Ar condicionado "À Portuguesa"
A expressão "à portuguesa" engloba um sem número de equívocos. Tanto pode querer significar que é bestial como besta. Ainda que "à portuguesa curta", o bestial possa ser uma besta.Mas, de um modo abrangente, é consensual que o "à portuguesa" tanto pode ser uma coisa boa como uma coisa má. Se o trânsito em Atenas é "à portuguesa", sabemos do que estamos a falar. Se as trapalhadas dos países africanos são "à portuguesa", também nos entendemos. Se, ainda, a corrupção de um qualquer país sul americano fôr "à portuguesa", a coisa fica clara. Vistas bem as coisas, não descortino que o "à portuguesa" possa identificar-me com alguma coisa de bom. Temos as praias, eu sei, os doces conventuais, o clima, a carreira 25 dos Prazeres, a Serra de Sintra e o Covão da Ametade, mas nada disto é "à portuguesa". Porque já são portugueses. São coisa boa, apesar de, Já o contrário é farto em exemplos, como os que referi há pouco. Depois, há as coisas "à portuguesa" que são supostas ser boas mas onde, confesso, não consigo descortinar a bondade. O cozido "à portuguesa" é um exemplo acabado do que digo. Loado como uma das mais expressivas manifestações da cozinha portuguesa, não passa, no meu modesto entendimento, de um amontoado de carnes de segunda qualidade, enchidos, batatas, feijões e couves, metidos a esmo num grande panelão de alumínio e cozido em água fervente... nao vejo bem onde esteja o engenho, o toque de "chef" ou a habilidade que pudessem eleger este prato como um exemplo de "cozinha portuguesa", ainda que aceite possa reflectir um caso de gastronomia "à portuguesa". Tudo ao molho e fé em Deus. Aqui, arrisco-me a que saltem algumas iluminárias a dizer que a água que coze os enchidos é a que coze as couves, que o feijão não sei quê e o que os enchidos não sei quantos. A verdade é que quase todos os restaurantes de segunda em linha ( e não só) em Lisboa têm, pelo menos uma vez por semana, o tal cozido "à portuguesa", servido, a transbordar, num prato onde têm de caber os tais enchidos (industriais), as couves (sem gosto e a escorrer água) e umas carnes cheias de ossos e gorduras aderentes. Ponto final parárafo, antes que me mandem janela fora do Terreiro do Paço. Mas eu queria mesmo era falar do ar condicionado "à portuguesa". Sendo verdade que quase todos os restaurantes e pastelarias em Lisboa dispõem de ar condicionado, também é verdade que este é um bom exemplo do "à portuguesa". Não mentirei se disser que na grande maioria dos restaurantes e pastelarias, o ar condicionado não trabalha mais do que cinco minutos seguidos sem "saltar o quadro" (não sei bem o que isto é, mas é-me dito com um ar de que só os portugueses é que percebem de correntes fracas) e se o empregado é instado sobre o assunto, recebemos como resposta "... já chamámos o técnico há mais de três semanas, o que é que o senhor quer "quelefaça"? Eu, modestamente não quero mais nada que não seja o balsâmico ar condicionado, não quero mais "porra nenhuma" (este porra nenhuma é bem à portuguesa, mas sempre tem a sonoridade dos brasileiros...), mas apetece-me ripostar que há anos que me dizem que o técnico foi chamado há três semanas. E não digo nada ao empregado, afinal o "quéc'olhão" de fazer? Há, ainda, os ares condicionados em que o quadro não salta... mas não fazem frio. Trabalham, fazem brummm. brummm. brummm, mas frio, nada. Se interpelarmos o empregado, a resposta já é diferente, sejamos justos. A coisa fica-se por um "... os filtros estão sujos e há uma fuga de gás... já chamámos o técnico há três semanas, o que é que o senhor "querquelefaça..."? A isto eu chamo ar condicionado "à portuguesa". Tenho de ser justo e referir que há locais onde os aparelhos de ar condicionado trabalham a preceito. Mas nestes, oh! "ironias do Instituto" (acho que me enganei, desculpem, era "ironias da justiça", mas lembei-me daquela repórter da RTP que estava à espera da saída de um arguido do, segundo ela, "Domus Instituto" de Faro... e a coisa "ficou-se-me"!)há sempre uma senhora que tem frio. E um cavalheiro que espirrou. E já dou de barato os senhores com ar de analistas de 1ª classe do Ricardo Jorge, que desatam para ali a falar de ácaros, fungos, alergias, pontas de ar, correspondências, ar demasiadamente seco e supostamente impregnado de ignotos organismos unicelulares... provavelmente como o seu próprio cérebro. "À portuguesa"...
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