sexta-feira, abril 24, 2015

Home sweet home


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Uma pessoa anda circunstancialmente retirada da intriga política paroquial, regressa a casa e esbarra num círculo para o qual não há quadratura que chegue. Ainda que o quadrado tente avidamente uma geometria impossível, percorrendo os círculos possíveis que, apesar de possíveis, acabam sempre por não ter arestas, vértices e por ter os 360 graus que lhes caíram em sorte.

E foi embrenhado nesses círculos que voltei, com algum deleite, a ouvir a argumentação de Pacheco Pereira, hoje resumida a pouco mais que a imagem de um garoto a quem lhe roubaram o arco. E ela continha um novo conceito filosófico que vou gravar a ouro na minha memorabilia televisiva: - A realidade é um fenómeno meramente interpretativo, disse Pacheco Pereira. Em português de pastelaria às nove da manhã a coisa significa que eu empresto quinhentos euros a um amigo e ele depois interpreta essa dívida da forma que achar mais conveniente, em nome da tagarelice do costume à volta da dignidade, da fome, das penhoras e do mais que os sábios da paróquia usam e abusam para envergonhar uma direita que só acredita em mercados.

Houve mais, houve outras tiradas de estirpe, tudo à volta das linhas programáticas de um exercício que não é programa, muito menos a Bíblia, em que Centeno, Galamba e comandita emitem as epístolas, mesmo não sendo os apóstolos. Mas o que me ficou gravado foi mesmo a realidade levada à potência de fenómeno interpretável, longe da figura imutável do espectro político que a actual maioria nos proporcionou com o cortejo de constrangimentos que se conhece, com o aval da tróica versão António Costa, qual seja a formada por Passos Coelho, Portas e Cavaco. O que realmente me tolhe a paciência é não haver alguém que peça a Pacheco Pereira, desejavelmente até o moderador do programa, que «se explique» e que interprete a realidade lá à maneira dele para nós percebermos bem o que ele pretende. Ou, quem sabe desvende o segredo de Polichinelo que ele parece ter engasgado e que, por razões que me escapam, ele não consegue consubstanciar e detalhe, por fim, a unidade dos contrários de Polichinelo que ele parece defender com uma reserva assaz irritante, todavia teoricamente aceitável e própria dos eleitos.

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