Gente com opinião tem sempre razão
Torna-se-me cada vez mais espinhoso perceber os desígnios da
nossa comunicação social. Oscilo ente uma campanha especialmente gizada para
manter os níveis do politicamente correcto em boa medida ou, simplesmente,
começo a convencer-me que os seus agentes são maioritária e firmemente
estúpidos.
Estou a trabalhar e oiço uma torrente de comentários sobre o
tal burkini. Abstenho-me de fazer as minhas próprias considerações sobre a
questão, tanto mais que até há pouco tempo atrás ninguém falava no assunto
(porque o assunto não existia) e, sobretudo, porque me impressiona a dificuldade
ou negação de muitas pessoas em perceber que o tal do burkini, mais do que o
exercício de uma liberdade que as burkineiras não têm na terra delas, constitui
claramente uma ferramenta provocatória. Por isso, repito, não vou entrar em
considerandos sobre um assunto idiota. E que as pessoas se lembrem de que tanto
direito têm as muçulmanas de se vestirem como quiserem (ou os homens as
obrigarem), na terra delas, como os franceses têm o direito de proibir o que
lhes apetecer na terra deles.
Voltando à TV, estou a trabalhar e tenho em ruído de fundo,
repito, uma torrente de gente indignada com os franceses e produzindo os mais
disparatados argumentos sobre a matéria, desde a liberdade das mulheres ao
exemplo das freiras, passando pelo respeito dos símbolos religiosos e tradicionais
de cada qual. Um coro de indignados, curiosamente mais mulheres que homens, de
gente que provavelmente há pouco tempo atrás berrava contra os cruxifixos nas escolas.
À função colaborava a apresentadora da TV, quiçá mais indignada que os ouvintes,
ao mesmo tempo que anunciava a opinião de um “especialista” na matéria, nos
intervalos dos telefonemas.
E assim vai o mundo (o português). Uma plêiade de gente
justa, que preza a liberdade e com um espírito solidário que lhe vem das entranhas.
E, ainda, com uma notável clarividência sobre os mais delicados e momentosos
problemas do planeta. Foi assim com Timor, é com Angola, com a invasão do Iraque,
a cimeira dos Açores e com Guantánamo, entre outros. Que não usem a mesma
clarividência para tratarem dos seus próprios problemas e ratifiquem coisas
estranhas como uma geringonça governante já são outros quinhentos.
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Etiquetas: Ai Portugal, burkini, comunicação social
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