O costume
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Há poucos anos atrás estudava-se os substantivos comuns de dois e os epicenos. Não estou certo que isso hoje ainda se faça, a avaliar pela forma como hoje se fala e dos humores dos furiosos dos acordos ortográficos.
Isto a propósito da eleição de Assunção Esteves para presidente da Assembleia da República, e a nossa comunicação social e os nossos comentadores terem enxameado o éter com presidentes e presidentas. Um despropósito que eu levo à conta de dois factores princiais – a ignorância pura e dura e a pulsão incontrolada do politicamente correcto.
Não sei se existe uma lista dos nomes comuns de dois (a língua francesa, por exemplo, tem uma lista completa dos femininos irregulares...), mas sei que muitos deles se mantiveram ao longo dos anos até começarem a ser adulterados, como o caso da juíza que, de repente, tem honras de completa generalização e de constar na maioria dos dicionários como tal. Já presidenta é coisa mais recente, pelo que não deveriam restar dúvidas que presidenta é uma designação incorrecta. Apesar de uma doutoranda em Português, brasileira, ter sido entrevistada por uma televisão e afirmado que presidenta é um termo correcto. E porquê, perguntaríamos nós? Porque, disse ela, se um presidente for uma mulher, então deve ser presidenta (convenhamos que para argumento de um doutorando a coisa está assim para o fraquinho e inquinada!). Do que ouvi, nenhum jornalista lhe perguntou se uma senhora numa sala de espera de um médico é uma pacienta ou se uma mulher intérprete de línguas é uma intérpreta ou se as raparigas passaram a ser estudantas. Mas já estou habituado à pobreza franciscana dos nossos agentes de comunicação social.
Apesar de tudo parece que o bom senso imperou e a maioria designou Assunção como presidente. E assim é que deve ser. A menos que aconteça aos presidentes o que aconteceu aos juízes, já que juíza passou a constar em grande parte dos dicionários e já quase ninguém o discute.
PS – Um abraço a um amigo que tem uma noção pós-moderna do português, i.e. sabe os termos correctos, mas é apologista de uma forma de falar confortável e entendível, assim tipo o Natal é quando nós quisermos. Ele acha que se pedir trezentos gramas de fiambre numa charcutaria não entendem e trezentas dá muito mais jeito de articular.
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Etiquetas: a arte de falar mal, modas e vícios de linguagem
6 Comments:
Na era do "fast food", alguém vai lá entender que o Língua é o primeiro Património?
Este comentário foi removido pelo autor.
Alexandra
Alexandra... Alexandre... Alexandra... Alexandre... hummm Eis um caso em que não restam dúvidas de que Alexandra é que deve ser. Não há «comum de dois» (!!!) que resista. Não vejo como seria possível encontrá-la e dizer: Olá Alexandre, está boa? :)))
Tinha escrito uma longa história onde imaginava EspumantEs e EspumantAs, mas meti os pés pelas mãos e como sou uma reles internautA e não um internautO :)* doutorado como tu, deixei tudo ir para o brejo.
Por força da empreitada a que me lancei quando ousei escrever um livro até deveria ir a fundo nessa questão, mas como ouvi de vários editores, que escritor não é revisor te digo Espumante que se a presidente do lado de cá fizer um bom e honesto trabalho eu juro que arremato o cargo dela com a vogal que mais a agradar:)
Dulce
Já internautO não sou... o disco rígido
Tragou-me o estro desfeito em vento
Porque aos céus ultrajei! O meu tormento
Leve me torne o solo frígido
Conheço agora já quão vã figura
Em bytes, megas e kilos fez meu louco intento
Musa... Tivera algum merecimento
Se tivesse sabido, antes, a realidade pura
Mas eis-me aqui arrependido: a língua quase fria
Brada em alto pregão toda a saudade
Que atrás de mil teclados corria
Por isso busco de novo a verdade
Rasgo os words, os re-boots e os defrags
E entrego-me, peito feito, à realidade.
Nota: Já pedi desculpa ao Bocage :))))
:)*
Pois se eu fosse ele, fazia ouvidos moucos às desculpas e ainda te pedia para escrever a quatro mãos!:)))*
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