São uns chatos
Agora é o Chipre! Para quem tem um conhecimento frugal de finanças, confinado ao mero orçamento familiar e, com umas piruetas pelo meio, acudir às contas do fim do mês, a ideia que se tinha é que o mundo «ia vivendo» e isso de finanças era lá com os bancos, os governos, as bolsas e outros conceitos mais ou menos longínquos de quem se habitua a pensar em bancos para receber salários e pedir dinheiro emprestado, em governos para fazer as leis, as estradas e receber os impostos e as bolsas um corpo mais ou menos estranho ao comum dos cidadãos onde parece que as pessoas compram e vendem acções.
Num cômputo geral, as pessoas viviam embrenhadas nesta visão simplista daquilo que eram as finanças, sobretudo as finanças dos Estados. Mas eis que, de repente, tudo parece ter mudado. É a Grécia falida, Portugal a ouvir os finlandeses mandarem-nos trabalhar e que não têm nada que pagar as nossas contas, a Espanha «desempregada», a Irlanda, a Islândia, as ricas Itália e a Bélgica parecem estarem «tesas» e até o Obama apareceu na televisão a dizer que não sabia se na próxima terça-feira vai haver dinheiro para pagar salários e pensões. Poucos minutos depois fala-se no Chipre, também. Parece aquelas notícias sobre as gripes que começam aqui, passam para ali, chegaram acolá, os governos compram vacinas (aqui em Portugal, com a nossa tradicional peculiaridade, deitámos fora há dias dez milhões de Euros de vacinas, qualquer coisa ligada a uma ministra de saúde que tivemos, muito preocupada com os portugueses e as portuguesas e mandou vir vacinas com o mesmo à vontade com que vamos à despensa e percebemos que o esparguete acabou) e a grei vai percebendo que qualquer coisa não está bem.
Mal comparado, faz-me lembrar aqueles tempos de liceu em que fazíamos a maior confusão na sala de aula, tudo em pé, a gritar, correr entre as carteiras, rir e, de repente, chega o professor e tudo se aquieta e percebe que a brincadeira acabou. Com as finanças mundiais, tem-se a mesma sensação. Parece que andámos todos a brincar até que apareceram as agências de rating com umas manias esquisitas, põem-nos em vigilância, baixam-nos as notas e desconfiam de nós. As pessoas ouviam falar vagamente de défice, percentagem do PIB, dívida externa, dívida pública e outros palavrões, mas apareciam sempre uns «Jorges Sampaios» salvíficos e sábios que nos acalmavam. Que havia vida para além do défice e que as pessoas e as políticas de proximidade é que contavam. Nunca me interroguei se os Jorges Sampaios do nosso descontentamento acreditavam bem no que diziam, mas acho que sim, que genuinamente boiavam de costas na utopia idiota dos socialismos regeneradores do mal das pessoas, tal como boiamos numa piscina ensolarada ou numa praia romântica do litoral alentejano. E abria-se postos de saúde à esquina das pessoas, escolas onde quer que um pastor de ovelhas tivesse mais de três criancinhas, dava-se emprego toda a gente atafulhando o Estado com funcionários (muitos deles não têm NADA que fazer, literalmente, dito pelos próprios) e criava-se fundações, instituições, organismos, parcerias, centenas (milhares?) de empresas estatais, autárquicas, pulverizou-se o território em freguesias, as vilas passavam a cidades, as cidades eram geminadas e um mundo de servidores do Estado serviam-se no lauto banquete que lhes era servido. Porque havia que sossegar as pessoas com estas tretas dos défices, que para isso é que se inventou o socialismo. O democrático, porque o outro provou-se que era um exagero. Prendia-se, matava-se, reeducava-se, enfim, «aquilo» era um bocado exagerado, até que a esquerda moderna resolveu a coisa com a proximidade, as pessoas e a vida além do défice, para ser paga com o dinheiro dos outros, claro, porque o socialismo sempre achou que há muito dinheiro nos cofres dos ricos e dos poderosos e que a distribuição da riqueza é que estava mal feita. Jorge Sampaio, entretanto, verificou que há vida para além do «há vida para além do défice». É vê-lo a tratar da cultura para Guimarães e percebe-se.
Não sei bem o que isto vai dar. Já vi guerras por menos. Resta-me a esperança de que a Europa está seguir por um caminho mais confiável. Não há líderes, diz-se por aí. Pode não haver mas, à falta deles, parece que os eleitores se vão encarregando de corrigir o tiro e começaram a votar em gente mais realista e, sobretudo, com mais competência e mais respeito pelas pessoas, preocupando-se em resolver os enormes problemas criados pela ingenuidade de muitos e a idiotia de…muitos também, infelizmente. Espero bem que a Espanha se integre no «mainstream» actual da Europa e mande os prosélitos de Zapatero pregar para outra freguesia. São o último baluarte socialista na Europa e estimo e venero que a Europa se aguente assim por uns tempos. Pelo menos até «esta cena das finanças» se compor. Depois, já se sabe, o povo é sábio, vai achar que a direita está há muito no poder, isso e mais uns quantos casos de corrupção que vão certamente aparecer farão o resto. E o resto será mais gente a pensar mais nas pessoas e numa mais equitativa distribuição da riqueza. A tal, dos ricos e dos poderosos.
.
Etiquetas: finanças, torrentes sociais