quarta-feira, setembro 08, 2010

Enquanto nos assoamos à gravata...


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Tem de haver uma razão plausível para esta autêntica esquizofrenia nacional, qual seja a de transformar notícias perfeitamente razoáveis numa mostragem de estética duvidosa mas de indesmentível eficácia na formação de opinião pública, sobretudo quando essas notícias permitem evocar uma ética e um pensamento políticos que não deixem dúvidas sobre a superioridade moral de um colectivo asséptico e imune às aleivosias retrógradas e fascizantes de alguns dos nossos líderes europeus – o nosso.

É assim que eu começo a ouvir uma arenga interminável sobre uma acção policial… em Itália, arredores de Milão, a alusão amiúde aos nomes de Sarkozy, Berlusconi, fascismo, ciganos, xenofobia, recentes medidas contra ciganos, expulsão, até à passagem para o concreto de uma operação que envolveu uma força policial de duzentos elementos fardados e armados para a expulsão de duzentas famílias ciganas que tinham estabelecido o seu acampamento e que eram forçadas a retirar.

À medida que a notícia se desenvolve, o tom e o conteúdo vão (não havia escolha) carrilando a história para o que, afinal, parece ter sido uma meritória acção da polícia milanesa que ordeira e civicamente conduziu a retirada das famílias ilegalmente acampadas numa área industrial reservada e inapropriada à ocupação humana, transferindo-as para uma área onde previamente tinham organizado um complexo residencial que lhes proporcionasse condições dignas de vida, ao mesmo tempo que se libertava a tal zona industrial que não comportava a presença humana.

Esta notícia, embrulhada no pré-suspense referido, dita por um jornalista anónimo num tom semelhante ao das vozes-off dos documentários sobre o holocausto, sobretudo nos episódios em que se vê filas de vítimas a serem conduzidos de pijamas às riscas para os fornos crematórios, saiu na SIC e é um bom exemplo de como se manipula a opinião pública, trabalhando-a a um ponto em que, às tantas, o fim da notícia já não interessa e se retém apenas o essencial. O que interessa.

Continuo a dizer que tem de haver uma razão para esta… patologia enervante, de arraiais mais ou menos assentes nas televisões. Saliento, particularmente, as vozes-off destas pérolas noticiosas. O tom acusatório, trágico, irremediavelmente cometido à permanente injustiça em que estamos mergulhados por causa dos ricos, poderosos e governos de direita (basicamente Sarkozi, Berlusconi e Merckel) revela a existência de um fenómeno de difícil compreensão, mas que claramente denuncia esta mania nacional que somos de esquerda, progressistas, moralmente superiores, politicamente correctos e atentos à solidariedade internacionalista. Só me espanta que sendo nós assim tão escorreitos de ideias e princípios não consigamos bater a besta e arrastar a carroça para os níveis médios europeus de uma desejável sociedade mais justa e qualitativa. Pelo contrário, continuamos a registar uma trágica linha de divergência nos indicadores económicos e sociais. Mas isso deve ser, necessariamente, culpa de Sarkozi, Merckel e Berlusconi, uns pulhas incultos, xenófobos, racistas e insensíveis que se entretêm a transferir ciganos de zonas de fixação humana proibida para outras com aceitáveis condições de vida dignas e enquadradas na legalidade. Não fossem eles e outro galo cantaria. Olarila.


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4 Comments:

At 8:34 da manhã, Blogger Pedro Barbosa Pinto disse...

Desde que o jornalismo passou a curso superior foi no que deu. Eles agora são doutores! E esses, das vozes-off, devem estar a fazer algum mestrado!

 
At 8:36 da tarde, Blogger estouparaaquivirada disse...

MAS QUE BEM QUE TU FALASTE!
CONCORDO INTEIRAMENTE CONTIGO.

 
At 7:08 da manhã, Blogger Nelson Reprezas disse...

Pedro Barbosa Pinto

São vozes adequadas às circunstâncias. Eu não sei se são mestrandos mas que são vozes estudadas, são...

 
At 7:09 da manhã, Blogger Nelson Reprezas disse...

papoila

Puxa... com maiúsculas e tudo :))))
Já leste os blogues todos?

 

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