segunda-feira, agosto 13, 2007

A propósito de Torga



[1943]

Passa hoje o centenário do nascimento do bardo Torga. A oficiosa RTP mandou uma jornalista qualquer sentar-se no meio das serras e apresentar o telejornal da tarde. Tudo, naturalmente, por causa do dito Torga. Torga nunca me impressionou como escritor. Um conto ou outro, um ou dois poemas e basta. O "Diário" é de fugir. E toda a mitologia construída à volta do autor de Bichos também. Foi um putativo Nobel, julgo que apenas na cabeça de meia dúzia de luminárias da "cultura". Tinha uma coisa boa: mau feitio. De resto, preferirei sempre Vergílio Ferreira a este montanhês constantemente incensado. O padrão do nosso rusticismo literário e saloio escreveu uma vez no seu infindável "Diário" que "não há nada mais repugnante do que um escritor a ejacular pela caneta" referindo-se a Henry Miller. Tomara ele.

João Gonçalves no Portugal dos Pequeninos

Miguel Torga nasceu faz hoje cem anos. Sobre este assunto o Pedro Correia tirou-me as palavras da boca. Realmente, quem os viu e quem os vê. Durante vinte anos, Torga foi incensado pelo PS a propósito e despropósito. Uma vez morto, o partido esqueceu-se dele como se esquece dos outros. Torga é um bom exemplo da fatuidade das “honrarias” institucionais. Ninguém como ele tão poeta oficial (1974-1995), ninguém como ele tão resolutamente esquecido pelo país, pelos pares, pela Academia, pelo jornalismo literário, pelos políticos que andaram vinte anos a citar-lhe os textos. O enfado do ministério da Cultura não surpreende.

Eduardo Pitta, no Da Literatura
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