segunda-feira, julho 25, 2005

Ó Homem, Vá-se Embora



[487] - Nunca me esqueci desta frase, pronunciada por Mário Soares. Era o tempo do amigo em cada esquina, do Sol da humanidade, das canções de amigo, das consciências políticas e dos polícias que eram uns tenebrosos instrumentos do negrume fascista. Era o tempo em que os políticos se impunham pelo pregão da liberdade, da solidariedade e o nosso mundo girava à volta disso mesmo. Políticos que, passado o seu tempo de matriz liberatória dos fracos, oprimidos e vítimas do obscurantismo, bem melhor teriam feito se tivessem aprendido a compaginar as suas convicções com a realidade de uma sociedade diferente, ainda com trombos de pecado a circular nas veias mas indubitavelmente mais justa, mais basta e desfrutando de uma qualidade de vida jamais conseguida.

Mas não foi assim. Da conquista da liberdade passou-se, rapidamente, ao autoconvencimento dos nossos políticos garantes da liberdade, da sua imprescindibilidade no fenómeno político, ao paternalismo de atitudes e, a um curto passo, à arrogância. A mesma arrogância com que Soares usou uma vez a tal frase "Ó homem vá-se embora" para um agente de autoridade que se limitava a cumprir o seu dever. Esta atitude é típica de uma esquerda em pânico que sente que a sua legitimidade se dilui no tempo e na história e se tornou obsoleta e anacrónica e que necessita desesperadamente de re-encontrar razões da sua própria existência. O polícia escorraçado simbolizava os maus, os opressores, numa altura em que Soares já deveria ter percebido que a sociedade portuguesa beneficiaria de um posicionamento mais pedagógico, como por exemplo, perceber que a autoridade é um instrumento vital da democracia.

Se Mário Soares não percebe isto, e eu acho que não, que não percebe mesmo, é tempo que se lhe diga agora, com firmeza: - Ó homem, vá-se embora.

7 Comments:

At 2:58 da tarde, Blogger Pitucha disse...

Eu já me considero uma privilegiada por ter estudado um império, "vivido" uma revolução, perdido o império, sobrevivido um prec, ganho uma democracia e acabar na UE. Mas era pequenina em algumas destas fases... Posts como este fascinam-me: ele disse isso? A um polícia? Onde, quando, como? E não foi preso, nem nada?
Que sorte heim!
Conta mais, por favor.

 
At 10:20 da tarde, Blogger Nelson Reprezas disse...

Pitucha
Não foi há tanto tempo assim. Eu não posso precisar o momento e o local, mas tratava-se de uma função qualwuer onde ele estava presente, salvo erro já como presidente, o que agrava o dislate. Há um polícia que procura controlar as pessoas e ele sai-se com esta. Infelizmente não sou jornalista, não tenho arquivos, mas a frase foi amplamente noticiada na altura. Talvez que algum blog de algum jornalista leia este comentário e situe o episódio com mais rigor.

 
At 10:39 da tarde, Anonymous Anónimo disse...

Sabes, quando faals com tanta convicção da candidatura de Cavaco Silva e desancas até mais não na de Mário Soares, há algo que me vem logo á memória: uma frase proferida por Jacques delors, quando os cargos que ocupava ainda eram minimamente visíveis: ele disse um dia, a propósito deste nosso ex-primeiro-ministro e pretendente-a-futuro-presidente que se tratava de um "amanuense". Acho que isto resume exemplarmente a questão

 
At 11:05 da tarde, Blogger Nelson Reprezas disse...

Odala

Peço-te que leias o meu blogue de ponta a ponta (se te deres a esse trabalho...) e, depois, me digas quando e onde eu mostro convicção na eventual candidatura de Cavaco Silva. Repara lá bem...
Mas já agora... e a propósito de uma opinião de J Délors, que tu referes, seria interessante saber a opinião de muitas figuras da política internacional sobre Mário Soares.
Mas, repito, não me parece que alguma vez eu tenha feito aqui a apologia de Cavaco Silva.
Tenho-me limitado a dar curso à profunda irritação que me causa a pobreza de um país como o meu, em valores políticos, cujas melhores opções parecem ser exactamente Cavaco e Soares. Mas, se tiver quer ser assim, que venha o amanuense. Na minha modestíssima opinião.
Beijinhos para ti.

 
At 11:14 da tarde, Blogger Nelson Reprezas disse...

Odala
(outra vez)
... e já agora, boa amiga, em que é que o facto de Cavaco Silva ser um amanuense, na óptica de Délors, mitiga a argumentação que tem aparecido aqui pela Blogos contra Soares? E argumentação por gente certamente com mais traquejo político do que eu, que funciono "de ouvido" e por mera sensibilidade? E por memória, também. Por outras palavras... porque Cavaco é um amanuense, deverei votar em Soares e esquecer as "tropelias" continuadas do senhor?
Outro beijinho

 
At 1:12 da tarde, Blogger Madalena disse...

Cá para mim esta candidatura, ou pior, os apoios a esta candidatura, baseiam-se só e quase só no anticavaquismo primário.
Mario Soares fez oitenta anos em Dezembro e foi badalado, até não se poder mais, que este político de envergadura (reconheço-lha!) se iria afastar activamente da cena política. Eu achei bem. Acho que a lucidez é isso mesmo: sair em grande e pela porta grande. Parece-me que Soares está a esculpir a imagem que eu não gostaria de ter nem sequer de uma pessoas vulgar, quanto mais de uma figura histórica.
Mas isto é o que eu penso, eu que não conto para estas coisas. E desta vez não contam eles com o meu voto, presumo!
Beijinhos, Espumante!

 
At 9:39 da tarde, Blogger Nelson Reprezas disse...

Madalena
O meu conceito sobre a figura de Mário Soares, como político e como homem é muito diverso do teu. Teria tanto para dizer que não cabe aqui... pode ser um dia, quem sabe, eu possa transmitir-te uma opinião calma, pensada e factual. A que eu tenho de Mário Soares.
Beijinho grande

 

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