A Terapia da Chuva
Chover em Agosto tem destas coisas. Depois de três jornais (estou impossível, leio tudo...), numa abrangência que vai dos chamados "de referência" ao impagável "24 Horas", ficamos inevitavelmente mal dispostos. Mas como quem corre por gosto não cansa, passemos adiante. E é mal dispostos que podemos sempre ir a Sintra para nos lembrarmos que ela existe. Está lá... e nestes dias de chuva não se faz rogada. Dá-nos a visão salvífica do muito da excelência que este país abençoado pelos deuses e maltratado por nós tem para nos dar. E Sintra é, continua a ser, o exemplo mais vivo disso mesmo. Sobretudo quando, num dia de Verão em que a chuva resolve caír, ela se veste da neblina tipo roupão e chinelos e do romantismo que todos nós teimamos em jogar para canto, mas que se mantem, perene, dentro de nós. E é ao circular por essa neblina, pelo verde húmido das matas e pela arquitectura sui-generis da vila que até nos lembramos dos travesseiros da Periquita, das queijadas do Preto, do leitão de Negrais do fabuloso vinho de Colares (porque será que tão pouca gente o conhece?)das casas de chá que salpicam a estrada. Porque será que nos esquecemos de tudo isto? Porque é que temos de ler tantos jornais e nos interessarmos pelas cassetes roubadas na redacção do Correio da Manhã, da pulseira da sorte de Santana Lopes ou das colisões automóveis da Pipinha Jardim (acidente...), saíndo ela sem um arranhãozinho que se veja (desastre...) Porque é que nos esquecemos de que Sintra está aqui ao lado? Mas eis que a realidade me acorda. Se toda a gente se lembrasse de Sintra, como eu me lembrei hoje, o trânsito deixava de ser caótico para ser... estado terminal da nossa compreensão e capacidade de tolerância. Ainda por cima parece que hoje vai lá desaguar a Volta a portugal. Os carros amontoados pelos passeios e pelas nesgas passaram a estar, eles próprios, bloqueados por viaturas circundantes. Senti o perigo...reagi a tempo. Entre gritaria, algazarra, peitos de pelos ao vento e marialvismos avulso, consegui descobrir uma nesga para poder regressar a casa e fugir da turba-multa. E ler mais jornais. Até que me lembre, de novo, que Sintra é um dos mais nobres e belos locais do mundo. Que pena...
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