terça-feira, junho 20, 2017

O Rio dos Medos de Ouro



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Poucos dias depois do 25 de Abril, nos meus verdes vinte e poucos anos e numa altura em que não dava para ir para a frente do ministério com uma tabuleta a reclamar pelo facto de o Governo ainda não me ter arranjado emprego depois de sair da faculdade, fui parar a Durban, como technical assistant duma empresa de produtos químicos para a agricultura e indústria.

Tive uma relativa facilidade em arranjar emprego porque já dominava o inglês, graças a uma prestimosa, linda e louríssima namorada de Sheffield, Yorkshire, UK (Hi, Janet!) razoavelmente mais velha do que eu e que me ensinou uma data de coisas e, de caminho, o inglês falado e escrito.

Entregaram-me o Northern Natal, uma vasta zona do Kwazulu Natal onde eu deveria visitar os mais importantes municípios, como Dundee, Vryheid, Newcastle, Ladysmith, Harrismith, Pietermaritzburg e vender o meu peixe, incluindo a utilização de produtos arbusticidas e de longa acção residual para controle total em refinarias, auto-estradas, etc. (que falta fazia o “macabro” RoundUp da “maléfica” Monsanto, que ainda não tinha sido inventado), para além de produtos de acção selectiva em relvados desportivos, jardins e onde houvesse relva em geral.

Nestas andanças conheci uma das mais fantásticas regiões naturais e hoje, reclamo-me um homem de sorte por isso. Conheci St Lucia, uma extensa zona do estuário do rio Tugela, em que as águas do mar e do rio se misturam, formando um caldo ecológico onde os crocodilos, os hipopótamos e os tubarões convivem (e respeitam-se), o mesmo não se podendo dizer em relação a muitos incautos que antigamente lá se banhavam e eram disputados à dentada entre um faminto crocodilo e um azougado tubarão, isto se não levasse uma patada dum  hipopótamo que ocasionalmente passasse.

St Lucia é um local paradisíaco, em que a beleza natural se funde com uma auréola de mistério e de lendas abundantes, naturalmente devidas às pessoas que pereceram a crocodilos que não tinham nada que andar ali e, igualmente, de tubarões que tinham um mar inteiro para andar e ai se alimentavam à babugem dos alimentos que o Tugela prodigamente lhes ofertava.

St Lucia começou por se chamar Rio dos Medos do Ouro, cuja alusão aos trágicos e frequentes acontecimentos de gente atacada se fundia à cor única, dourada, das suas dunas. Foram os portugueses (quem mais????) que lhe deram o nome, sobreviventes de um navio português naufragado e que dava pelo nome de S. Bento, em 1554. Mais tarde, em 1575, no dia de Santa Lucia, o nome de St Lucia foi outorgado à região completa, incluindo o estuário do Tugela e a zona marítima.

Fiquei a saber isto a primeira vez que lá fui, num “lodge” onde acabei por ficar algumas vezes nas minhas viagens de trabalho e onde me entretinha a ler a história e a origem de St. Lucia.

O meu filho, bem mais inteligente do que eu mas que gosta mais de ler sobre “bikes” do que sobre navegação do século XVI, passou aqui em trabalho há dias e mandou-me esta foto. Fiquei contente por me lembrar disto tim-tim por tim-tim. E, ainda, para calar a boca a alguns amigos que me acusam de só escrever sobre o sorridente Costa. Criatura que eu poderia mesmo convidar a tomar banho em St Lucia, tendo o cuidado, possivelmente, de retirar primeiro a tabuleta de aviso.


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