quarta-feira, maio 11, 2011

Post ao acaso



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Sou homem, já fui rapaz, sou quase velho, já fui mais gordo, mais magro, só não fui mais alto, mas já fui bem mais baixo. Já amei, já fui amado, odiei e fui odiado, bati, fui batido, já ri, já chorei, já brinquei, mas também já levei muita coisa a sério. Trabalhei muito e também fingi, estudei criteriosamente mas também ousei exames mal preparado. Tive sorte, tive azar, já ganhei à roleta, já perdi às moedas, andei na tropa, sofri, vi e fiz sofrer. Conheci todos os estados civis que um homem pode ter. Solteiro, casado, viúvo e divorciado. Amancebado, unido de facto e muitas vezes me uni sem fato também. Amizades coloridas, outras mais escuras mas todas elas muito ricas. Tenho filhos, dos quais um é rapaz. E até netos, imagine-se, quem diria? Já rezei, já ajudei à missa badalando criteriosamente uma coisa esquisita que deitava fumo e fazia os fiéis baixar a cabeça e ainda hoje sei rezar a missa toda em latim. Mas também já quase bati num padre e já beijei uma freira. Já fiz um retiro, aliás meio retiro, chateei-me e vim-me embora. Já viajei, conheci países ricos, pobres, tórridos e gelados. Percorri savanas africanas chapinhando o suor das costas da camisa contra o encosto do carro e percorri montanhas geladas no conforto da chauffage de carros de alta cilindrada. Bebi café creme e comi bolos de mel em estâncias de ski alpinas e comi matete ou pirão com caril com os dedos, a saber a repelente para mosquitos. Pesquei espadartes e tubarões em alto mar, no Índico, mas também apanhei carpas do tamanho de um dedo mindinho, no Mondego. E fanecas em Matosinhos. Tentei fazer ski… mas só tentei, não cheguei lá. Já ski aquático, fiz sem dificuldade. Mergulhei sempre sem garrafas e cacei barracudas, xaréus, corvinas reais e garoupas gigantes, por entre cenários magníficos de cor e de formas, sobretudo cores que descobri e nem sabia que existiam. Também cacei à bala, quando estava na tropa, mas uma vez matei um antílope e não consegui dormir nessa noite, porque fechava os olhos e via de imediato aqueles olhos escuros, brilhantes, enormes, lindíssimos, na cabeça de um autêntico bambi gigante que eu já vira sofrer tanto quando eu era miúdo. Nunca mais cacei. Fiz corridas de automóveis. Fiz ralis e ganhei taças, fiz velocidade dois anos e cheguei a ser uma revelação. Num acidente aparatoso, uma rádio noticiou a minha morte. A expressão dos meus dois filhos pequeninos, ainda só havia dois, quando me viram, fez com que eu nunca mais corresse. Joguei râguebi durante dois anos e cheguei a internacional. Conheci gente de mil sítios e de mil deles fiquei amigo. Falo bem algumas línguas. Já me embebedei, fumei dois charros e fiz uma angioplastia porque tinha as coronárias torcidas pela nicotina dos trinta a quarenta cigarros que fumava por dia. Já tive um acidente de carro grave em que ia matando toda a família. Já me morreu gente querida. Já me nasceu gente amada. Já plantei uma acácia e uma vez plantei até um feijoeiro que havia ser determinante na minha vida, porque o meu pai viu e achou que o meu futuro estava nas ciências agrárias e agronómicas. Nunca escrevi um livro nem matei nenhum leão, mas um dia pode ser que aconteça. O livro, porque matar um leão é coisa que eu nunca entenderei, é uma coisa assim tão estranha como os portugueses que querem continuar a ter o Sócrates como primeiro-ministro. Vivo por aqui e continuo na descoberta de tanto ainda que tenho a certeza que haverei de encontrar e viver. Vivo numa terra lindíssima, de clima ameno, gente escovada e beijo o mar todos os dias na marginal. Curiosamente, mantenho uma sensação muito vívida de amar e ser amado. Também sei de gente que me detesta. Faz parte. Na verdade eu poderia continuar a escrever páginas de tanta coisa que fiz e vivi. Mas a questão é que tenho dedicado pouca atenção ao «Espumadamente» e o Sócrates tira-me do sério. Farto-me de escrever sobre ele. E com pesar verifico a generalidade e facilidade com que toda a gente lhe chama mentiroso compulsivo. É que o homem é meu primeiro-ministro, que diabo. Mas, como dizia, este Espumadamente já foi bem mais interessante. E agora anda quezilento por causa daquela criatura. Daí que me deu para fazer um post sem saber bem o que ia dizer. Espero que valha mesmo a condição de post. Porque se não valer, publico-o na mesma. Ando a dar confiança demais àquela rapaziada do PS.


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27 Comments:

At 8:09 da tarde, Anonymous Pedro Reprezas disse...

O post mais simples e interessante que eu lí do Espumadamente! Bravo Pai e avô! Um abraço do filho distante que tem interesse no Socrates!

 
At 8:57 da tarde, Blogger ana disse...

gostei muito do teu "intimismo" mas só não percebi aquela do Sócrates ser o teu primeiro-ministro.

 
At 9:06 da tarde, Blogger Nelson Reprezas disse...

Ana

Ana, não me «misinterpretes» :)))) ele é meu primeiro-ministro embora eu não tenha culpa nenhuma porque jamais votaria nele. Mas tens razão. Quem não me conheça até é capaz de pensar que estou chateado por chamarem mentiroso ao homem. Para os que me lêem habitualmente, já se torna bem claro que se houvesse um campeonato de «chamadores de mentiroso» a Sócrates eu estaria sempre bem colocado para ganhar :)))

 
At 10:27 da tarde, Anonymous IL disse...

O que é que te deu? :D

 
At 11:09 da tarde, Anonymous Anónimo disse...

valeu sim senhora :)
APaula

 
At 11:47 da tarde, Blogger Dulce Braga disse...

Pois eu fico daqui torcendo, sob risco de ser apedrejada, que ainda haja muitos momentos “socratianos” em tua longa vida, que te façam ficar “vividamente”* inspirado, para escrever páginas e páginas de tanta coisa que farás e viverás!:)))

 
At 1:01 da manhã, Blogger Luísa A. disse...

Gostei muito de ficar a saber QUASE tudo, Nelson. ;-D

 
At 3:52 da manhã, Blogger Maria do Rosário disse...

Achei de uma sinceridade fantástica.
Você tem uma trajetória de vida interessante! - Enquanto uns e outros não saem de sua zona de conforto porque somos nós que pagamos a conta.

PS. Matar um leão por dia é mais ou menos assim: O seu dia precisava ter trinta horas para você fazer metade do que precisava fazer pra ontem. Jã passei por essa fase.

 
At 6:28 da manhã, Blogger Nelson Reprezas disse...

Pedro

Ó Pedróca, fécha-messa bóca :))

 
At 6:29 da manhã, Blogger Nelson Reprezas disse...

IL

Deu-me para aqui. Não está crystal clear? :)

 
At 6:31 da manhã, Blogger Nelson Reprezas disse...

Apaula
Fico sem saber se este "A" é nome ou é artigo, mas agradeço na mesma :)

 
At 6:34 da manhã, Blogger Nelson Reprezas disse...

Dulce

Torce, Dulce, torce. «Vividamente» mas torce :)*

 
At 6:46 da manhã, Blogger Nelson Reprezas disse...

Luísa

Há pessoas cuja argúcia lhes faz rir dos «quases» :))))) Quando a argúcia se alia ao engenho para fotografar bem, comentar melhor, estabelecendo nos comentários feixes de linhas paralelas (essas, as que por mais que se prolonguem nunca se encontram...) e elas se tornan convergentes e, depois de agitar qb, conseguem relacionar aquilo tudo, o que fotografam e o que escrevem, aí, então, os «quases» perdem
«quase» toda a relevância e tornam-se «quase» acessórios. Ou uma mera figura de retórica.
Beijos :))))

 
At 6:52 da manhã, Blogger Nelson Reprezas disse...

Maria do Rosário

Obrigado pela sua habitual gentileza. Mas, Rosário, matar um leão todos os dias? E horas a menos? Eu tenho o dia ocupado, mas arranjo sempre tempo para espiar o que escreve. E vejo que tem sempre tempo, também, para imaginar e urdir receitas e arranjos de mesa(que devem ser deliciosas) caminhando ao longo das prais da sua terra que a Rosário nunca deixa de cantar :))

 
At 7:48 da manhã, Blogger Pedro Barbosa Pinto disse...

Boa!!!! Só falta rodar o botão à telefonia...a TSF também lhe anda a dar cabo da figadeira! :)))
Essa "rapaziada" toda "há-dem" de perceber que já ninguém lhes liga, para irem pregar para outra freguesia.

Um abraço

 
At 5:14 da tarde, Blogger Nelson Reprezas disse...

Pedro Barbosa Pinto

Eles «hadem» perceber... mas nunca mais percebem, reio que os parta :))))
Abraço

 
At 5:56 da tarde, Blogger MargaridaCF disse...

"confesso que vivi"...e não foi a vida dos outros!

 
At 2:35 da tarde, Blogger estouparaaquivirada disse...

Não falar do "dito cujo" já é uma aposta ganha!!!
É sempre bom passar por aqui.
bfs

 
At 4:13 da tarde, Blogger Nelson Reprezas disse...

papoila

Nem me fales papoila, com o apagão do blospot perdi TODOS os comentários a este post...

 
At 10:05 da tarde, Blogger Maria do Rosário disse...

Justo um post mais comentado do espumadamente, que nos últimos tempos quase esqueceu de sonhar!
Reafirmo que gosto do meu amigo assim.
Mas me recuso matar leão:))

PS. Também perdi uma poesia, a única que não escrevi antes de postar.

Bjo

 
At 3:51 da tarde, Anonymous Anónimo disse...

:)*

 
At 2:42 da tarde, Blogger LurdesMartins disse...

Mas o apagão não tirou nenhuma beleza a este post, que o é em toda a sua condição. A magia da vida é mesmo essa, falar de tudo e de nada.
Adorei ler este post!
Beijinhos

 
At 4:35 da tarde, Blogger Nelson Reprezas disse...

papoila

E eu gosto que passes, papoila, um beijinho

 
At 4:36 da tarde, Blogger Nelson Reprezas disse...

Maria do Rosário

Também não antevejo a Rosário matando leão :)

 
At 4:37 da tarde, Blogger Nelson Reprezas disse...

Anónimo

Perdi mesmo :(*

 
At 4:37 da tarde, Blogger Nelson Reprezas disse...

Lurdes

Sempre gentil... ou foi por o post incluir fanecas de Matosinhos :))))

 
At 1:18 da tarde, Blogger LurdesMartins disse...

Estava-se mesmo a ver, n'era?! ;))

 

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