Acreditar na liberdade e na «free will»
Faz hoje vinte e cinco anos que me sentei a bordo de um
avião da SAA para me deslocar a Joanesburgo, coisa que, de resto, eu fazia
todos os meses uma ou duas vezes, quando vivia em Maputo.
Mal o avião descolou começou a circular a notícia da queda
do muro de Berlim. São os mistérios da propagação das notícias, sobretudo se
pensarmos que a net nessa altura era ainda um brinquedo de tempos livres, mas a
verdade é que as notícias se propagam um pouco como a fé. Sem a gente perceber
bem como.
Em Joanesburgo, tive acesso à confirmação da notícia, já com
algum detalhe. Foi, sem receio de errar, um dos dias mais marcantes da minha
vida. Para quem como eu, juntou ao que lera e estudara sobre os regimes comunistas
as «aulas práticas» que a vivência em alguns países sob domínio da União
Soviética me proporcionou, o derrube do muro constituiu um facto inesquecível e
uma reconciliação com a espécie, no caso, a minha.
Com o derrube do muro instalou-se em mim, mais do que a
noção de que passariam a existir novos rumos de economia e desenvolvimento, o
respeito pelo primado do individualismo e da liberdade, coisa que os cidadãos
desses países não tinham. Pior: liberdade, julgavam que tinham. Individualismo
era, um fenómeno reservado aos cidadãos do mundo ocidental que não haviam tido a
fortuna de ser doutrinados nas premissas básicas do homem novo, cheio de amigos
a cada esquina e enformado no espírito universal e internacionalista.
Vinte e cinco anos depois, há ainda muita gente que sonha
com o regresso do muro. Feliz e saudavelmente, os comunistas foram desaparecendo
do horizonte político da Europa e mesmo do mundo. Mas em Portugal existe esta
espécie de indomável aldeia gaulesa que continua a pugnar pelo retorno das
liberdades e pela aniquilação do grande capital e dos poderosos (ou, para citar
Mário Soares, dos magnatas do petróleo) – vale a pena ler o último Avante. Uma
situação que contribui decisivamente para este limbo em que ainda nos
encontramos e que é mesmo motivo de chacota na opinião das democracias europeias.
E como se isso não bastasse existe mesmo, para usar um termo do futebol, uma
vaga de «segundas bolas» manejada pelo chamado «socialismo democrático» que nos
coloca periodicamente na penúria, na bancarrota e mantém um inqualificável
regime de doutrinação junto dos mais desfavorecidos e da juventude, por via de
sistemas que aprenderam e sublimaram no marxismo.
Mas hoje é dia de celebração de «muro abaixo». E isso devia
ser motivo de imensa felicidade para todos os amantes da liberdade. A RTP devia
fazer serviço público e, no mínimo, passar o filme Good Bye Lenine.
*
*
Etiquetas: angústias do socialismo, comunismo, muro de Berlim
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home