sexta-feira, abril 24, 2009

Às vezes compensa...


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Otelo Saraiva de Carvalho já pouco significará para os mais jovens. Para aqueles que se lembram da preponderância da sua acção, do vitupério pronto contra todos aqueles que ousassem sequer “pensar” e da normalidade e convicção com que achava que poderia eliminar uns quantos reaccionários no Campo Pequeno, esta promoção não terá grande significado em si. Mas vai fazer recordar como é estranho este país e como sinuosas são as linhas com que se cose. Porque a verdade, para os mais esquecidos, é que este homem foi acusado de vários crimes, concretamente dezassete assassinatos em circunstâncias nunca devidamente esclarecidas e tudo acabou numa espécie de amnistia que passa por lavar com esponja um dos mais vergonhosos capítulos do nosso processo revolucionário. A alguns dos implicados, alegadamente aqueles directamente envolvidos em “crimes de sangue”, foi-lhes facultada a possibilidade de se instalarem em países a salvo da justiça portuguesa. Aí foram recebidos, emulados como exemplo para as revoluções locais e entretinham-se a esquematizar revolucionariamente quintas e cooperativas junto de camponeses. E se as quintas poucos meses depois deixavam de dar hortaliças (e ananases, lembro-me bem…) isso não apagava o “brilho revolucionário” da sua presença em algumas circunstâncias sociais, como eu pessoalmente tive ocasião de assistir, episódios que serviram para eu entender melhor o “fenómeno revolucionário”. Hoje não sei bem o que resta destes “ananaseiros” revolucionários e cooperativistas e que Deus os guarde longe, mas de Otelo sei que está cá e que se dá até ao luxo de questionar a “injustiça” da sua promoção.

É um caso que nunca perceberei bem e se manterá na bruma de alguns mistérios nunca devidamente explicados aos portugueses. Ficará, outrossim, a ideia de que este homem esteve directamente implicado numa série de crimes de morte e que Mário Soares terá tido um papel importante na lavagem da sua imagem, através de uma mal explicada amnistia, se bem lembro em nome do “momento revolucionário da época” e da desejada harmonia entre os portugueses. Mais palavra menos palavra é o que tenho na memória. Amanhã, possivelmente, vê-lo-emos a exibir o seu garbo de Abril numa celebração a propósito.


Ler esta história do assassinato do pai de Manuel Castelo Branco do 31 da Armada. A não perder também alguns dos comentários ao post.

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