quarta-feira, julho 08, 2009

Angola aos pedaços ( 2 )


Para os que conhecem: Cachoeira, na estrada que liga o Sumbe/Porto Amboim à Gabela. É uma estrada recentemente pavimentada, de elevada qualidade, que serpenteia serra acima, mas muita perigosa pela sinuosidade e pela humidade do piso devido aos nevoeiros intensos e quase diários nesta altura do ano. Nota-se na foto um pé solitário de café, um indício de que a produção de café está a ser dinamizada, de resto pelo «nosso» Nabeiro através dos Cafés Delta. Apesar de tudo, o café produzido não chega ainda sequer para o consumo nacional.

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Conforme referi em post anterior, tive ocasião de viajar quase um par de milhares de quilómetros em Angola, por estrada, coisa que não fazia há muitos anos. Ir a Angola significava, para mim e muitos como eu, ir a Luanda e fraldiscar no Hotel Trópico onde se tratava de tudo o que havia para tratar até se ir jantar a um qualquer restaurante da ilha.

Desta vez viajei de carro e a primeira impressão é a qualidade das estradas. Largas, bom piso, boas marcações horizontais e verticais, são hoje ligação cómoda e rápida entre praticamente todas as capitas de província daquele extenso território de 1.200.000 km2 onde Portugal cabe catorze vezes e mais uns trocos. E é nesta parte que reparamos que os angolanos substituíram o perigo das minas antigas pelo perigo de se matarem diariamente através do binómio estrada boa/carro bom que claramente domina o interior do país. Na verdade, apesar da superior qualidade das estradas, há um número preocupante de acidentes mortais que aparentemente se explica por isso mesmo.

Há qualquer coisa que me faz meditar na inegável herança portuguesa neste povo longínquo que para além de dispor de sumos Compal, água de Luso, vinho alentejano ou duriense, sardinhas algarvias, manteiga açoreana ou cerveja Cristal, entre provavelmente centenas de outros artigos made in Portugal, herdou um comportamento na estrada que só pode ter permanecido através da nosso legado de gente que guia como se tivesse acabado de roubar o carro. Aceito que a situação em Portugal é hoje melhor, há menos acidentes, menos mortos e um melhor comportamento na estrada. Diria que em Angola estão na nossa fase de há trinta anos atrás em que à velocidade desajustada à topografia do terreno se junta aquela forma estouvada que alardeamos em mais ou menos tudo o que fazemos. O resultado está à vista com acidentes mortais diários a polvilharem as excelentes estradas do país.

Nota: Há milhares de motos no interior de Angola. Qualquer posto de abastecimento de combustível tem, normalmente, um amontoado (em Angola não há bichas, há aglomerações) de muitas, mas muitas dezenas de motos que são o transporte de excelência no exterior. Quer para transporte próprio quer para fazer de táxi. As motos são chinesas, muito baratas (uma 250 c.c. pode custar cerca de não mais que US$1000) e de marcas inimagináveis como «leopardo», «leão da savana» e/ou termos regionais. São motos de conceito antiquado mas design mais ou menos actualizado e apelativo. Enxameiam as pequenas povoações ao longo da estrada e há uma espécie de liturgia a seguir no seu abastecimento, como me foi explicado e que consiste no abastecimento diário na quantia exacta do resultado da actividade do dia. Nem mais, nem menos. Isso, aliado ao monopólio da distribuição de combustíveis da Sonangol origina aglomerações de mais de uma centena de motos nas bombas. Curiosamente, os motociclistas facultam a passagem de um carro ao local do abastecimento, abrindo alas á sua passagem àqueles que, como eu, pensavam que teríamos de aguardar que cem motos fossem abastecidas até chegar a nossa vez. Cá está uma simpatia que os angolanos devem ter herdado de todas a gente que não dos portugueses, com certeza absoluta.

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6 Comments:

At 10:40 da manhã, Blogger Dulce Braga disse...

Cada vez fico mais tentada a "pedir para meu marido me levar":))

 
At 11:45 da manhã, Anonymous IL disse...

como é que diz leopardo em chinês?
lol

 
At 3:17 da tarde, Anonymous Anónimo disse...

1. Parabéns e obrigada pelos bons momentos de net que me dá diariamente.

2. Obrigada pelos bocados de Angola que trouxe em directo. Nessa altura estive tentada a pedir-lhe que "esmiuçasse" a sua análise, sedenta que estou sempre de ler coisas sobre aquela minha terra e antecipadamente ciente de que, escrito por si, o quotidiano de Angola me chegaria com som e cheiro....Fiz bem em esperar pois aqui está um texto, desses, reais. Espero por mais.

3. Não creio que o comportamento rodoviário dos angolanos seja herança dos portugueses e julgo que a simpatia dos motoqueiros se relacionará com a reverência aos mais abastados.Money rules.....
Margaridacf

 
At 7:41 da manhã, Blogger Nelson Reprezas disse...

Dulce Braga

E ele leva? Não é dia de jogo?
:)

 
At 7:42 da manhã, Blogger Nelson Reprezas disse...

IL
Vou investigar. Chopleo-pardsui, será ?
:)

 
At 7:44 da manhã, Blogger Nelson Reprezas disse...

Margaridacf

Se o money mandasse eu era seguramente um dos últimos a atestar a viatura :))))
Obrigado pelo comentário

 

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