quarta-feira, janeiro 04, 2017

Que bom, que bom, que bom…



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…termos alguém que olhe por nós. Que tenha conseguido reverter as maldades do governo anterior e possamos, enfim, começar a colher os frutos. Que bom, que bom, que bom termos jornais que no-lo recordem, não vá nós andarmos distraídos e nos percamos nos caminhos ínvios da injustiça, como quando o ano passado quase nos enganámos e demos mais votos àquele malandro do Passos Coelho.

Que bom, que bom, que bom folhearmos o jornal enquanto almoçamos circunstancialmente sozinhos e nos apercebemos deste manto de virtude e aconchego em que vivemos e do paraíso que aí vem, sem serpentes, maçãs ou mulheres nuas tapadas com parras. Mas reparemos no DN de hoje, em boa hora re…qualquer coisa pelo Baldaia que, de repente, retomou a arte de cavalgar a sela dos ideais sociais e conseguiu pôr o jornal a gorjear virtudes, trilando notícias de encantar como o som melodioso de um canário de estirpe. Mas sigam-me jornal fora:

1ª página

Título a três colunas: Entrevista a Mário Centeno. “Não haverá garantias de Estado no Novo Banco”. E segue-se um rosário de notas e comentários, entre muitos, como “Nacionalizações – Quando se trata de garantir a estabilidade do sistema nada estará fora de questão”. E mais, Centeno, zangado e muito sério diz, sobre Domingues, que a tentativa de generalizar sms como se fossem facebooks (sic) comigo não funciona. Ah! Centeno duma cana. Metam-se contigo, metam… entretanto lá vem a ladainha do crescimento acima de 1,2% e défice abaixo dos 2,5% do PIB, e a dívida pública líquida desceu um ponto percentual do PIB no ano passado e fiquemos por aqui. Não li a entrevista porque já não há saco.

2ª página

Aleluia. Maria de Lurdes Rodrigues em todo o seu esplendor E de sorriso bem aberto, o que me indica que a escola Costa deve estar a dar frutos. É uma página inteira para ela – que não li. Não há saco e, apesar do Nogueira a detestar, o que era um ponto a favor dela, desde que a ouvi dizer que os milhões do Parque Escolar eram uma festa, nunca mais consegui olhar direito para a criatura. Muito menos, lê-la.

3ª página até à 7

Festival Centeno. A entrevistinha. Baldaia com a batuta. Mas, vacinado pelos subtítulos da 1ª página, já não consegui ler.

8ª página

Fico a saber que o bastonário dos médicos limita o recurso a internos nas urgências. É só saúde.

9ª página

O esplendor da justiça. Tribunais a reabrir só para chatear aqueles fassistas do anterior governo. Não li tudo. Mas parece que não há pessoal para as 20 reaberturas. Ah! Nem processos. Mas reverteram, prontos.

10ª página

Foto de 1/3 da página com o ministro da educação parecendo que vai dar um “Hi-five” a um puto duns 7 anos. Pelo caminho qualquer coisa sobre o perigo de incêndios mas, finalmente, o perigo desapareceu por via das garantias de segurança “por escrito”. Tudo seguro. E tudo escrito. Não se fala mais nisso.

11ª página

Ui… uma dissidenciazinha. Agora sem Alberto Gonçalves também é preciso pôr qualquer coisa de mal. Lamas, ex-director do CCB e em ruptura com Costa, vai apoiar Cristas. O sacaninha, né? O descaramento do homem…

Daqui para a frente a coisa serena um pouco, umas noticiazinhas avulso porque se começa a entrar naquela parte maçuda do jornal, meteorologia, publicidade, palavras cruzadas, desporto, etc. Ah! Na página 26 ainda há um título garrafal que cito: “Os maiores disseram que não mas ela canta o hino para Trump”. Meteu-me pena, coitado do Trump- O maiores não cantam para ele. E assim fiquei a saber que Elton John, Garth Brooks, Andrea Bocelli e Celine Dion (a sorte de Trump, com esta última… ) se recusaram a cantar para ele. Os maiores, como se vê. Mas não é que a notícia, lá para o finzinho, diz que uma azougada e excepcional miúda de 16 anos e que aos 10 já tinha feito furor no "America’s got talent", Jackie Evancho de seu nome e, hoje por hoje, a coqueluche dos States iria cantar o hino para Trump, sucedendo a Beyoncé e Aretha Franklin (tudo gente menor, como se vê). Falta dizer que a pequena Evancho já vendeu três milhões de cópias e, horror, por duas vezes já tinha cantado para Obama. É… isto está tudo na notícia mas é preciso lê-la toda. E nem toda a gente o faz. Mas fica o título garrafal sobre os maiores que disseram não a Trump.

Chego à sobremesa com o Guterres a dizer que não é milagreiro (!!!), a Joana Petiz a dizer que as urgências estão melhoradas e Adriano Moreira a falar de uma teoria qualquer da morada errada e que confesso já não ter lido. De resto, vistas bem as coisas, só li títulos. Ou quase.

Feliz do português em Portugal que goza de tal Comunicação Social. E agora vou trabalhar, porque cheguei ao computador e não resisti a fazer esta pequena nota. E, em definitivo: agora não tenho mesmo mais jornais para ler. Por muito que o Miguel Sousa Tavares, o Centeno e o Pacheco Pereira se choquem ou amuem, passo a ler só na net e um ou outro jornal estrangeiro.


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