Ai Timor!
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Portugal costumava ser um país amorfo. Alguns dos seus
nativos, poucos, libertavam-se desse amorfismo e projectavam o seu brilho.
Depois veio o 25 de Abril e os portugueses sorriram. Muito rapidamente esse
sorriso deu lugar ao medo e a um sentimento de confusão. Mas, de alguma forma,
houve quem resistisse (alguns que souberam dizer não, não por causa de Manuel
Alegre mas, provavelmente, contra ele…), houve mesmo quem soltasse um sonoro
«bardamerda» e a coisa foi minimamente aos carris.
O tempo passou e os fazedores do homem novo foram então, subrepticiamente, minando o sistema e ocupando lugares estratégicos e com um oratória de papas e
acções de bolos foram enganando um número crescente de tolos. Com os tolos ia-se
formando uma franja de (eu sei que é um cliché, mas não vejo outra forma de o
dizer…) idiotas úteis que se iam segmentando à medida das suas capacidades,
ocupação ou atribuições. Todos eles, porém, deliciados com o protagonismo que
as tais papas e os tais bolos lhes traziam. E o país passou a ser fértil em
causas. As pessoas passaram a defensores de causas e qualquer coisa minimamente
correcta e «como deve ser», do aborto à defesa do lince ibérico, passando pela
neve que derretia no Kilimanjaro ou qualquer coisa que tivesse a ver com Passos Coelho ou a saúde da coligação foi promovida a causa e a suscitar pensamentos,
palavras e obras apropriados.
Este rápido pensamento releva do recente enxovalho que
sofremos em Timor-Leste. No fundo, a atitude dos timorenses não deslustra da
ideia geral do que aquela rapaziada no poder pode fazer. O que realmente
chateia é recordar os cordões humanos, a oratória inflamada de gente a berrar
pela liberdade de Timor, mesmo que nas mãos de um reconhecido comunistóide,
agora convertido à democracia, como Xanana,
e as semicolcheias do Luis Represas a cantar, embargado, o “Ai Timor” e
concluir que, sim, somos um povo de causas, petições e abaixo assinados. A neve
voltou ao Kilimanjaro, os linces aguentam a passada, as baleias ainda por aí
andam, a calote polar ainda lá está… e Xanana teve a hombridade de esclarecer a
grei lusitana que justiça é justiça, tudo bem, mas petróleo é petróleo e as
coisas, neste particular, são diferentes. Porque, naturalmente há justiças mais
justas que outras.
Acho que os portugueses deviam fazer já um cordão humano,
vestir camisas brancas (eram brancas, não eram?) e percorrer as ruas de Lisboa a
berrar por Timor e deveria compor-se mesmo uma nova canção onde o «Ai Timor»
pudesse significar que, no fundo, a culpa do Xanana ter posto na rua os
magistrados portugueses não é dele, puro, democrata e simpatizante do esselbê, a culpa é dos poderosos ou dos magnatas do petróleo, como diz o
Mário Soares. E a Ana Gomes devia dizer qualquer coisa também, nos intervalos da
alhada em que se meteu com os estaleiros de Viana…
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Etiquetas: Ai Portugal, Ai Timor
1 Comments:
Valores mais altos se alevantaram... e Xanana baixou a garupa. Excelente artigo.
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