quarta-feira, outubro 31, 2012

A esquerda que merecemos

[4796]

Vi a espaços o debate do Orçamento. Nada de muito novo. Explicações lúcidas e inteligíveis de Passos Coelho, Vítor Gaspar e uma magnífica exposição do ministro da Saúde, um excelente governante que os nosso jornalistas se esforçam por não dar por ele. Do «outro lado» veio o bruá do costume, o paleio desconexo de quem não sabe verdadeiramente o que dizer senão pintar a manta. Desde Seguro a afirmar que não contem com ele, até às costumeiras histerias do Bloco e do PC, houve de tudo um pouquinho. Reparei ainda no jovem e truculento João Galamba que não achou argumento mais válido que chamar salazarento a Vítor Gaspar. Levou a resposta que merecia. Polida, educada e directa. Coisa que Galamba (um portento em números, consta por aí) estranha. Porque não sabe usar os mesmos métodos. Alguém lhe disse que ser acutilante e arrogante era o que estava a dar, mesmo que lhe feneça a substância. No fim, Galamba ensaiou uma espécie de desculpa a Gaspar, meteu os pés pelas mãos e a emenda piorou o soneto, para não deixar ficar mal o ditado. Também reparei na vozearia da bancada comunista quando Gaspar se referiu à implantação da democracia em 1976. Bernardino, o tal da Coreia do Norte, vociferou, remexeu-se e disse que não tinha sido em 1976, mas sim em 74. Ele não sabe, mas não foi. Não sabe porque é jovem como Galamba e não menos truculento, apesar de, aparentemente, menos esperto. Mas podiam ter-lhe dito que antes da Constituição houve uma tentativa desesperada do controle totalitário deste país pelos seus (dele) comparsas. Ele ainda era pequenino, mas já havia gente que achava que na Coreia do Norte é que era bom. Uma lástima!

Cá fora iam surgindo manifestantes dispostos a cercar o parlamento, coisa que vai bem com a gravata do momento. Gostei de ver os estivadores, aqueles que ganham um salário médio de €2.500 e que não querem abdicar das horas extraordinárias para chegarem facilmente aos €5.000. Pensei com os meus botões que para esses, talvez não fosse mal lembrado instituir mesmo um regime totalitário só para ver quanto é que eles passariam a perceber mensalmente. E o trabalho que deveriam dar em troca.

A vida é feita de equívocos, mas não há equívoco maior que esta gente que acha que sabe o que quer, representam uma fatia menor da população portuguesa e acham que podem e devem chatear meio mundo. E, pelo caminho, espatifar o que resta da nossa economia e bem-estar.
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domingo, outubro 21, 2012

Este Blogue vai hibernar um bocadinho e já vem


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A hibernação é um estado letárgico pelo qual muitos animais endotérmicos (claramente o meu caso) mergulham num estado de sonolência e inactividade, em que as funções vitais do organismo são reduzidas ao absolutamente necessário à sobrevivência.

A respiração quase cessa, o número de batimentos cardíacos diminui, o metabolismo, ou seja, todo o conjunto de processos bioquímicos que ocorrem no organismo, restringe-se ao mínimo. Pode-se dizer que qualquer animal que permanece inactivo durante muitas semanas, com temperatura corporal inferior à normal, está em hibernação, embora as mudanças fisiológicas que acontecem durante o letargo sejam muito diferentes, de acordo com as diferentes espécies.

Normalmente este fenómeno ocorre em regiões onde existe um inverno rigoroso em locais de problemática sobrevivência quando, de repente nos sentimos enfeixados numa estranha unanimidade de oposição a um grupo de governantes que, apesar de alguma inabilidade e inexperiência pontuais, se desdobram, com seriedade nunca vista no Portugal pós abrilada, na missão (impossível?) de redimir o estado a que este pobre Estado chegou pela contínua e prolongada acção devastadora de um grupo de parasitas que, sem escrúpulos nem remorsos, delapidou a sua riqueza, desbaratou o nosso prestígio e condenou várias gerações vindouras a um futuro incerto e trágico.

Nota: Quando um PGR descobre, fortuitamente, diz ele, uma escuta ao actual primeiro-ministro onde se deve ouvir uma treta qualquer que ainda ninguém sabe bem o que foi, mas sobre o que Passos Coelho já anunciou aos quatro ventos que até agradecia que a tornassem pública, a hibernação torna-se premente. Sobretudo se nos lembrarmos como a PGR, nada fortuitamente, se dedicava, às escâncaras, a camuflar as diatribes de Sócrates e agora, de repente e fortuitamente, descobre qualquer coisa que ninguém diz bem o que é, apesar dos incessantes pedidos do visado, e que vão alimentando as televisões e os jornais, em regime de pilão. De registar a via da notícia, um jornal que era lido com avidez e credulidade, hoje entregue aos caprichos de um jornalista inepto, complicado, um complexo com pernas, diria eu e que se vai entretendo a atrapalhar, provavelmente nem ele sabe bem porquê.
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quinta-feira, outubro 18, 2012

Maria, vais presa? Não, vou dormir com o chefe

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Os jornais e as televisões mentem todos os dias. Quando não mentem, distorcem, como são os casos flagrantes do Público e da SIC Notícias.

Nem sempre as pessoas se dão ao trabalho já de usar a lei da imprensa para desmentir. Uns porque não têm tempo, outros porque já não estão para se chatear. E quando desmentem, como aconteceu agora com Passos Coelho e Portas ao desmentirem uma mentirola do i (mentirola porque já nem é novidade…) acontece este tipo de coisas. O i desmente, mas não desmente. Retrata-se mas diz que não se retrata porque quem tem de se retratar são Passos e Portas, tipo, ok, a gente desmente mas sabemos muito bem que os mentirosos são vocês.

Isto é do mais rasca que tenho visto no jornalismo da paróquia. Que uma pessoa se engane, se deixe levar na boa fé duma fonte mentirosa, que embarque numa série de situações possíveis, vá que não vá. Mas mentir assim e depois desmentir assim, só falta lembrar a história da vizinha que perguntou a uma varina. Ó Maria, vais presa? Não, disse a varina, vou dormir com o chefe. No dia seguinte, o chefe desmentiu mas a velhinha insistiu que ver não viu, mas que a Maria andava sempre a baloiçar as mamocas e com as saias curtas e que era uma oferecida, lá isso era e andava.

Neste caso, Passos e Portas não dormiram com ninguém, mas o i diz que sim. Eles disseram que não mas o i disse que podem até não ter dormido mas que andavam bem pegados, andavam e que podiam muito bem ter dormido, ai isso podiam

Gente rasca é outra coisa.
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terça-feira, outubro 16, 2012

Gente série e genuina



[4793]

Tenho a firme convicção de que Vítor Gaspar é genuíno na afirmação que fez de que a única coisa que o move na sua capacidade de membro do governo é o desejo que sente em retribuir aquilo que o seu país gastou com ele na sua formação académica. E não estou convicto pelos lindos olhos do ministro, mas por saber que ele deve precisar tanto de ser ministro das finanças como eu preciso de sarna.

Talvez por isso me repugne a desfaçatez de tantos «ministros das finanças» que (às centenas) aparecem na televisão com abalizadas opiniões técnicas, desde os Arménios aos Proenças, que devem perceber tanto de finanças como eu percebo de mecânica de propulsão de motores a jacto, aos preclaros comentadores que as televisões mostram de três em três minutos dizendo que há alternativas. Não dizem quais, mas sabem que há. Segredo de Estado, presume-se.

No fim, temos os facebookianos e bloggers que aos costumes dizem sempre o mesmo. Nunca vi tanta gente saber tanto de orçamentos, de finanças e de economia. A fechar este cortejo de doideira militante, os arruaceiros do costume, abençoados pela boa imprensa que para qualquer acto de agressão e barbárie encontram termos adequados e lindos de morrer. O Público é um bom exemplo, mas não está só. País estranho, este!
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segunda-feira, outubro 15, 2012

Domingos no aeroporto





Aeroporto de Lisboa - Anos 50

[4792]

Tropecei nesta notícia sobre os setenta anos do aeroporto de Lisboa.

Foi num pinhal junto à gare que o meu pai me fotografou todo nu, 3 dias depois de eu nascer, ao sol daquele dia de Verão. Três ou quatro anos mais tarde, já o aeroporto se tornava destino obrigatório dos meus passeios de domingo. O meu pai, eu e o meu irmão ainda mais novo. E o sabor da aventura nascia poucos metros depois de sairmos de casa, ali ao Bairro da Encarnação. Porque cada passeio era uma série desfiada de acontecimentos fantásticos, todos eles novidades, repetidos quase todos os domingos mas sempre novidades, ou não fosse o meu pai verdadeiramente exímio em fazer de um acto banal uma espantosa novidade. Atravessávamos o pinhal, hoje cortado pela 2ª circular e íamos ver os aviões num aeroporto quase deserto, nos anos cinquenta, mas com o fascínio dos aviões ali pertinho, onde entrava e saía gente engravatada, sabe-se lá de ou para onde. A varanda descoberta permitia a proximidade e cada avião que descolava ou aterrava servia de mote a mais uma das incontáveis histórias do meu pai. Acho que foi ali, no aeroporto, que comecei a perceber o que era ter um pai. Tanto nas explicações sobre os aviões, de onde vinham, para onde iam, como voavam, de que «marca» eram (muito miúdo eu sabia que a Douglas tinha o DC3, Dakota, o DC4, Skymaster, o DC6, o DC7 e o DC7–C, a maravilha dos aviões. E a Lockheed tinha os veneráveis Constellation), como na suprema aventura de nos colocarmos no topo sul da pista (à altura, a única, por debaixo da sebe mesmo contígua à rotunda do relógio), ouvir e sentir os motores, um por um, em teste, acelerados ao máximo, até o avião rolar pela pista fora. Depois, era o «Buraco dos Bichos», uns montes de areia feios e amarelados, penso que seja onde se situa hoje a Alta de Lisboa, onde a fealdade dos morros se transformava na beleza aventureira do desconhecido, já que o meu pai chamava à zona o «Buraco dos Bichos», um sítio ermo onde nós pisávamos o solo com respeito e esperando que a todo o momento aparecesse um bicho que jamais apareceu, mas de cuja existência nunca duvidávamos, pois se o meu o dizia, era porque os havia.

Era extraordinária esta relação com o aeroporto. Durante anos seguidos me entreguei com deleite ao passeio ao «Buraco dos Bichos», não só pela secreta esperança e aventura de um dia saber que bichos eram aqueles, como pelas peripécias acontecidas até lá chegarmos. Para além do dia de permanente folguedo de um pai enorme, bonito, paizão, mas tão miúdo como nós quando brincava connosco.

Mais tarde, o aeroporto serviu-me de porta de entrada e de saída por inúmeras vezes, pela frequência com que eu me deslocava a Lisboa, durante o ano e durante anos. Em quase todas elas, o meu pai lá estava. Ou vestindo um sobretudo, se fosse Inverno, ou trajando um fato claro de Verão. Era a figura habitual da minha chegada, ele sabia que eu saía do avião e ia directo à Avis levantar um carro, mas queria estar sempre presente. E quando eu me ia embora, era ele que me deixava à porta e ia depois entregar a viatura.

Esta pequena história serve para dizer que foi ali, também, que vi o meu pai pela última vez. Deixou-me à porta das «partidas» mas, dessa vez, vá lá saber-se porquê, ele saiu do carro. Olhei para trás e vi a sua figura imponente e elegante fora do carro atirando um «boa viagem, meu rapaz», enquanto acenava lentamente a sua mão direita. Uma cena que hoje se mantém viva na minha memória, ao pormenor da roupa que ele vestia, incluindo uma gravata vermelha com umas pintas douradas ou amareladas. E lembro-me porque nunca mais o vi. Vi-o ali, no aeroporto, pela última vez, tanto como pela primeira vez. Porque foi ali, no aeroporto, que, como disse atrás, eu «comecei» a ver o pai que tinha.
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segunda-feira, outubro 08, 2012

É bem feito


[4791]

É claro que o Porto mereceu ganhar ontem. É claro que o Sporting está em fanicos por culpa seja lá do que for, a menor das causas não será a de um presidente que responde a um jornalista que o Sporting pode muito bem mudar de treinador com frequência porque o sr. Pinto da Costa uma vez mudou três numa época.

Aqui, estamos a chegar ao ponto. Ainda não consegui perceber a sanha do Sporting ao Benfica, bem visível naqueles dois programas de actualidade desportiva na SIC Notícias e TVI24. Tanto Dias Ferreira (com o verbo genético da irmã, entenda-se um discurso quase ininteligível e sem concordância de verbos, pronomes ou adjectivos) como o truculento primo de Mário Soares cirurgião especialista em fígados e sportinguista e avô de sportinguistas, ocupam todo o tempo do programa nas maiores diatribes contra o Benfica, ao mesmo tempo que se desfazem em salamaleques para o com o FêQuêPê. Pois… desta vez, fomos ao Dragão e apanhámos dois secos. Nada de muito especial, mas se repararmos nas inúmeras faltas marcadas a desfavor e estratégicas e dois penaltis ridículos, percebemos que o com o FêQuêPê não se brinca, mesmo que lá vamos jogar coxos, marrecos, com lumbago, gota ou unhas encravadas. É bem feito, para Dias Ferreira, é bem feito para o dirigente mal aproveitado. Pode ser que agora eles percebam que lá em cima mandam eles. E que com eles não se brinca. Por muito que lhe passemos a mão pela fruta.
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sexta-feira, outubro 05, 2012

Gasta muito e deixa-se influenciar pelos ingleses? Dá-se-lhe um tiro

[4790]

Hoje passei ao de leve pela 2 e ouvi num programa chamado de Zig Zag, pareceu-me um programa para jovens, dizer que hoje se celebrava a implantação da República. Porquê? Porque no dia 5 de Outubro de 1910 mataram o rei D. Carlos e o filho D. Luís. Porquê? Simples. Porque ele gastava muito dinheiro e se deixava influenciar muito pelos ingleses (ipsis verbis).

A História, afinal, é fácil de ensinar. Tal como fácil se torna explicar a uma criança que se amanhã eu disparar um balázio numa tia que eu tenho e que é muito gastadora e se deixa influenciar muito por um namorado francês que cá vem duas vezes por mês, não faço nada que não se tenha feito antes.
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A chachada do 5 de Outubro

[4789]

O 5 de Outubro foi uma chachada. António Costa, um socialista emérito e com uma brilhante carreira de jota, deputado, ministro, vereador em Loures, vencedor de uma corrida entre um burro e um Ferrari, paineleiro da Quadratura do Círculo, presidente da Câmara de Lisboa (onde já fez uma rotunda dentro da rotunda do Marquês e uniformizou umas mesas de restaurante na baixa), afinal tinha ali à mão a magna solução para os nossos problemas e tratou de no-la explicar. Para isso, fez um discurso incisivo e quase zangado, no qual nos disse que isto estava tragicamente complicado, mas que havia alternativas. Quais? Aguardei eu com ansiedade. Fácil, e ele explicou. Educação, sofisticação da economia. Empreendedorismo, conhecimento, valorização do trabalho, semear para colher, crescer e produzir e outras coisas que não me ocorre mas que podem ser encontradas facilmente por quem tiver a pachorra para ler o discurso todo. Voilá. Aqui está o segredo, a cana para o foguete, a chave do aloquete. É só seguir os concelhos de Costa e a coisa anda para a frente.

A seguir veio Cavaco falar de juventude, podia ter falado de moda ou de futebol, dava na mesma, já que o propósito era mostrar-se suprapartidário. No fim apareceu uma fulana decotada (vim a saber que era cantora lírica e se chamava Ana Maria Pinto) a cantar uma treta qualquer e foi deprimente reparar que os presentes na cerimónia não estavam certos se aquilo fazia parte do programa ou não. Não fazia. Foi «espontâneo», como os apupos aos ministros pelas comissões de utentes. A encerrar, uma mulher que recebe €200 de reforma entrou por ali dentro a fazer barulho. Os jornalistas andavam excitadíssimos e continuaram por ali como baratas tontas. Os convidados, esses, iam-se esgueirando porta fora, como podiam, leve-leve e sem fazer ondas

Uma lástima. Um bom retrato da república.
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Relapsos, desleixados, sem classe

[4788]

Quando um militar americano morre, há um momento muito solene nas exéquias. Um grupo de militares dobra cuidadosa e respeitosamente aquele venerando símbolo nacional e entrega-o à viúva, a um filho ou a um pai. Mas isto é nos países onde a bandeira ocupa o lugar que merece e recolhe dos cidadãos todo o respeito e simbolismo que lhe é devido.

Por cá as coisas são diferentes. A guelra republicana e socialista de Soares, por exemplo, levou-o a pisotear uma bandeira em Londres e ele ficou muito contente. Quando a selecção de futebol vai jogar a qualquer lado, muitos cidadãos enfeitam as janelas com as bandeirinhas (se calha ser no Natal, ao lado daqueles meninos Jesus a treparem pelas varandas). Ou então, numa cerimónia (???) como a de hoje, um «fabiano» qualquer pegou no trapo, enfiou-lhe a corda enquanto enrolava um cigarro ou ia discutindo a saída do Sá Pinto do Sporting e o resultado foi um Presidente da República e um presidente de câmara içarem uma bandeira de pernas para o ar. A bandeira, eles estavam de pernas para o chão, mas provavelmente se estivessem também a fazer o pino não se notava muito.

As coisas são o que são. Os socialistas têm a mania de nos dizer «habituem-se». Mas eu que não há meio de me habituar a esta forma relapsa de sermos…


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A Rititi no seu melhor

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Aqui. Ou de como a rir e a escrever lampeira e escorreita se fala de coisas bem sérias.

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quarta-feira, outubro 03, 2012

Pissed off goose


[4786]

Encontrei-o vagueando na estrada do Guincho, junto ao parque do restaurante das furnas. Macambúzio, abúlico e taralhoco. Parei o carro e perguntei-lhe o que tinha. Sick my duck, disse-me o ganso e levou-me algum tempo até eu decifrar o trocadilho. Mas lá atingi, e percebi que parecia irritado, deprimido e não queria que o chateassem. Ainda lhe perguntei o nome, mas ele grasnou qualquer coisa ininteligível e caminhou, desengonçado ao longo da berma da estrada, do lado do mar. De repente, bateu as asas e, desajeitadamente, tentou voar. De pouco lhe valeu o propósito. Esparramou-se com estrondo e espuma numa onda prestes a rebentar. Vi como ele foi atirado contra as rochas, desalentado. Chamei: Sick my duck. Grasnou-me, mal humorado, sick my duck era a avozinha.

Não foi bem isto o que ele disse mas ainda são dez da noite e não dá para escrever palavrões. O ganso desistiu de voar, meteu-se à água, apanhou a borla de uma onda de viés e deixou-se ir. Boiando. E não é que começou mesmo a afastar-se da costa? Já a uma distância considerável do enrocamento das furnas, virou-se para mim e acho que esboçou um adeus com uma das asas. Deve ter apanhado uma corrente favorável, porque rapidamente, levado pela maré, se afastou, mar adentro, e não voltei a vê-lo.
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Lastimável


[4785]

Vítor Gaspar mal acabou de falar e já o FB e alguns blogues se babam de críticas violentas de gente que acha (nós achamos imenso…) que está tudo mal e que este governo é, mais coisa menos coisa, um bando de malfeitores que acorda de manhã pensando quanto vão roubar nesse dia à classe média, aos velhos, reformados, pensionistas, famílias, pessoas e… como é que é a ladainha?...

Não me admiro muito com a natureza e a qualidade destes comentários. O que lamento, mas lamento cá do fundo, mesmo, é que estes preclaros opinantes estivessem calados que nem ratos (literalmente, ou ratos do Rato) enquanto um grupelho de socialistas (???) boçais, sem escrúpulos e sem qualquer pinga de respeito pelo futuro dos nossos jovens, se entreteve a rebentar com o país. Aí andaram estes doutos opinantes calados, quem sabe porque lhes soube bem. Ou, mais grave, porque se comentassem e denunciassem a tragédia que se ia anunciando tivessem de lutar contra o mainstream da época. E agora, que um governo sério, ainda que inábil e erodido por uma série de passos mal dados, tenta endireitar esta choldra, é que de cada vez que põem a mão de fora da tumba dizendo que estão vivos, vem esta rapaziada do comentário fácil calcar-lhes a mão e dizer que estão é mal enterrados.

Lastimável.
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terça-feira, outubro 02, 2012

Eu contei...

[4784]

Eu contei. Juro. A RTP inicia o seu Bom Dia Portugal às 6:30. Depois de uma breve notícia da chegada do Sporting de Braga à Turquia que deve ter levado uns cinco segundos (???), a apresentadora lançou-se numa autêntica maratona de oposição violenta, durante a qual Jerónimo apareceu seis vezes, Francisco Louçã três vezes, António José Seguro duas vezes e José Junqueiro uma vez. Tudo em peças separadas (tipo ora agora vem Jerónimo, ora agora vem Louçã) e exactamente até às 6:58. Durante estes vinte e oito minutos, os termos roubo, pacto de agressão e falta de legitimidade para governar ouviu-se incontáveis vezes por entre o cenho zangado de Jerónimo, agressivo/violento/desesperado de Louçã e amuado/desalentado de Seguro porque Passos Coelho não lhe comunicou qualquer coisa que levou ao parlamento Europeu. José Junqueiro, mais cívico, falou numa treta qualquer que já não me ocorre. A seguir, e porque a RTP é ciosa do seu serviço público, vieram o tempo e as lições de bom português a explicar-nos porque é que o «p» caiu na palavra «recepção». Só faltou as farmácias de serviço.

Não entendo bem esta sanha, porque de sanha se trata, ao governo. Pasmo, também, com o facto de a SIC estar ainda pior que a RTP (na SIC) este tipo de notícias mete uns separadores pelo meio com aquela musiqueta do «com todo o respeito», imagens de fome e miséria no mundo, pancadaria em cidades europeias (sempre naquela fase em que a polícia carrega à bastonada), cidadãos a vociferar contra o establishment e aquele grupo excursionista de cerca de trinta pessoas que vão «a todas» para chamar gatuno ao ministro que lhes coube no roteiro, ou seja, uma forma mais intelectual e elaborada de arrasar o governo, como lhe compete.

Não se confunda este modesto comentário com qualquer tipo de defesa do governo. Não é isso que está em causa. O que está verdadeiramente em causa é este clima insurreccional que grassa pelas televisões, jornais e rádios. O que se pretende com isto, não sei bem, não chego lá. Para já, o que vejo é que o PS já ultrapassou o PSD nas intenções de voto, o clima de greves suicidas está aí de novo e cada vez mais passamos esta mensagem de ingovernabilidade ao exterior. Do qual dependemos para pagar as contas, os medicamentos, os combustíveis e o melão de Almeirim cultivado na Andaluzia.
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segunda-feira, outubro 01, 2012

Democracia directa?

[4783]

Tenho Pacheco Pereira em elevado apreço pela sua intelectualidade e pelo valor da sua obra literária e de pesquisa. Mas ouvi-lo discernir, num programa de televisão, sobre exemplos de democracia directa, para o que evocou a democracia ateniense, e deixar transparecer uma certa nostalgia (ou um mero tique académico?) porque cerca de dois mil e quinhentos anos depois não podemos chegar à nossa Acrópole e reivindicar os nossos direitos em nome da qualidade do nosso vinagre ou azeite, faz-me recear que Pacheco Pereira não equacione as realidades factuais, curtidas por mais de dois milénios. PP parece achar que sim e, por vezes, chega a parecer que, para ele, bastaria um Aristófanes para desmascarar o papel nocivo dos demagogos e denunciar a destruição económica, militar e cultural para que pudéssemos manter o exercício da democracia ateniense na sua génese mais pura.
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A liberdade de não a merecer

[4782]


Bendito o regime que nos permite a todos expressar o pensamento e usar a palavra à medida do propósito. Mas dessa liberdade decorrem, frequentemente, acções insensatas e pouco abonatórias, quando um jovem quase imberbe se arroga o direito de insultar uma instituição do Estado de direito, como um primeiro-ministro, mesmo se esse insulto releva de alguma estimável convicção. Há, ainda e também, a distinta possibilidade de muitas vezes estas atitudes terem a ver com uma insuportável vanidade, tolice e ausência de cultura e espírito de cidadania. Ou, simplesmente, falta de berço. Não sei se é o caso do jovem em apreço mas se não é, acho que ele representou muito bem aquele papel.


A liberdade é um bem precioso. Quero muito que ela se mantenha por todo o sempre. Até porque, ao contrário do jovem insultador, já vivi sem ela e lembro-me bem como era. Pena é que muitos de nós não saibamos conviver com ela com o respeito que ela nos devia merecer.
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Será assim tão difícil de entender, ou a muitos de nós não dá jeito?

[4781]

Clarividente crónica de Alberto Gonçalves no DN, que vale a pena ler até ao fim. Negrito da minha responsabilidade.

É extraordinária a quantidade de gente capaz de interpretar os sentimentos expressos nas manifestações de rua. Não possuo tal dom. Ouço e leio as palavras de ordem (pelo televisor, salvo seja) e acabo mais confuso do que comecei.

Ao que tudo indica, o povo em protesto não quer aumentos de impostos e, em simultâneo, não quer a redução na despesa que compensaria a manutenção dos impostos tal como estão ou estavam. O povo pretende a expulsão da troika e não se encontra minimamente preparado para a penúria que a partida da troika implicaria. O povo rejeita a austeridade sem perceber que a alternativa é uma austeridade maior e menos meiga. O povo está contra o Estado e vive apavorado com a ideia de que o Estado recue nas suas vidas. O povo insulta o Governo que desastradamente tenta corrigir as contas públicas embora não deseje que as corrija com acerto, nem dedique grandes insultos aos governos que deliberadamente transformaram as contas públicas na ruína actual. O povo, em suma, é realista à maneira do Maio de 68: pedindo o impossível. Impossível no sentido de que não tem pés nem cabeça.


É natural que o povo, às vezes constituído por serventes partidários, às vezes por gente em autênticas dificuldades, às vezes por sujeitos que berram qualquer coisa, caia nesta teia de contradições. Não deveria ser natural que as contradições chegassem a jornais ditos de referência sob a forma de colunas de opinião. A opinião é livre? É, e Deus nosso Senhor sabe o quanto agradeço a benesse. Por acaso, a irracionalidade também não conhece amarras, donde a emergência de textos do calibre do de José Vítor Malheiros, no Público de 25 de Setembro.


O título do texto ("A Dívida Existe Mesmo?) já arrepia. O pior é que após a pergunta do título o sr. Malheiros gasta uma data de caracteres a responder "não". Não perderei tempo a comentar os, digamos, "argumentos" do homem (o João Caetano Dias fê-lo brilhantemente no blogue Blasfémias). Basta resumi-los: para o sr. Malheiros, o défice e a dívida que decorre dos sucessivos défices (ele pensa ser ao contrário) são uma história mal contada, um provável estratagema para oprimir as massas que nada justifica, excepto talvez os favores às construtoras e aos bancos.


Perante isto, o que fazer? Podemos, claro, organizar uma colecta a fim de enviar o sr. Malheiros para um curso de Economia ou um merecido descanso. Porém, podemos igualmente aproveitar o mote e estender a tese ao que nos aprouver. A dívida não existe. O Estado esbanjador não existe. Os gastos com os salários e as prestações sociais não existem. Os custos da educação e da saúde não existem. As autarquias e as regiões autónomas não existem. As fundações e as empresas públicas não existem. O Magalhães não existe. Os estádios do "euro" não existem. Os pareceres, as consultorias e os estudos encomendados a amigos não existem. Os subsídios às energias "renováveis" não existem. Os apoios à "cultura" não existem. O socialismo não existe. O eng. Sócrates nunca existiu. E é duvidoso que, a médio prazo, o próprio país exista.

O exercício não é fortuito: se passarmos por doidos varridos, o mundo exterior comove-se e dá-nos um desconto moral. Infelizmente, dado que ninguém investe na demência, o mundo não nos dará um desconto material. Mas, de acordo com a escola financeira do sr. Malheiros, dinheiro não nos falta.

Terça-feira, 25 de Setembro

Objectividade pelos ares

A mulher de Mitt Romney viajava num avião que sofreu um pequeno incêndio e se encheu de fumo. A peripécia foi inconsequente. Ou nem por isso: mais tarde, numa sessão de campanha, o candidato referiu o assunto já ao lado da esposa, dizendo não perceber porque é que as janelas dos aviões não abrem para deixar entrar o ar. Tratou-se, conforme os correspondentes do Los Angeles Times e do New York Times (nenhum suspeito de simpatias republicanas) asseguraram, de uma brincadeira, aliás evidente no vídeo do episódio. É claro que a internet canhota local tentou remover as declarações do contexto e apresentar Romney como um tontinho, mas para efeitos internos a coisa morreu ali. Externamente, a coisa estava apenas a começar.

Um pouco por toda a parte, incluindo em muitos países europeus e incluindo, quase sem excepções, os media portugueses, o "jornalismo" a que temos direito diagnosticou em uníssono a idiotia terminal de Romney, o qual, segundo a opinião geral, gostaria de facto que as janelas de um jacto comercial descessem à semelhança das de um Fiat Punto. A veneração cega do actual inquilino da Casa Branca, misturada com a tendência para ver em cada membro do GOP um monumento à ignorância, dá nisto: uma mentira transformada em "notícia" e um espectáculo em que sujeitos com dificuldade para alinhavar uma singela peça sem erros ortográficos discorrem sobre a boçalidade de um discípulo de Stanford e Harvard. Boçal é o fanatismo.

Boçal e distraído, já que a reacção a gafes imaginárias impede inúmeros "jornalistas" de reagirem a gafes reais. Que eu saiba, por cá ninguém se riu após um político americano ter afirmado que os EUA construíram o "primeiro comboio intercontinental". Ou após um político americano ter exaltado o bom exemplo da FedEx por oposição ao dos correios públicos enquanto pretendia defender um sistema de saúde financiado pelo Estado. Ou após um político americano ter confessado que não sabia falar austríaco. Ou após um político americano ter declarado que percorrera 57 estados da União. Ou após um político americano ter classificado as recentes fúrias no Médio Oriente (que assassinaram um embaixador de Washington na Líbia) de "lombas na estrada". Em qualquer dos casos, o político americano era Barack Obama, um simpático colecionador de cargos públicos e um presidente medíocre que, ainda assim, paira largos furos acima do político indígena médio.

A terminar: nas circunstâncias adequadas (altitude, despressurização, etc.), os aviões podem voar com as janelas abertas. Fechadas sem remédio só algumas visões do mundo.

Quarta-feira, 26 de Setembro

A marca de Zorrinho

Não me canso de admitir algo de admirável no Partido Socialista: a rigorosa e absoluta falta de vergonha. Em seis miraculosos anos, o PS conseguiu duplicar a tendência para o desastre lentamente acumulada nas décadas anteriores e enfiar a pátria amada na bancarrota e na dependência de esmolas caríssimas. Em circunstâncias ideais, a derrota eleitoral de 2011 teria lançado os autores da façanha para um justificado limbo ou, no que respeita aos principais responsáveis, para a cadeia. Em Portugal, quase (quase) todos andam aí, a instruir os incréus sobre a arte de bem governar e a recriminar, com voz pungida, a má governação.

Esta semana, o descaramento maior coube a Carlos Zorrinho, o qual, a propósito dos pífios "cortes" nas fundações, lamentou com total precisão e nenhuma legitimidade: "Quando é para aumentar os sacrifícios aos portugueses, é sempre mais do que aquilo que esperamos; quando é para cortar despesa, é sempre menos do que aquilo que esperamos." Brincadeira? Parece. Mas não é. É apenas o PS a confiar na amnésia terminal do eleitorado.

Em matéria de amnésia, nem vale a pena notar o impulso do PS a incontáveis fundações. Sobretudo, importa descontar a facilidade com que o PS alterna as exigências de "investimento" público com a mágoa de que a despesa pública não seja devidamente reduzida. O primeiro sermão tem a atenuante da coerência face ao modus operandi que nos deixou na penúria. No segundo, trata-se de puro desplante. E se apetecer ao cidadão médio comparar o caso ao do gatuno que condena as escassas medidas de segurança depois de esvaziar o banco, a comparação é redundante: é literalmente isso o que se passa.

O pior é que, se calhar, o cidadão médio prefere o encanto do logro a uma dose de realidade e não está para aí virado. Se calhar, a acreditar nas sondagens recentes, uma quantidade suficiente de pessoas esqueceu-se de facto de quem as colocou nos limites da indigência. Se calhar, os drs. Zorrinhos deste mundo sabem o que fazem e o que dizem. Se calhar, o PS merece o país, e o país merece o PS.
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