Dormindo com as causas
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A f. tem uma amiga que fez um aborto com uma bomba de bicicleta numa mesa de cozinha, recebeu uma vez €400 de uma empregada de 18 anos para fazer um desmancho (termo dela, da f.), enquanto uma outra amiga, acompanhante, esperava, de óculos escuros (e este pormenor dos óculos escuros é importante) no carro. Foi isto que ela contou num texto incisivo, modernaço, dizendo, en passant, que há tanta gente como esta, que espera seja a maioria no dia 11. Não sei se espera que seja uma maioria a votar sim no referendo ou uma maioria a fazer “desmanchos” numa mesa de cozinha com uma bomba de bicicleta, enquanto as amigas esperam no carro. De óculos escuros, bem entendido.
Chego a esfregar os olhos com o delírio de pessoas que ainda hoje recorrem a este tipo de argumentário para fazer prevalecer as causas a que se entregam. Agora é o aborto, amanhã será outra coisa qualquer, é preciso é adormecer com a causa, dormir com a causa e acordar com a causa, seja ela qual for.
É mau. É revelador. E, mais grave, acaba por condicionar a análise racional e serena que deveria decorrer de problemas realmente importantes e sérios como é a questão do aborto. O aborto não é para ser tratado à la Zeca Afonso, com uma ceifeira de lenço a cantar ou um operário a correr um patrão qualquer ao pontapé no cu. Requer serenidade, honestidade política e debate. Sério. Na fase em que estamos, a coisa não está muito diferente de quando as mulheres iam para o cimo do Eduardo VII abanar os peitos e berrar "abaixo o sutiã", provavelmente as mesmas que hoje usam wonderbra e fazem correcção plástica aos mamilos, quiçá muito ou pouco desenvolvidos ou, no extremo, feiotes. No fundo, mudam as moscas. A mentalidade, essa, continua a mesma.
7 Comments:
Ó Espumante querido, tu sabes que eu gosto muito de ti, mas neste ponto discordamos um bocadinho: eu estou com a Fernanda (eu até me identifico um bocado com ela nesta questão).
Porque se não a lesses já de má vontade, e na diagonal, terias percebido o que ela realmente disse, que foi:
1 - que tinha uma amiga que não iria votar no referendo porque era contra o aborto.
2 - que essa mesma amiga tinha feito pelo menos um aborto com uma bomba de bicicleta.
3 - que essa mesma amiga lhe tinha pedido ajuda para resolver a gravidez da sua empregada.
4 - que essa mesma amiga pagou 400€ pelo aborto da empregada.
5 - que essa amiga era boa pessoa.
6 - que temia que este tipo de boas pessoas constituisse a maioria da população, e que tal como esta amiga, não fossem votar.
jantei com uma amiga com quem não estava há meses. quando já iamos a caminho de um táxi, ela lembrou-se de me dizer, sem sequer eu ter introduzido o assunto, que não votaria a 11 de fevereiro. 'porque não concordo', disse ela.
(...)
tantas boas pessoas que há como a minha amiga. tantas, tantas. temo que 11 de fevereiro prove que são a maioria.
Eu NÃO temo!!!
Au contraire!
Espero até, ansiosamente, que sejam a maioria!...
«Requer serenidade, honestidade política e debate. Sério.»
- Obviamente! Mas, além disso, ou integrado nisso, há que dar a conhecer aquilo que realmente se vive na situação actual. Se é para mudar é porque alguma coisa está mal. Há que perceber aquilo que está mal!!!
luna
Reli o post e tensd razao. Acho que deixo lugar a uma má interpretaçao. Mas o objectivo principal do post está lá. Não gosto de ver discutir os argumentos assim. Nem para um lado nem para o outro.
Beijinho
Anonymous des 03:21
São opiniões
cristina
...mas aí, estamos completamente de acordo!
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