A velha questão do copo meio cheio e meio vazio
Às vezes é assim. É preciso puxar da vontade e coragem
residuais e acender o fósforo que há-de atear a fogueira que há-de queimar o
punhado de ilusões que se gera num tempo e num espaço, carinhosamente debruados
num pedaço de vida que nos concedemos. Resistimos, respiramos, mas percebemos
que é preciso dizer «chega» e que não é possível conciliar aquilo que, num determinado momento, se nos depara
inconciliável. E arde tudo. Ficam as cinzas, como resíduo anódino do tempo bom
e do pensamento fértil, mas que não passam disso mesmo, de cinzas. Com a
vantagem de serem um material biodegradável, apesar de conterem recordações
perenes. É, por assim dizer, o copo meio vazio.
Depois há o pragmatismo e o espírito de sobrevivência. Se a
todos os animais foi concedido um robusto sentido de sobrevivência, ao homem foi
concedida a inteligência, uma espécie de vergôntea desse sentimento. A sua
sublime capacidade de pensar permite-lhe um manejo da alma capaz de lhe
proporcionar a antecâmara da renovação e da noção exacta de que a vida
continua. Bem exemplificada aqui pela mulher com frio, que não hesita em tirar
as calças para nos proporcionar um cenário gratificante, enquanto se sujeita a
uma vulgar operação de aquecimento das nádegas, o que lhe há-de trazer o
conforto, prazer e a revitalização do sistema circulatório. É o copo meio cheio. Aquele que, apesar das ilusões tornadas
cinzas na fogueira, sugere um plano de renovação, de «re-existência», que nos
há-de alimentar o corpo e confortar a alma. Por muito altas, abrasivas e
comburentes que se tornem as chamas.
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Etiquetas: cinzas
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