975. O socialismo que o PS prometia aos portugueses pareceu-lhes tão paternalmente bondoso quanto o Estado Social anunciado por Marcelo Caetano, com a vantagem acrescida de se livrarem de que alguém os dissesse de direita ou estalinistas, pois se ser de direita permaneceu como algo de pejorativo já ser de esquerda, desde que daquela esquerda delimitada pelo PS, tornou-se um traço distintivo pela positiva. A isto que já de si não é nada pouco juntou-se a extraordinária mais valia da aristocrática concepção do poder do pater familias dos socialistas portugueses, Mário Soares. Ver Soares a deslocar-se é talvez o que temos de mais próximo com o que terá sido a naturalidade aristocrática com que D. Carlos devia passear em Vila Viçosa. Mas Soares não trouxe para os socialistas portugueses apenas a concepção de que o poder lhes é naturalmente devido, cultivou-lhes o espírito de corte: há um séquito que lhe repete as graças, as conversas com os grandes do mundo, a maravilha dos quadros que lhe ornamentam as casas, a grandiosidade da biblioteca e, não menos importante, reage ao primeiro sinal de crítica àquele que definem como pai da democracia. Aliás uma das características mais comuns ao PS português é essa noção enraizada de família. Não por acaso o PS foi durante anos um partido de famílias cujos apelidos em muitos casos remontavam à I República e onde, ao contrário do que sucedia nas outras formações políticas à direita e à esquerda do PS, os filhos, desde a mais tenra infância, se reviam e revêem ideologicamente nos pais.Por isso um dos momentos mais simbólicos das últimas eleições é aquele em que Soares terá passado, segundo a definição da propaganda do PS, o testemunho a Sócrates lançando o slogan “Sócrates é fixe”, adaptação desse outro “Soares é fixe” que fixa o momento em que Soares além de fixe foi também feliz e vencedor. É óbvio que Sócrates não é fixe – coisa que está longe de ser defeito! – e Soares não ignorará que aquele que definiu como seu sucessor não acerta uma única vez quando tenta falar dos livros que diz que leu ou dos filmes que diz que viu. Mas o testemunho que passou de Soares para Sócrates nada tem a ver com os gostos ou com as ideias mas sim com a concepção do poder como coisa da sua gente.Naturalmente Cavaco não tem um partido assim atrás de si (o que sendo uma notória fraqueza em momentos como o actual foi também o traço que lhe permitiu chegar a Presidente da República) e de alguma forma ele e Guterres foram os únicos que até agora ousaram enfrentar este statu quo: Cavaco porque não se coibiu de ganhar eleições aos socialistas e Guterres porque não fez tudo o que estava ao seu alcance para manter os socialistas no poder, acabando por se demitir. Por isso, do ponto de vista rosa, Cavaco nunca passará de um gajo e Guterres de um traidor. Quanto a Guterres só o futuro dirá em que medida o PS lhe perdoará o pecado original de ter deixado o poder. O presente esse acontece entre o PS e o gajo. Ou mais institucionalmente falando entre o Governo e a Presidência da República. Ou se se preferir dar nomes às coisas entre Sócrates e Cavaco Silva. Cavaco, que tem o imenso orgulho dos tímidos, aposta sobretudo em que a razão lhe será reconhecida a posteriori, como aconteceu com o Estatuto dos Açores. Resta saber se Cavaco ainda tem tempo pois na relação com os outros poderes não basta a um Presidente da República denunciar os seus motivos de indignação como bem perceberia Cavaco Silva se lesse o discurso de renúncia que um Presidente da República, o general Spínola, redigiu nesse mesmo Palácio de Belém num dia 29 de Setembro, não de 2009 mas sim de 1974. É necessário que o Presidente da República, qualquer que ele seja, tenha consciência do seu tempo de acção. Coisa que Soares teve quando percebeu que podia avançar contra o então primeiro-ministro Cavaco Silva e que teve sobretudo Jorge Sampaio naquele arco temporal que vai do momento em que deu posse a Santana Lopes até àquele instante em que o demitiu. Para já Cavaco tem razão no essencial e Sócrates tem o tempo (e a corte) a seu favor. Mas nada disto é suficiente para saber quem vai ganhar e sobretudo para que o país confie nas instituições.


Helena Matos no Público
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quinta-feira, outubro 01, 2009

'Fogo sobre Cavaco'


[3381]

Pacheco Pereira tenta mitigar aqui na Sábado em linha a inabilidade e fragilidades de Cavaco Silva na sua intervenção e a onda grosseira de fogo de barragem sobre o Presidente. Muito provavelmente não o conseguirá tal o consenso verificado na exprobração das suas palavras. Mas vale a pena ler.

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quarta-feira, setembro 30, 2009

Reciclagem

[3380]

Não tenho nenhum respeito por 80% dos críticos do Cavaco. Não são institucionalistas. São socialistas. Para eles os princípios são instrumentais. Servem para fazer avançar a agenda da esquerda. Julgam que a presidência só está bem entregue se o presidente for de esquerda. Acham-se donos do regime. Quando as mesmas questões foram colocadas contra Sampaio ou contra Soares calaram-se. Não sejamos portanto ingénuos. 80% dos críticos de Cavaco não estão preocupados com as instituições, que desprezam sempre que elas os contrariam. Estão preocupados com a conquista do poder por parte da sua facção. E contra isso, Cavaco ainda é o melhor contra-poder.

João Miranda, no Blasfémias


Só acrescentaria que, para além de tudo isto, os socialistas têm um convívio muito difícil com a decência e a integridade, valores que foram sendo substituídos por um conceito de política como uma técnica que deve poder-se dominar como a hidráulica, a zootecnia, a topografia ou a engenharia civil. Todos os que resistiram á desumanização da política vão sendo paulatinamente depositados no recipiente da respectiva reciclagem.
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sábado, setembro 19, 2009

Custa-me a crer, mas...

[3360]

Posso estar redondamente enganado mas palavra de honra que não consigo imaginar um quadro em que o Presidente da República pede a um assessor para mandar, à sorrelfa, uma nota para os jornais segundo a qual ele, presidente, se queixa de que anda a ser escutado. Não encaixa mas, desde que o outro viu um porco a andar de bicicleta já não digo nada. Peço licença porém para conceder todo o benefício da dúvida a um homem que me habitou à seriedade e lisura de processos. Já o governo não me permite um mícron de confiança, habituado como estou ao seu percurso eivado de mentiras, artimanhas, compadrios, estratégias obscuras, suspeitas, favores, cumplicidades (esta história recente da classificação do juiz Rui Teixeira é absolutamente espantosa e quase não merece notícia…) e cujo primeiro ministro contribuiu decisivamente para adensar o cenário com as sua própria forma de estar e lidar com as questões.

Assim sendo, ainda que admitindo estar errado, toda esta história me parece mais esturrada que uma posta de carne numa panela sem molho, tenho mesmo de referir que não consigo ver Cavaco Silva a conspirar da forma como parece querer-se fazer crer. Ou então está tudo tontinho. E a verdade é que os jornalistas também não ajudam.

Nota: Discordo em absoluto da forma como Cavaco Silva não disse nada, acabando por dizer muito, quando adiou para depois das eleições alguma acção sobre a matéria das escutas. Penso que uma situação delicada como esta mereceria acção imediata. Com eleições ou sem eleições. Mesmo que causasse muito burburinho, fosse ele qual fosse, talvez ajudasse a clarificar muita coisa.
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sexta-feira, agosto 01, 2008

Horror film faces


[2610]

Aceito sem dificuldade que a expressão do professor Cavaco Silva nem precisaria de grandes retoques de make-up para ser usada num filme de terror de segunda categoria. Um Fred contra Jason, um Halloween para adultos ou uma sequela de um Pesadelo em Elm St. Devia ser fácil. Nem grandes enredos nem grandes efeitos especiais. O realizador só precisaria de mostrar o fácies do nosso presidente a ler uma comunicação ao povo português e o êxito seria garantido.

O problema com Cavaco Silva para aqueles que não gostam dele ou acham que todos os que medraram fora do eixo Lisboa-Cascais não reúnem condições natas para serem presidentes de república é que ele tem quase sempre razão. Como teve ontem na comunicação que fez aos portugueses sobre uma questão muito séria e que, aparentemente, estava a passar ao lado de muita gente que tinha obrigação de o perceber. E sobre isso ocorre-me duas questões de fundo: - Uma, a de que pasmei com a quantidade de preclaros comentadores políticos da nossa praça que acharam a comunicação do nosso presidente muito densa, muito complicada, que o povo não a teria percebido, achando-a enfadonha e mais ou menos ininteligível. Curiosamente, muitos desses comentadores são os mesmos que berraram "aqui d’el rei" que o referendo ao tratado de Lisboa era absolutamente essencial, porque o povo não é estúpido. Outra, a de eu ter percebido que a legislação que Cavaco Silva exprobrou e enviou para parecer do Tribunal Constitucional (que lhe deu razão em oito pontos)tinha "passado" tranquilamente por unanimidade.

Daqui retiro o reforço da ideia de que não conseguimos resistir a criticar Cavaco Silva mesmo que caiamos em contradições infantis sobre as capacidades do “povo”. Para além de cada vez mais me convencer que, de duas uma, ou os nossos deputados não têm a mínima ideia do que andam por ali a fazer, analisando os assuntos da Assembleia assim como quem arruma um carro por cima dos riscos num parque de estacionamento de uma grande superfície ou (e isso seria muito grave, mas não acredito, acho que é incúria e incompetência, mesmo…) estariam deliberadamente a torpedear a acção do Presidente.

Nota final: Honestamente direi que o tema abordado pelo presidente não me pareceu denso coisa nenhuma. Precisei apenas de o ouvir com atenção e com mais um par de explicações sobre a matéria, ficar a perceber exactamente do que se tratava.

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