Este osso é de asa de galinha. Tem 4 cm bem aviados, medidos no hospital e tem uma ponta afiada como uma agulha, como se pode ver na foto, apesar de não estar muito boa
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Após tantos dias de paragem deste blogue, não faleceu a
escrita mas ia falecendo o escriba. Eu explico rapidinho.
Os americanos, com o seu esmerilhado gosto pela comida,
consideram uma delicacy tudo o que vá para além daquele insípido peru no forno,
smashed potato, pumpkin e uma massaroca cozida com que se deliciam no «thanks
giving». Daí que as asas de franco se tenham tornado ícones da boa cozinha
norte-americana. Fritam-nas ou grelham-nas, besuntam-nas de tabasco e barbecue
sauce e…salivam.
Eu confesso a minha indiferença pelas asas de frango, mas se
como um caril de galinha, não há como evitá-las. E assim, e porque as asas de
frango têm um osso traiçoeiro, engoli um deles, sem saber como. O osso estava
partido numa das extremidades. Seguiu calmamente a sua viagem pelo esófago,
alojou-se calmamente no antro gástrico e, não contente com isso e quiçá incomodado
pela movimentação constante do estômago, foi-se enterrando na parede do órgão.
Repito: EN-TE-RRAN-DO na parede do estômago. Claro que dois dias depois tive
dores que devem ter atirado as famosas dores de parto para milhas da linha de
resistência ao sofrimento e lá vou, cinco da manhã, conduzido por uma das
filhas direitinho ao hospital de Cascais. Durante quase todo o dia, já de soro
e analgésico em perfusão permanente, ninguém fazia a mínima ideia do que me pudesse
estar a causar semelhante sofrimento. Raios X, análises, ecografias, nada dava qualquer indicação do que pudesse ser. Até que numa das repetidas análises ao
sangue apareceu uma bendita proteína que é suposta estar quietinha, mas que
começou a dar sinais de que havia um processo inflamatório algures. Mandaram-me
então fazer uma TAC. A TAC mostrava claramente um corpo estranho…mas como as
TAC’s não têm legendas todos ficámos sem saber que corpo era aquele. De
Cascais, metem-me numa ambulância para o S. Francisco Xavier, urgências de
gastro. E aí me anestesiam total e profundamente. Acordo com uma médica simpática
e triunfante, mostrando-me o troféu que exibo na foto. Um osso de galinha, traiçoeiramente
partido numa das extremidades, acerado e assassino que, aparentemente, não me
daria mais 10 a 12 horas de vida se tivesse acabado por me «perfurar» convenientemente.
Osso extraído, voltei para o hospital de Cascais onde permaneço
internado por razões de segurança. Quatro dias depois de não ingerir NADA (nem água),
o cirurgião de serviço às urgências deu-me um pequenino copo de chá e disse-me
para o beber, para ver se o estômago «espichava». Não espichou… e mandaram-me para
casa.
Notas finais: Nunca se riam nem pensem que a recomendação de
não se dar ossos de galinha aos cães é uma mania dos veterinários. Eu não sou
cão mas sou prova viva desse cuidado; fui bem tratado, paguei €53 pelo
internamento, tratamento, exames, duas viagens de ambulância e intervenção
cirúrgica no HSFX. Parece que há uns meses não pagaria nada e agora paguei €53.
Pois… paguei e acho muito bem que tenha pago, em face dos cuidados que recebi,
não percebo muito bem esta vozearia idiota que vai por aí. Uma última menção de
apreço e simpatia à Daniela Sá Leão, médica cirurgiã do HPP de Cascais que me
acompanhou e tratou, pelo diagnóstico assertivo que me fez e pelo elevado profissionalismo
demonstrado, apesar de ter levado algumas horas e, ao princípio, nos termos embirrado
mutuamente.
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Etiquetas: coisas do demo, saúde