Da maçonaria
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Eu sei que vivo neste século e que, hoje por hoje, pouca coisa me surpreende, já. Mas tenho de reconhecer algum espanto com o fuzoê (é assim que se diz?) que vai por aí por causa da alegada promiscuidade entre a maçonaria e o poder político. Mas por que carga de água toda a gente se mostra admirada com o facto de assuntos de estado, classificados, secretos, serem verbo corrente ou, ao que parece, moeda de troca entre a maçonaria e o poder político? Também me surpreende o facto de toda a gente, de supetão, mostrar um profundo conhecimento sobre a maçonaria, as sociedades secretas, as «lojas», as dissenssões fratricidas. Afinal toda a gente está por dentro e se revela exímio analista do fenómeno das secretas.
Eu não gosto de colectividades. Sou um venerador incondicional do individualismo, da privacidade, da iniciativa da pessoa, sem embargo de quaisquer acções colectivas que visem o bem-estar de outrem, a ajuda, a solidariedade ou quaisquer acções tendentes a minorar a carência ou o sofrimento. Mas a vida é feita de pessoas colectivas e, muitas vezes, não podemos fugir delas. Eu, por exemplo, tive um barco em Maputo e tinha de ser sócio do Clube Naval para o poder arrumar e cuidar. Que me ocorra, foi a única «colecção de gente» a que me senti obrigado a aderir. Mas sei que os portugueses são de uma índole bem diferente. O português que se preza gosta de pertencer a uma comissão de utentes, a um clube de portadores de bigode. A uma irmandade de fumadores de cachimbo, detentores de uma unha comprida ou a um clube de caçadores. A pesca também tem clubes, o futebol, o hipismo, os atiradores aos pratos e aos pombos. Associações são aos milhares, disto, daquilo e daqueloutro, de datas, de inquilinos, de senhorios, de moradores daqui e dali, de alérgicos ao pó, à poeira, aos ácaros, ao chocolate e à lactose…e há as Academias, uma das que me ocorrem, assim de repente, é a Academia do Bacalhau, perante a qual eu tive de apelar aos mais variados subterfúgios para não ter me submeter à confraria (e se gosto de bacalhau…), em Johannesburg. E ele há grupos, também. São conhecidos os grupos de antigos residentes angolanos, moçambicanos, (no caso de Angola, os grupos estão mesmo subdivididos por cidades, regiões ou províncias), os grupos de atiradores especiais, do Grupo de Artilharia não sei das quantas do ano qualquer coisa na Guiné e não sei mesmo se não existe um grupo de ex-moradores do Bairro da Encarnação ou ex-passageiros do Príncipe Perfeito.
Estes grupos e associações produziram, chefes, responsáveis, líderes, enfim, uma hierarquia muito própria de quem não resiste em ir para a cova sem ser chefe de alguma coisa, uma vez na vida. Por vezes não se chega a ser líder, mas ter ganho uma competição do bigode mais revirado a Norte do Mondego ou ter comido o maior número de arrufadas na estação de Coimbra-B pode proporcionar a realização máxima de um cidadão comum que, não fora o bigode e as arrufadas e se arriscaria a falecer no triste anonimato da gente que faz a barba todos os dias e nunca ouviu falar de arrufadas. E há sobas (dos tais grupos africanos) e grão-mestres (mesmo sem ser da maçonaria), há regulados e reinos e há regiões demarcadas. E há vestes, coroas, ceptros e aventais. Medalhas, anéis e diplomas. A Maçonaria não anda muito longe deste cenário. De vestes fidalgas e desígnios nobres, empunhou a liberdade, a fraternidade e a igualdade como estandarte sendo, que, ao que parece, este será o desiderato mais vilipendiado pelos seus irmãos.
Muitos gostariam de pertencer à maçonaria com a mesma convicção com que gostariam de pertencer à Associação Recreativa, Cultural, Beneficente e Social dos Bombeiros Voluntários de Vila Real de Santo António ao Entardecer. Com a vantagem de se tratar de uma confraria secreta, com mais sainete. Para além de que, sabe-se, decorrem vantagens e prebendas e protecção de tal estatuto. Mas outros haverá que, não querendo, a ela têm de se sujeitar.
Por mim, nada tenho contra. Repito: os portugueses gostam de pertencer a qualquer coisa. Porque é que não há-de pertencer à maçonaria? Mas que esta exerça inaceitáveis pressões sobre aqueles que não pertencem ou sobre aqueles que ela acha que a ela devem pertencer ou, ainda, que a maçonaria se torne um autêntico cadinho de interesses, promiscuidade ou espúria conivência, manipulados por «homens de bem» e ao arrepio do interesse ou segurança nacionais é que não. Dêem lá a volta que quiserem mas acabe-se com este treta da maçonaria meter o nariz onde não é chamada. Muito menos onde não é desejada e, notoriamente, se torna lesiva do interesse nacional.
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Eu sei que vivo neste século e que, hoje por hoje, pouca coisa me surpreende, já. Mas tenho de reconhecer algum espanto com o fuzoê (é assim que se diz?) que vai por aí por causa da alegada promiscuidade entre a maçonaria e o poder político. Mas por que carga de água toda a gente se mostra admirada com o facto de assuntos de estado, classificados, secretos, serem verbo corrente ou, ao que parece, moeda de troca entre a maçonaria e o poder político? Também me surpreende o facto de toda a gente, de supetão, mostrar um profundo conhecimento sobre a maçonaria, as sociedades secretas, as «lojas», as dissenssões fratricidas. Afinal toda a gente está por dentro e se revela exímio analista do fenómeno das secretas.
Eu não gosto de colectividades. Sou um venerador incondicional do individualismo, da privacidade, da iniciativa da pessoa, sem embargo de quaisquer acções colectivas que visem o bem-estar de outrem, a ajuda, a solidariedade ou quaisquer acções tendentes a minorar a carência ou o sofrimento. Mas a vida é feita de pessoas colectivas e, muitas vezes, não podemos fugir delas. Eu, por exemplo, tive um barco em Maputo e tinha de ser sócio do Clube Naval para o poder arrumar e cuidar. Que me ocorra, foi a única «colecção de gente» a que me senti obrigado a aderir. Mas sei que os portugueses são de uma índole bem diferente. O português que se preza gosta de pertencer a uma comissão de utentes, a um clube de portadores de bigode. A uma irmandade de fumadores de cachimbo, detentores de uma unha comprida ou a um clube de caçadores. A pesca também tem clubes, o futebol, o hipismo, os atiradores aos pratos e aos pombos. Associações são aos milhares, disto, daquilo e daqueloutro, de datas, de inquilinos, de senhorios, de moradores daqui e dali, de alérgicos ao pó, à poeira, aos ácaros, ao chocolate e à lactose…e há as Academias, uma das que me ocorrem, assim de repente, é a Academia do Bacalhau, perante a qual eu tive de apelar aos mais variados subterfúgios para não ter me submeter à confraria (e se gosto de bacalhau…), em Johannesburg. E ele há grupos, também. São conhecidos os grupos de antigos residentes angolanos, moçambicanos, (no caso de Angola, os grupos estão mesmo subdivididos por cidades, regiões ou províncias), os grupos de atiradores especiais, do Grupo de Artilharia não sei das quantas do ano qualquer coisa na Guiné e não sei mesmo se não existe um grupo de ex-moradores do Bairro da Encarnação ou ex-passageiros do Príncipe Perfeito.
Estes grupos e associações produziram, chefes, responsáveis, líderes, enfim, uma hierarquia muito própria de quem não resiste em ir para a cova sem ser chefe de alguma coisa, uma vez na vida. Por vezes não se chega a ser líder, mas ter ganho uma competição do bigode mais revirado a Norte do Mondego ou ter comido o maior número de arrufadas na estação de Coimbra-B pode proporcionar a realização máxima de um cidadão comum que, não fora o bigode e as arrufadas e se arriscaria a falecer no triste anonimato da gente que faz a barba todos os dias e nunca ouviu falar de arrufadas. E há sobas (dos tais grupos africanos) e grão-mestres (mesmo sem ser da maçonaria), há regulados e reinos e há regiões demarcadas. E há vestes, coroas, ceptros e aventais. Medalhas, anéis e diplomas. A Maçonaria não anda muito longe deste cenário. De vestes fidalgas e desígnios nobres, empunhou a liberdade, a fraternidade e a igualdade como estandarte sendo, que, ao que parece, este será o desiderato mais vilipendiado pelos seus irmãos.
Muitos gostariam de pertencer à maçonaria com a mesma convicção com que gostariam de pertencer à Associação Recreativa, Cultural, Beneficente e Social dos Bombeiros Voluntários de Vila Real de Santo António ao Entardecer. Com a vantagem de se tratar de uma confraria secreta, com mais sainete. Para além de que, sabe-se, decorrem vantagens e prebendas e protecção de tal estatuto. Mas outros haverá que, não querendo, a ela têm de se sujeitar.
Por mim, nada tenho contra. Repito: os portugueses gostam de pertencer a qualquer coisa. Porque é que não há-de pertencer à maçonaria? Mas que esta exerça inaceitáveis pressões sobre aqueles que não pertencem ou sobre aqueles que ela acha que a ela devem pertencer ou, ainda, que a maçonaria se torne um autêntico cadinho de interesses, promiscuidade ou espúria conivência, manipulados por «homens de bem» e ao arrepio do interesse ou segurança nacionais é que não. Dêem lá a volta que quiserem mas acabe-se com este treta da maçonaria meter o nariz onde não é chamada. Muito menos onde não é desejada e, notoriamente, se torna lesiva do interesse nacional.
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Etiquetas: maçonaria
3 Comments:
E também pode ser fuzué. Depende da vontade do freguês...bom quer dizer...isso se o acordo ortográfico não resolver meter o bedelho, porque senão ele estraga-nos mais esta "democracia".:)*
Dulce Braga
Pelo que vejo há várias «opiniães» :)) mas se fenómeno virou fenômeno porque que é que fusuê virou fuzué?
:)*
Nam...nam...nam...não virou nada, que isto não é o vira*.
Isto é só uma questão de opção, de fazer biquinho para o "ê" ou escancarar a boca no "é".
:)))
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