domingo, julho 09, 2006

Aqui e ali, uma saudade


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Contrariamente a muitos dos meus amigos, é nesta altura do ano que eu tenho uma saudade especial de Maputo. É o Inverno, o frio, as neblinas matinais e uma luminosidade resplandecente durante o dia a banharem um mar calmo, muito azul e muito silencioso que nos permite navegar sem estremeções durante vinte e cinco ou trinta milhas até atingirmos os nossos pesqueiros de eleição. O peixe é mais pequeno que no Verão, mas mais abundante. Há também uma família de baleias (quem sabe se sempre as mesmas ao longo dos tempos) que todos os anos se instala no Baixo Danae e por ali se mantém durante praticamente todos os meses de Junho e Julho, até abalarem de novo para as águas frias do Sul. É a altura ideal para se mergulhar, também. A água é mais fria, mas nada que não se resolva com um bom fato de mergulho. Nas marés mortas não há praticamente correntes, sobretudo nos pontos de viragem da maré, pelo que a visibilidade se alarga por dezenas de metros e se “afunda” até vinte e cinco e mais metros.

Foi nesta altura do ano que os irmãos Morgado me desafiaram uma vez em que casualmente nos encontrámos no mar, para parar o barco perto do “Cockburn” e mergulhar com eles. Em cinco minutos me vesti e os acompanhei. O mar ali tem cerca de trinta metros de profundidade que nós descíamos até cerca de metade, porque do fundo elevava-se uma garoupa gigante com mais de duzentos quilos que se abeirava de nós até cerca de um metro e nos observava com curiosidade. Era uma cena de dez a quinze a segundos, após o que tínhamos de vir respirar á superfície, notando que à nossa subida correspondia o regresso da garoupa ao fundo. E mergulhámos cerca de uma dúzia de vezes e por uma dúzia de vezes a garoupa correspondeu á nossa visita, de olhos redondos e boca imensa e sem dentes.

O Rui e o Jorge, irmãos e mergulhadores experientes visitaram a garoupa talvez uma centena de vezes durante dois anos. Durante esse tempo procuraram dar-lhe de comer à mão. A garoupa nunca aceitou, limitando-se a conceder aqueles segundos de convívio de cada vez que se dava a aproximação.

Um dia a garoupa desapareceu. O mar é assim. Nunca é igual por muito tempo. Está em constante mutação e daí eu dizer que das centenas de vezes que saí para o mar, nunca tive duas viagens iguais. Reside aí, talvez o seu maior fascínio. Como tudo na vida, afinal. Será o sortilégio da mudança que produz o fascínio sem o qual poucos de nós saberíamos viver. Tal como aquele peixe enorme que se deve ter cansado de nós e abalou para outras paragens.

E hoje é Domingo, é Julho, eu agora não tenho barco e lembrei-me da garoupa que visitei com os irmãos Morgado
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9 Comments:

At 10:52 da manhã, Anonymous Anónimo disse...

Ainda gostava que me explicassem como é que debaixo de água se sabe que um peixe tem mais de 200 kilos. Mas os pescadores sabem sempre. LOL

 
At 11:04 da manhã, Blogger Nelson Reprezas disse...

Meu caro anónimo

(isto foi postar e apanhar com um comentário)

Eu explico

O peso de um peixe debaixo de água avalia-se mais ou menos da mesma maneira que avaliamos se uma pessoa é idiota ou não por aquilo que escreve. No seu caso, por exemplo, eu não posso ter a certeza que você é idiota. Digamos que, quando muito, faço apenas uma ideia. Ideia que pode estar errada, como é óbvio. Com os peixes é a mesma coisa, nós olhamos e à conta de tantos termos visto, arricamos: - Tem cerca de x quilos. Mas admito que me tenha enganado, já que certamente não terei visto tantos peixes no Índico como idiotas que encontro aqui pela minha terra.

 
At 11:33 da manhã, Blogger Sinapse disse...

... que vontade de estar em Moçambique ...
Há lugares assim, que se entranham!
Claro que eu não tenho com Moçambique a história que tu tens, mas aquelas férias vão ganhando contornos mais vivos à medida que o tempo passa!
... vontade de regressar a Moçambique, com mais tempo ...

 
At 11:39 da manhã, Blogger Sinapse disse...

Esqueci-me dos beijinhos!

Beijinhos, índicos,
Sinapse





(p.s. - coitado do anónimo, levou cá uma descasca! ...)

 
At 6:01 da tarde, Blogger Madalena disse...

Lindo!!!!! Essa coisa de mergulhar é um daqueles fascínios que eu gostava de ter tido coragem para.
Fico-me com o mar à vista que também é lindo!
Beijinhos azuis como sugere o teu texto!

 
At 7:38 da manhã, Blogger Nelson Reprezas disse...

Sinapse

Lembro-me que já lá foste. Vais voltar com certeza :))
beijinhos "maningues"
:)

 
At 7:42 da manhã, Blogger Nelson Reprezas disse...

Madalena

Antes do meu primeiro mergulho eu tinha exactamente a mesma sensação - que jamais o conseguiria fazer. Acabei por fazê-lo um número incontável de vezes.
Há outra coisa que eu SEI que nunca conseguirei fazer: assobiar com dois dedos na boca como fazem os treinadores de futebol... é um trauma que tenho dsde pequenino, mas acabou por se revelar mais fácil mergulhar a 15/20 metros sem garrafas do que levar os dedos à boca e emitir um daqueles assobios estridentes que até muitas mulheres conseguem. Eu NÃO consigo...
Beijinho
:)

 
At 9:39 da manhã, Blogger 125_azul disse...

Acho sempre que um mergulho no Indico é redentor. E nem todos têm a sorte dessa experiência. Beijinho

 
At 1:40 da tarde, Blogger Nelson Reprezas disse...

125_azul
E achas bem. Esse termo está óptimo.
Beijos

 

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