A sorte que os pais tinham, quando eu tinha sete anos
Um dia o meu pai sentou-me na caruma de um pinhal que havia
entre a Encarnação e o Aeroporto, hoje transformado em saída da 2ª Circular
para a A1. Era Domingo e ele costumava levar-me a mim e aos meus irmãos àquele
pinhal onde passámos muitos Domingos saudáveis.
Lembro-me que nesse dia estava uma Lua cheia enorme e bem
visível, apesar de ser dia. Eu teria os meus sete anos e o meu pai, que do mais
trivial facto fazia uma espécie de conto de encantar, explicou-me o que era a
Lua. Porque é que ela ali estava. Porque que é cerca de uma hora depois já
não estava no mesmo sítio. Deu-me uma noção dos movimentos de rotação e
translação, sem precisar de usar estes palavrões. Disse-me que na Lua não havia
ar (recordo que esta foi uma passagem da história que me fez confusão, não
havia ar? Mas como é que podia?) e portanto não se podia viver lá. E continuou
explicando mais coisas. Em linguagem simples falou-me das marés, uma coisa que
já me havia feito confusão na praia do Guincho porque umas vezes via-se aquelas
rochas que hoje ainda lá estão e outras não se via e ele explicou-me. Não
precisou de falar de Newton, da maçã nem do palavrão gravidade, mas conseguiu
explicar-me o fenómeno e eu lembro-me que percebi.
O meu pai era assim. Repito que ele tinha o condão de fazer
uma história de encantar de qualquer facto trivial. E desde esse dia em que ele
me falou da Lua acho que fiquei a perceber razoavelmente o que era, porque a víamos
e porque é que as rochas da praia do Guincho apareciam e desapareciam.
O meu pai tinha muito jeito, eu sei, Mas, aqui para nós, ele
tinha a grande vantagem de nessa altura não haver psicólogos que exortavam os
pais a explicar às criancinhas porque é que Trump ganhava eleições. Havia
coisas bem mais interessantes para explicar aos filhos. E mais úteis. Tanto que
em 1969, ia eu a caminho do Bailundo (uma terra angolana que alguns conhecem)
visitar uns amigos e ouvi na rádio que um astronauta acabara de chegar à Lua. Lembro-me
bem, era um jovem, talvez tivesse ainda fresca a história que o meu pai me
contara no pinhal da Encarnação. E ao ouvir a notícia lembrei-me da história. E
ontem, ao ver a Super Lua lembrei-me muito do meu pai.
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Etiquetas: coisas bonitas
2 Comments:
Simplesmente EXCELENTE!
ftavares
Olá Nelson,
Adorei a história.
bjs
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