Da operação quase satírica, roçando o erótico e certamente burlesca da colheita de uma amostra de urina
Eu assim, velho, velho, não sou. Mas ainda me lembro de, em
jovem, ir a um qualquer laboratório de análises e ver gente com garrafas de refrigerante
ou cerveja embrulhadas em folhas do Diário de Notícias encobrindo (muitas
vezes, mal) a primeira urina da manhã de muita gente que, por isto ou por
aquilo, tinha de fazer análises. Era o tempo da famosa Urina Tipo II,
designação hoje vertida numa designação mais harmónica com os tempos modernos
de análise sumária com análise de sedimento. E era assim que me recordo do par
de vezes que fiz este tipo de análises que me vi rodeado de gente com
garrafinhas de laranjina C semi-embrulhadas em papel de jornal que colocavam
num cantinho de chão junto aos pés, enquanto liam uma revista com dois ou três
anos de idade da sala de espera.
Com a modernização que assolou o país, auto-estradas e
assim, também os laboratórios de análises acompanharam o passo do progresso e
foi assim que perante a indicação do meu médico fui fazer um exame geral que
inclui análises de sangue e urina. Pelo que me dirigi a um laboratório de
análises e percebi que a velhinha Tipo II sofreu um adequado aggiornamento e me deram uma espécie de tubinho de ensaio para a colheita de urina. Hoje
de manhã, obediente às instruções da menina do laboratório, acordei muito cedo
e atirei-me à operação de colheita e aí a porca torceu o rabo. Eu sei que sou
um homem dimensionado dentro dos parâmetros normais dos hominídeos, serve isto
para dizer que não sou grande nem pequeno, sou assim a atirar para o normal,
mas quando me vi obrigado a «acertar» (é o termo) com a primeira urina da manhã
num tubinho de cerca de 10 cm de comprimento e não mais que 10 mm de
diâmetro percebi que a «coisa» ia ser complicada. Começa porque um cidadão
acorda como um exemplo acabado daquele princípio da física de que o calor
dilata os corpos, uma saudável questão que eu espero ver continuada por muitos
mais anos e deve haver um calor qualquer durante o sono que se encarrega de
no-lo provar. Depois… pôr um cidadão a praticar tiro ao alvo ainda com sono, a
veicular o tal princípio da física e com um potencial fluxo comparável às
cheias da avenida de Ceuta no princípio dos Outonos de cada ano é realmente
complicado. A gente segura no tubinho, obviamente estreito para colocar lá
dentro seja qual for a peça anatómica do corpo e percebe que... não dá... a opção é acertar
com o fluido corporal na abertura do tubo e é isso que faz. Depois de pormenores que me abstenho de
esmiuçar, por decoro, lá acertamos com o alvo e quando pensamos que a operação
vai levar alguns segundos, eis que o tubinho se enche num lapso inferior ao dos
mecânicos da fórmula 1 a mudarem uma roda nos «pits»… ora o resultado de tudo
isto é um tubinho cheio, molhado, para não falar noutras coisas que ficam
molhadas também e não creio que haja forma de fugir a esta situação, considerado
que seja o dimensionamento normal do nosso equipamento varonil (literalmente).
Bom, mas lá acabamos com o tubinho cheio e quando pensamos que tudo o que resta
é fechá-lo com aquela eficiente tampinha de borracha, percebemos que o tubinho
está demasiado cheio. É aqui que a física entra de novo e percebo que na verdade
não há como dois corpos ocuparem o mesmo espaço, independentemente de serem
sólidos líquidos ou gasosos. Ou seja… tubinho cheio não dá… porque a tampa é de
rosca interna e penetra um bom centímetro dentro do tubo. Que tem, assim, de
ser esvaziado uns dois centímetros para a tampa penetrar o tubo e cumprir a sua
missão.
Acaba tudo numa profusa lavagem exterior do tubo, das mãos e
de outras coisas que não vêm ao caso. É no que dão estas modernices. Não digo
que voltemos à era de irmos para uma sala de espera com uma garrafinha de mini
embrulhada numa folha do Correio da Manhã ou me expliquem, finalmente, o que
era aquilo da Urina tipo II. Mas, sinceramente, não há como providenciar uns
tubinhos um pouco maiores? Digamos… uns tubos, tubos… juro que isto não é publicidade
enganosa, este desabafo decorre de serem ainda cinco e meia da manhã, eu ter de
estar no consultório às oito e recear ir para a cama de novo, pelo que me
atirei ao duche, olhei de soslaio para o tubinho (inho, inho, inho), lavado,
seco e depositado num cantinho da pedra do lavatório e lembrar-me que a melhor
maneira de passar este bocadinho era vir aqui desabafar e apelar ao ministério
da saúde que em vez de andar para aí preocupado com problemas menores como as
dívidas às farmácias, médicos a menos, enfermeiros a mais e tempo de espera das
cirurgias se lembrasse de propôr ao parlamento a adopção de tubos de colheita
de urina, em vez deste material liliputiano que se por um lado nos dá uma
sensação de vincada manhood (a dificuldade de coordenarmos a nossa dimensão à
coisa ou, porque não, coordenarmos a coisa à dimensão…), por outra nos conduz
àquele velho conceito das mulheres, segundo o qual os homens são uns
descuidados e raramente conseguem acertar na sanita.
.
Etiquetas: coisas do demo
4 Comments:
Muito bom! Fartei-me de rir a ler o seu post! E tem toda a razão :)
Isabel Mouzinho
só tu :()
IL
Agora imagina nós... eu cá nestas situações invejo-vos sempre...
Ana, agora que falas nisso... :)
Enviar um comentário
<< Home