Em traços largos, poder-se-á dizer que uma democracia
assenta numa matriz básica de funcionamento - o Poder e a Oposição. O Poder
governa e legisla, A Oposição opõe-se, critica, combate.
Em Portugal, como em muitas outras coisas, até neste
desiderato tínhamos de ser originais. Em Portugal, o Poder governa, legisla, em
última análise, pode. Já a Oposição faz o que lhe compete. Opõe-se. Só que, ao
contrário do que seria de esperar, a Oposição opõe-se a ela própria. Não por via
dos Partidos com assento na Assembleia, mas através de uma teia difícil de
definir de órgãos de comunicação social, redes socais e uma parafernália de
meios que sistemática e ferozmente a combatem. Os pivots de televisão, os
comentadores, “paineleiros”, enviados especiais, os jornalistas em geral, os
humoristas, os artistas (?), os intelectuais (??), os professores, os
sindicatos e os próprios Partidos no poder e inúmeros outros agentes fazem uma
permanente e agressiva oposição à Oposição. O que era suposto (expressão muito
em voga no léxico socialista) era que que a Oposição fizesse oposição ao Poder.
Em Portugal é o contrário. Os últimos dias têm sido um exemplo raro disto
mesmo. A Oposição é acusada de tudo e um par de botas, muitas vezes de uma
forma tosca mas, surpreendentemente, eficaz. Ainda ontem a Quadratura do Círculo
(uma tortura que me auto-inflijo sem eu perceber bem porquê) foi um bom
exemplo, quando o governo anterior parece amarrado a um totem com os “quadraturos”
dançando, ululantes, à sua volta, prontos para lhe arrancarem o escalpe, ao
mesmo tempo que mantêm um regiso encomiástico e laudatório, em regime permanente, ao Poder. Mesmo que
este seja um exemplo trágico de uma via trágica para um desfecho que facilmente
se adivinha trágico. Também impressiona Jorge Coelho, um lídimo exemplo da
nossa classe política que consegue debitar vacuidades tipo «…o céu deve ser
azul, porque assim não há nuvens e não havendo nuvens não chove e os
portugueses precisam de sol tanto como as culturas, especialmente na nossa
agricultura que precisa que tudo esteja bem e que principalmente não discutamos
e deixemos o governo trabalhar…». Ontem foi mais ou menos assim, quando Jorge Coelho
depois de dar uma tremenda sova no PSD acabou a rogar aos portugueses uma
trégua de uma semana porque, confiemos, o governo vai resolver a CGD.
Resumindo. O PAF não é governo há cerca de um ano e após um
período tremendamente difícil em que, apesar de tudo, conseguiu endireitar a
nau e, não menos louvável, recuperou a confiança dos portugueses que lhe deram
a vitória eleitoral, continua sujeito a uma barragem de críticas na comunicação
social. Já a chamada “geringonça”, apesar de ter consubstanciado uma autêntica
fraude pela forma como surripiou o Poder pelas vias tortuosas de uma
Constituição ínvia, que não sei bem como alguma vez poderá ser revista e alterada,
continua a merecer os favores do rebanho que apascenta.
Um «case study», diria eu.
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Etiquetas: Ai Portugal, comunicação social, oposição, oposição chique