Que bom, que bom, que bom…
…termos alguém que olhe por nós. Que tenha conseguido
reverter as maldades do governo anterior e possamos, enfim, começar a colher os
frutos. Que bom, que bom, que bom termos jornais que no-lo recordem, não vá nós
andarmos distraídos e nos percamos nos caminhos ínvios da injustiça, como quando
o ano passado quase nos enganámos e demos mais votos àquele malandro do Passos
Coelho.
Que bom, que bom, que bom folhearmos o jornal enquanto almoçamos
circunstancialmente sozinhos e nos apercebemos deste manto de virtude e
aconchego em que vivemos e do paraíso que aí vem, sem serpentes, maçãs ou
mulheres nuas tapadas com parras. Mas reparemos no DN de hoje, em boa hora re…qualquer
coisa pelo Baldaia que, de repente, retomou a arte de cavalgar a sela dos
ideais sociais e conseguiu pôr o jornal a gorjear virtudes, trilando notícias
de encantar como o som melodioso de um canário de estirpe. Mas sigam-me jornal
fora:
1ª página
Título a três colunas: Entrevista a Mário Centeno. “Não
haverá garantias de Estado no Novo Banco”. E segue-se um rosário de notas e
comentários, entre muitos, como “Nacionalizações – Quando se trata de garantir
a estabilidade do sistema nada estará fora de questão”. E mais, Centeno,
zangado e muito sério diz, sobre Domingues, que a tentativa de generalizar sms
como se fossem facebooks (sic) comigo não funciona. Ah! Centeno duma cana.
Metam-se contigo, metam… entretanto lá vem a ladainha do crescimento acima de
1,2% e défice abaixo dos 2,5% do PIB, e a dívida pública líquida desceu um
ponto percentual do PIB no ano passado e fiquemos por aqui. Não li a entrevista
porque já não há saco.
2ª página
Aleluia. Maria de Lurdes Rodrigues em todo o seu esplendor E
de sorriso bem aberto, o que me indica que a escola Costa deve estar a dar
frutos. É uma página inteira para ela – que não li. Não há saco e, apesar do
Nogueira a detestar, o que era um ponto a favor dela, desde que a ouvi dizer que
os milhões do Parque Escolar eram uma festa, nunca mais consegui olhar direito
para a criatura. Muito menos, lê-la.
3ª página até à 7
Festival Centeno. A entrevistinha. Baldaia com a batuta. Mas, vacinado pelos subtítulos da 1ª página, já não consegui ler.
8ª página
Fico a saber que o bastonário dos médicos limita o recurso a
internos nas urgências. É só saúde.
9ª página
O esplendor da justiça. Tribunais a reabrir só para chatear
aqueles fassistas do anterior governo. Não li tudo. Mas parece que não há
pessoal para as 20 reaberturas. Ah! Nem processos. Mas reverteram, prontos.
10ª página
Foto de 1/3 da página com o ministro da educação parecendo
que vai dar um “Hi-five” a um puto duns 7 anos. Pelo caminho qualquer coisa
sobre o perigo de incêndios mas, finalmente, o perigo desapareceu por via das garantias
de segurança “por escrito”. Tudo seguro. E tudo escrito. Não se fala mais nisso.
11ª página
Ui… uma dissidenciazinha. Agora sem Alberto Gonçalves também
é preciso pôr qualquer coisa de mal. Lamas, ex-director do CCB e em ruptura com
Costa, vai apoiar Cristas. O sacaninha, né? O descaramento do homem…
Daqui para a frente a coisa serena um pouco, umas
noticiazinhas avulso porque se começa a entrar naquela parte maçuda do jornal,
meteorologia, publicidade, palavras cruzadas, desporto, etc. Ah! Na página 26
ainda há um título garrafal que cito: “Os maiores disseram que não mas ela
canta o hino para Trump”. Meteu-me pena, coitado do Trump- O maiores não cantam
para ele. E assim fiquei a saber que Elton John, Garth Brooks, Andrea Bocelli e
Celine Dion (a sorte de Trump, com esta última… ) se recusaram a cantar para
ele. Os maiores, como se vê. Mas não é que a notícia, lá para o finzinho, diz
que uma azougada e excepcional miúda de 16 anos e que aos 10 já tinha feito
furor no "America’s got talent", Jackie Evancho de seu nome e, hoje por hoje, a coqueluche
dos States iria cantar o hino para Trump, sucedendo a Beyoncé e Aretha
Franklin (tudo gente menor, como se vê). Falta dizer que a pequena Evancho já
vendeu três milhões de cópias e, horror, por duas vezes já tinha cantado para
Obama. É… isto está tudo na notícia mas é preciso lê-la toda. E nem toda a
gente o faz. Mas fica o título garrafal sobre os maiores que disseram não a
Trump.
Chego à sobremesa com o Guterres a dizer que não é
milagreiro (!!!), a Joana Petiz a dizer que as urgências estão melhoradas e
Adriano Moreira a falar de uma teoria qualquer da morada errada e que confesso
já não ter lido. De resto, vistas bem as coisas, só li títulos. Ou quase.
Feliz do português em Portugal que goza de tal Comunicação
Social. E agora vou trabalhar, porque cheguei ao computador e não resisti a
fazer esta pequena nota. E, em definitivo: agora não tenho mesmo mais jornais
para ler. Por muito que o Miguel Sousa Tavares, o Centeno e o Pacheco Pereira
se choquem ou amuem, passo a ler só na net e um ou outro jornal estrangeiro.
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Etiquetas: comunicação social, dn
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