Pronto... e é assim
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O
semipresidencialismo português é uma verdadeira aberração. Consagrado, na forma
actual, pela revisão constitucional de 82, ele constituiu, desde então, a
primeira legalização do aborto – do aborto político, mais propriamente – em
Portugal. Na sua versão primitiva saída da revolução, a Constituição consagrara
um modelo de governo que fora decalcado da Carta Constitucional de 1826: um
chefe de estado com um forte poder moderador, de quem, na prática, o governo e
a sua actuação legislativa dependiam, tanto ou mais do que do parlamento. Com a
revisão de 82 e o Conselho da Revolução regressado à caserna, o chefe de estado
ficou uma espécie de ectoplasma fantasmagórico a quem são permitidas aparições
esporádicas quando está em causa «o regular funcionamento das instituições». Ou seja, de monarca constitucional, o chefe de
estado transformou-se numa versão eleita do Almirante Américo Thomaz. Após a
morte de Salazar, claro. O semipresidencialismo português, desde então,
aprisiona em Belém figuras decorativas que apenas podem ameaçar o governo de
demissão, ameaça que habitualmente consumam no segundo mandato, para relaxar os
nervos e digerir as humilhações que precisaram de engolir para conseguirem a
reeleição. Com o único poder de que praticamente dispõe, o Presidente da
República Portuguesa transforma-se, ao demitir o governo, num player político
activo. porque esse acto envolve um juízo de máxima censura política sobre quem
governa (pôr em perigo «o regular funcionamento das instituições»…), o que o coloca ao lado da oposição, a quem, na
prática, entrega o poder e o país. Por isso, e só por isso, é que Cavaco Silva
não dissolveu ainda a Assembleia da República, como aspira e profetiza o
Professor Freitas do Amaral, o mais astrólogo e quiromante da política portuguesa. Por isso, e só
por isso, é que Jorge Sampaio engoliu Santana Lopes e esperou que o PS mudasse
de liderança antes de provocar eleições antecipadas. E, por tudo isto, porque
tanta perigosa inutilidade concentrada em Belém faz mal à saúde do regime,
torna-se necessário que a CRP determine, de vez, qual a verdadeira matriz do
nosso sistema de governo: ou presidencial ou parlamentar. Por mim, não duvido
que apenas esta última nos servirá. Mas quem quiser um caudilho salvador da
pátria, um Monti graduado em general de cinco estrelas, sempre poderá ficar com
a primeira.
Rui A., aqui
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Etiquetas: Ai Portugal, política bloggers
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