sábado, abril 25, 2015

41 anos


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Na minha geração, muitos não perceberam que o 25 de Abril resultou de uma acção corporativa dos oficiais de carreira que viam, com desconfiança e ódio, a ascensão de alferes milicianos, passados à disponibilidade como tenentes e, se chamados de novo à carreira militar, recolocados como capitães. Pela necessidade da guerra colonial que absorvia mais oficiais na quadrícula de guerra que os disponíveis, não falando naqueles cuja incompetência limitava a acção militar no terreno. O descontentamento dos oficiais do quadro permanente criou permeabilidade à influência do Partido Comunista que através dos seus arietes conseguiu pautar a revolução e conduzi-la, mais tarde, ao desastre que se conhece. Tanto na política interna, como na criminosa política de descolonização, feita sem brio, sem honra e sem respeito pelos cidadãos portugueses e das colónias, muitos deles fuzilados após a independência por terem servido o exército português.

Na minha geração havia também os que percebiam tudo isto, mas gostavam e rejubilavam com a treta do amigo em cada esquina, dos amanhãs a cantar, dos pioneiros, dos continuadores, das emulações socialistas, das palmas organizadas, da gaivota a voar, a luta a continuar e o povo a ordenar e toda aquela parafernália que servia para sujeitar os cidadãos incautos a um tipo de influência, junto da qual a mocidade portuguesa era uma brincadeirinha de crianças. E havia os fundamentalmente estúpidos que não percebiam sequer o que se estava a passar, mas que viam, de repente, uma forma de se projectarem no universo mediático e, até, na partilha de poder. E, sim, havia aqueles que genuinamente, percebiam o gosto da liberdade e da libertação.

Feliz e infelizmente, a geração actual está muito longe já deste fenómeno e cada vez menos cometida a uma celebração que já pouco lhes diz, ressalvando os jovens, como hoje vi na televisão, que vão recebendo o espírito de Abril por injecção dos paizinhos zelosos e progressistas.

Que ninguém levante uma voz sequer ao meu sentimento pessoal sobre a suprema sensação de liberdade, que devo ao 25 de Abril. Cada um reagiu como pôde, ou como soube, à ditadura do Estado Novo e eu reagi à minha. Mas não sou sectário nem estúpido e se louvo a liberdade, o desenvolvimento interno, a melhoria insofismável de vários índices da nossa cidadania como a saúde, a educação, as infra-estruturas internas e o rendimento de família, da mesma forma tenho de vituperar o aproveitamento espúrio do 25 de Abril para fins meramente políticos e a manipulação de grupos políticos claramente impreparados (ou idiotas, ou venais) para derrubarem ciclicamente a nossa economia e nos colocarem na lista da sopa dos pobres da Europa. E, neste particular, receio que a saga continue.

Mantenhamos a esperança, um vocábulo que os portugueses conhecem e apreciam tanto como a fadista saudade. E sonhemos que a geração actual, eventualmente mais preparada, mais sábia e mais honesta, consiga de uma vez por todas guindar Portugal a um lugar onde o respeito pelos outros se misture com o respeito que nos é devido a nós próprios. Assim o saibamos merecer. E que o 25 de Abril passe a um feriado de guarda, sim, mas isento das «terceiro-mundices» bafientas do costume.

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