quarta-feira, janeiro 11, 2017

Náusea



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Mário Soares é já um factor secundário na pantomina que tem entretido a grei nestes últimos dias. Jamais pensei ser possível tamanha manipulação das pessoas por via da televisão e dos jornais A morte de Soares tornou-se um exemplo vivo (irónico, porque vindo de um morto) da força dos órgãos de comunicação social, da influência e domínio que ela tem nos seus fautores e na náusea máxima que conseguem causar a quem, com a serenidade e sentido crítico destas coisas, vai acompanhando a evolução dos acontecimentos. Os jornalistas mais novos mostraram à saciedade uma comoção que terá eventualmente mais a ver com o contexto profissional em que estão inseridos do que propriamente com o passamento de Soares. E os comentadores e peritos de opinião descascaram o evento até ao caroço, com a agravante de mesmo chegando ao caroço continuarem a roê-lo com banalidades do discurso redondo a que nos habituaram e amestraram ao longo dos anos.

O funeral e luto de Soares constituiu para mim, que já não sou propriamente um garoto, o exemplo mais chocante de como continuam a existir ditaduras, ainda que com vestes diversas. Através dos que ditam, pelas mais variadas razões e pelos mais diferentes meios e através dos ditados que uma vez mais mostraram esta notável e trágica tendência para serem pastoreados. Por um cardeal, uma santa que apareça a uns quaisquer pastorinhos, um rei, um futebolista, basicamente, um ditador que lhes cuide da alma e do corpo. É a mais triste das verdades. E convenhamos que é uma situação que não desperta um particular orgulho ou uma assinalável nobreza.

Continuo a não falar de Soares por respeito pelos que partem. Mas reconheço uma inesperada surpresa pelo grau de proselitismo, ignorância, arrogância (ocorre-me, assim de repente Miguel Sousa Tavares e António Vitorino, que da cátedra da sua projecção pública chamaram lixo e energúmenos a todos os que se atreveram a criticar Soares. Apetece-me chamar-lhes idiotas, oportunistas, enjoado militante e careca baixinho, mas isso iria colocar-me ao nível deles, coisa que liminarmente recuso) que reinou por aí, como que “proibindo” as pessoas de criticar Soares. E não me apetece ser lixo nem energúmeno aos olhos daqueles dois. Começo a fartar-me do assunto. E já bastaram estes dias em que ouvi música de encomenda e vi séries e filmes em regime contínuo.


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