quinta-feira, abril 10, 2008

Os votos dos despedidos


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Por estes dias, mais duas fábricas, pelo menos as que mereceram tratamento mediático, anunciaram o fecho das portas, atirando mais umas centenas de trabalhadores para o desemprego.

Independentemente do drama pessoal que o desemprego constitui, há que registar o tom com que estas notícias são dadas. Sobretudo quando se trata da RTP. A verdade é que na maior parte dos casos, o fecho de algumas fábricas cumpre com todos os preceitos legais, incluindo os valores das indemnizações, quase sempre acima do estabelecido por lei. Mas isso não obsta a que as notícias não sejam dadas imprimindo um cunho de malfeitoria dos empresários em particular e do capitalismo em geral. As perguntas de reportagem (as mais estúpidas) são feitas aos trabalhadores em via de ser despedidos, as respostas são-lhes colocadas na boca, os sindicatos iniciam o seu cortejo de banalidades já coçadas pelo tempo e pela realidade dos tempos actuais e tudo se conjuga para alimentar a noção de que todos estamos a ser explorados por uma corja de vilões que nos vêm sugar o sangue. Outra vertente é a desgraça. O choro, as lágrimas (sentidas, certamente) sobretudo de mulheres que durante anos trabalharam para a fábrica que vai fechar, são exploradas até ao tutano e uma achega importante ao cenário descrito.

Nada disto ajuda no presente e, muito menos, no futuro. Talvez os únicos beneficiados sejam alguns sindicalistas que ao conseguirem subir as indemnizações de, por exemplo, 1,8 para 1,9 salários por mês mantêm a razão de ser da sua existência, sem se curar de saber até que ponto eles próprios não terão contribuído para a decisão dos empresários. O resultado é que as fábricas vão fechando, os portugueses vão ficando cheios de raiva dos capitalistas, os capitalistas cada vez têm menos paciência para nos aturar e o cenário está criado para os artífices da sociedade nova que a esquerda acha que Portugal deve ter.

O governo deveria ter uma palavra serena e racional neste fenómeno. Defender, sempre, os interesses dos empregados despedidos, actuar exemplarmente sempre que se verifique dolo ou situações indevidas mas nunca alinhar no choradinho nacional. Porque ao fazê-lo, contabiliza votos de despedidos, mas esses são dos tais votos semelhantes a uma vitória de Pirro. Às tantas, o governo poderá estar a braços com uma montanha de votos que não lhe servem para nada. Porque, entretanto, foi tudo para a rua. Literalmente.

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