As Pedras do Alemão (Post dedicado)
Pedras do Alemão - Huambo, Angola. De notar a enorme fenda de cima a baixo
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Sempre me intrigou a inverosimilhança de algumas lendas. Talvez a improbabilidade das histórias as guindem, por isso mesmo, ao estatuto lendário.
Mas há uma lenda em Angola que me fascinou particularmente quando um dia, parando junto a um maciço granítico a que se dava o nome de Pedras do Alemão, a cerca de 20 quilómetros da cidade do Huambo, na estrada que levava à Vila Nova, Bela Vista (Catchiungo), Chinguar e Silva Porto (Kuito), indaguei das razões do seu nome. Eu passava todas as semanas junto dessas rochas a caminho de Silva Porto e um dia parei para fotografá-las. Uma mulher capinava a lavra de milho à volta de casa, com uma eficiência notável já que, ao mesmo tempo que capinava, falava com um cigarro aceso na boca e mantinha um bebé às costas atado por um pano e, questionada, disse-me sem hesitação, em «portumbundês»:
- Ali (apontando as pedras) tinha um aremão. Mas era bránco. E o aremão tinha uma mulher que vivia ali mesmo. Mas ela era preto. Um dia o aremão chegou na casa dele e incuntrou a mulher dele que estava com outro homem. Mas o outro homem que era preto. Então o aremão subiu nas pedra e disse. Não pode matar o outro homem nem pode matar a minha mulher porque Deus castiga. Depois o aremão bránco atirou ele das pedras para baixo e môreu.
Esta história (a mulher que capinava a explicar-me a origem da lenda) é verdadeira. Perde um pouco o sabor pela ausência da sonoridade que a enriqueceria bastante. Mas foi o que ela me contou enquanto raspava o capim, falava com o cigarro na boca e sacolejava o bebé às costas.
Mais tarde falei com um jornalista do jornal «O Planalto» (sim, Nova Lisboa tinha um jornal) que me confirmou o esqueleto da lenda. Achei inverosímil que um alemão vivesse com uma angolana mas, mesmo que vivesse, achei pouco crível que ele se chateasse por encontrá-la com outro homem. Sendo que o outro homem era negro, até admito que o alemão vagamente se irritasse e, eventualmente, o esturricasse no forno do pão. Agora que lhe perdoasse, mesmo que para não cair em pecado mortal e, ainda por cima, se atirasse ele próprio das pedras abaixo é que, lá está, me soa a inverosímil. Mas se calhar por isso é que nasceu a lenda. E que as pedras se chamavam (e chamam) Pedras do Alemão, chamavam.
Nota: As Pedras do Alemão eram frequentemente confundidas com as Pedras do Kandumbu, um maciço granítico que também apresentava profundas rachas e fendas semelhantes às das Pedras do Alemão, muito perto e a caminho da Chicala. Kandumbu era, de resto, o nome de uma conhecida «casa de alterne» de Nova Lisboa, mas desconheço se o nome da «boite» terá nascido de alguma analogia com as características das pedras, mas isto sou eu já a dar rédea à minha dirty mind…
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Sempre me intrigou a inverosimilhança de algumas lendas. Talvez a improbabilidade das histórias as guindem, por isso mesmo, ao estatuto lendário.
Mas há uma lenda em Angola que me fascinou particularmente quando um dia, parando junto a um maciço granítico a que se dava o nome de Pedras do Alemão, a cerca de 20 quilómetros da cidade do Huambo, na estrada que levava à Vila Nova, Bela Vista (Catchiungo), Chinguar e Silva Porto (Kuito), indaguei das razões do seu nome. Eu passava todas as semanas junto dessas rochas a caminho de Silva Porto e um dia parei para fotografá-las. Uma mulher capinava a lavra de milho à volta de casa, com uma eficiência notável já que, ao mesmo tempo que capinava, falava com um cigarro aceso na boca e mantinha um bebé às costas atado por um pano e, questionada, disse-me sem hesitação, em «portumbundês»:
- Ali (apontando as pedras) tinha um aremão. Mas era bránco. E o aremão tinha uma mulher que vivia ali mesmo. Mas ela era preto. Um dia o aremão chegou na casa dele e incuntrou a mulher dele que estava com outro homem. Mas o outro homem que era preto. Então o aremão subiu nas pedra e disse. Não pode matar o outro homem nem pode matar a minha mulher porque Deus castiga. Depois o aremão bránco atirou ele das pedras para baixo e môreu.
Esta história (a mulher que capinava a explicar-me a origem da lenda) é verdadeira. Perde um pouco o sabor pela ausência da sonoridade que a enriqueceria bastante. Mas foi o que ela me contou enquanto raspava o capim, falava com o cigarro na boca e sacolejava o bebé às costas.
Mais tarde falei com um jornalista do jornal «O Planalto» (sim, Nova Lisboa tinha um jornal) que me confirmou o esqueleto da lenda. Achei inverosímil que um alemão vivesse com uma angolana mas, mesmo que vivesse, achei pouco crível que ele se chateasse por encontrá-la com outro homem. Sendo que o outro homem era negro, até admito que o alemão vagamente se irritasse e, eventualmente, o esturricasse no forno do pão. Agora que lhe perdoasse, mesmo que para não cair em pecado mortal e, ainda por cima, se atirasse ele próprio das pedras abaixo é que, lá está, me soa a inverosímil. Mas se calhar por isso é que nasceu a lenda. E que as pedras se chamavam (e chamam) Pedras do Alemão, chamavam.
Nota: As Pedras do Alemão eram frequentemente confundidas com as Pedras do Kandumbu, um maciço granítico que também apresentava profundas rachas e fendas semelhantes às das Pedras do Alemão, muito perto e a caminho da Chicala. Kandumbu era, de resto, o nome de uma conhecida «casa de alterne» de Nova Lisboa, mas desconheço se o nome da «boite» terá nascido de alguma analogia com as características das pedras, mas isto sou eu já a dar rédea à minha dirty mind…
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Etiquetas: angola, coisas bonitas, lendas
5 Comments:
Ainda bem que tem os bránco, com o cabeça bom, pra lembrá e contá essas história do nossa tera linda!:)*
Dulce Braga
Quase que me apeteceu dizer que Nova Lisboa tinha «O Planalto» (o jornal) só para chatear o pessoal de Silva Porto, Sá da Bandeira e Benguela que não tinham nenhum... mas contive-me :)))))))
:)*
Tu sempre acabas por dizer!:)*
Por uma quesão de rigor :-)
(1953) Começa a publicar-se o "Jornal da Huila", sob a direcção do Comandante de Marinha, Venâncio Guimarães Sobrinho;Jornais - A história da Imprensa em Angola data de 1845 a publicação do Boletim Oficial seguido do surgimento da Imprensa Livre. A imprensa industrial e profissional, surge em Luanda a 16 Agosto 1923 com o jornal a Província de Angola. Na verdade, a grande referência da Imprensa Industrial e Profissional foi onze anos antes, em 1912, quando foi fundado o JORNAL DE BENGUELA por Manuel Mesquita com tipografia própria...
http://www.info-angola.ao/index2.php?option=com_content&do_pdf=1&id=152
Depois do comentário acima, estou com Esperança :)), que ainda apareça aqui alguma referência a um jornal bieno!
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