As recaídas
Há tempos sofri de uma síndrome alérgica. Mais septo nasal desviado, menos polipos inflamados, habituei-me a conviver com ela. A alergia tinha coisas boas e tinha coisas más. Tão depressa fazia espirrar, o que era óptimo apesar do mau aspecto, como me obrigava a colocar umas gotas com um nome estranhíssimo, mas que me lembro acabar em naso, nasol, por aí... a meio havia um inevitável "corti" qualquer coisa, não fosse esquecermo-nos de que os corticosteroides engordam, provocam disfunção érectil e outras vilanias. Mas eu como eu não engordava por aí alem e a disfunção devia ter uma disfunção qualquer que não permitia que a disfunção funcionasse (digo eu...), lá ia pondo as gotas, no que se tornou uma verdadeira rotina matinal. Era o espreguiçamento alarve, o olhar bovino para o espelho, o beliscão analítico no "pneu" e um xixi a preceito (chamar xixi à primeira micção do dia é inelutavelmente uma liberdade poética). Seguia-se um par de operações que omito, por decoro e em obediência aos mínimos de compostura nesta coisa de blogues. Depois, era a barba... o banho (equipado com a respectiva escova e pasta de dentes, que isto de escovar os dentes só no duche com água corrente, abençoado 25 de Abril que acabou com aqueles inenarráveis copos de plástico), escorrer a água dos pelos com as palmas das mãos contra as coxas, torso e nádegas (isto está a descambar para o pornográfico, mas já acabei esta cena do banho...), apanhar o toalhão ( a Cindy Crawford devia ser parva, saía do banho num anúncio qualquer e enrolava-se a uma mini toalha, palavra de honra que ainda estou para perceber a lógica da coisa, tanto corpo para tão pouca toalha) e esfregar a derme vigorosamente. Até que lá colocava as ditas gotas... naso, cortico não sei das quantas, que me anulavam a erecção dos polipos, alinhavam o septo nasal e me desentupiam para o dia que se me perfilava. Estava a operação montada e dispenso-me dos pormenores das meias, camisa e gravata, por desisteressante, e eu pronto para ir trabalhar. Banhado, barbeado, desentupido, feliz. Ora manda a verdade que se diga que tudo, como tudo, passa. Até as alergias e respectivas terapêuticas. O que sei é que já há algum tempo que não tinha alergias,esqueci-me das gotas e a rotina mantinha-se. Sem gotas. Ao princípio, estranhei. Ao fim e ao cabo não é impunemente que se vive todos os dias com gotas, durante um par de anos, ainda que elas possam ter efeitos secundários indesejáveis. Convive-se e pronto. E eu estranhei, claro. Ao sentimento de perda sobrevindo, contrapuz algum esforço, ordenei as sinapses, exorcizei as meninges, fiz leitura, vi bué de telejornais de Casa Pia, cassetes, pulseiras do PSL, petty entertainement, afinal...passei a ir mais ao cinema (não percam o Fahrenheit, o homem é suíno de formas e de cérebro e tem, com certeza, mau hálito e é um mentiroso compulsivo mas mentiroso tambem era o Jim Carrey, suíno de formas é o Alberto João e mau hálito tem o Guterres e eu farto-me de rir com eles...) e assim acabei com as gotas. Gotas, nunca mais. As tais, As cortico rino blá blá blá . E aqui chegamos ao ponto. Não é que hoje, por qualquer razão que me escapa, dou comigo com novas erecções de polipos? Que olho para o espelho lá da casa de banho do escritório e acho que tenho o septo nasal desviado outra vez? Mas o que é isto? Uma recidiva? Todavia, é Verão... se fose Primavera, podia ser o pólen, Ná... aqui há coisa. Ou é o Bin Laden a espalhar esporos de fungos, bactérias e outras doenças criptogâmicas de destruição macissa, ou foi o Pedro Santana Lopes que mandou pulverizar o Jardim da Estrela para lá transplantar algumas árvores da residência de Monsanto, ou... sei lá porquê... que sei eu... de qualquer modo há que tomar medidas. Urgentes, drásticas e eficientes. Não quero mais alergias, não mais erecções de polipos (não me corrijam, polipos não é exdrúxulo é mesmo grave, eu diria mais, que nem o Dupont... é gravíssimo!). Eu não quero gotas. Quero viver sem gotas. Fui um dependente mas agora... estou "limpo". Tanto eu como as gotas queremos viver na paz do senhor (no meu caso, do senhor da pastelaria do meu bairro que é das mais pacíficas que conheço e onde me chamam senhor "injinheiro" e tudo). As gotas, não estou certo. Mas ia jurar que sim, sossegadas no frasco a que pertencem e certamente não deterioradas (o prazo de validade é imenso e vai lindamente com o rótulo). Mas hoje, espirrei... os polipos incharam... deu-me um "não sei quê" de extremado (entenda-se por um "não sei quê" nas extremidades...) e eu tive umas ganas tremendas de ir ao frasco e de lá trazer umas quantas. Gotas... poucas que fossem, mas que certamente chegariam para me sossegar os polipos. Malditas recaídas...
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