O meu blogue anda meio chato. Ou chato inteiro, mais
propriamente. São quase 13 anos (em Julho e quase, quase 6.000 posts, desde
Julho de 2004). E sozinho. Tem sido uma companhia admirável e uma via para conhecer
gente e criar amizades com gente boa e bonita. Mas confesso estar a atravessar
uma irritante abulia e quase não escrevo. António Costa tem culpa, também, até
de escrever pouco, de cada vez que abro o laptop vem-me a criatura à cabeça.
Sebosa, rindo e irritante. Acabo a escrever sobre ele, de tal maneira que amigos
já me têm dito que estou até a tornar-me chato.
Este preâmbulo para dizer que fui honrado (uma vez mais)
pelo convite do Pedro Correia para escrever um post para ser publicado
no Delito de Opinião. Prometi a mim mesmo que não falava no Costa. E não falei.
Tentei fazer uma coisa ligeira e pedi desculpa ao Pedro por ser, talvez,
demasiado ligeiro. Mas foi o que se pôde arranjar. Mesmo que o post não
esteja com assinalável qualidade, vale pelo prazer de aceder ao pedido do Pedro
e desejar a todos boas leituras no Delito. E que eu, mesmo modestamente, tenha
desta forma contribuído para tal.
Bruscamente, debaixo do
chuveiro
Tenho andado entra e sai,
em casa, por motivos vários. Ao mesmo tempo, a minha filha pediu-me para lhe
ficar com as duas gatinhas enquanto ela se ausentou por um par de dias.
Anteontem entro em casa,
ligo mecanicamente o televisor para quebrar a paz e o silêncio, as gatas
ronronavam num maple e fui para o duche. Eis senão quando, oiço miadelas
estridentes, correrias, barulho de um par de coisas a cair e a
estilhaçarem-se…mais correrias, choques com portas e é aí que, debaixo do
chuveiro, me pergunto se estarei a ser assaltado. Molhado e nu não é
propriamente a melhor maneira de resistir a assaltantes, salvo especialíssimas
circunstâncias… mas enchi-me de coragem, enrolei-me na toalha e segui para o
hall. Olhei para a sala, não vi nada, vou à cozinha e vejo as gatinhas
assustadas, muito encolhidas e enroscadas, junto ao fogão. Que coisa, pensei
eu… serão mesmo assaltantes?
E é neste ponto que oiço
uma gritaria que, por motivos claros, não provinha das gatas, Vou à sala,
procuro identificar o ruído, mais ou menos semelhante a um grupo de carpideiras
bem pagas, talvez, ainda, uma vaca que um dia vi o meu irmão veterinário ajudar
a parir e deparo com a imagem do Manuel Serrão, na TV, no “Prolongamento”, a
imitar (!!!!????!!!!) o Salvador. Pensei sobre que diabo se estaria a passar.
Curioso, aproximei-me e na ininteligibilidade dos lances canoros da criatura
percebo que havia uma tentativa de uma letra. É isso. O homem imitava o
Salvador, o que percebi pelos gestos, naturalmente não pela música. Mas a
letra, meu Deus… só percebi Poooooorto… peeeeeenta e qualquer coisa que rimava
com penta. Não era pimenta, mas algo por lá perto e que não consegui definir.
Insisti E quando julgava que a letra continuava, o homem insistia…
peeeeeenta….. pimeeeeeeeeeeeeenta…. (acho) e fiquei-me por aqui.
Volto à cozinha e olhei,
enternecido e solidário com as gatinhas. Pequei no “remote” e calei o Serrão.
As gatas olharam para mim, embevecidas e agradecidas. Peguei nelas fiz-lhe um
mimo e elas deitaram-se de novo no maple. Eu voltei ao chuveiro e
prolonguei aquele jacto quente e gostoso até me desaparecer aquela rima
estranha de …peeeeeenta…..pimenta…
Mesmo assim, quando me
deitei, e cada vez que fechava os olhos… é… aquela sensação que todos nós
certamente temos e que faz com que não consigamos deixar de trautear
mentalmente uma canção… lá estava ela. Só que desta vez era mais grave. Além do
peeeeenta, pimeeeeeenta mesmo de olhos fechados eu tinha a visão festivaleira
do Manuel Serrão e de gatas assustadas, tal como se nota na foto. Tomei um
Dormonoct.
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