Mais do mesmo
[1879]
Lisboa está triste, suja e estragada. Vê-se nas ruas, nos passeios onde pontapeamos as pedras da calçada, nos prédios surrados pela poeira permanente das obras eternas fixadas na humidade das paredes, nos toldos de entrada dos restaurantes e pastelarias que não devem ser lavados há dezenas de anos, nos próprios carros cobertos de pó, na visão de muitas dezenas de gruas ocupadas com obras eternas, obras que nunca acabam, mesmo depois de feitas, porque ficou a faltar o passeio, porque leva meses a remover entulhos. Nos contentores que, fiquei a saber, podem permanecer meses nos passeios onde multam os carros, porque os contentores, pagando uma licença camarária, podem permanecer por tempo indefinido em cima dos passeios. Nos buracos pequenos rodeados com uma cerca de bandeirinhas brancas e vermelhas (de perigo?), nas extensas áreas esventradas e com estaleiros que mais parecem construções definitivas de obras que suponho ser do metropolitano e que se arrastam por meses, anos, tudo isto mergulhando-nos numa rotina da laxismo, desmazelo, porcaria, incómodo e fealdade. A este cenário acresce o trânsito caótico, o numero elevado de carros a monte pelos passeios, o estacionamento em segunda fila, as descargas a toda a hora e em todo o local. Há, ainda, os restaurantes de todos os dias, de comida sempre igual, barata mas imutável na sua escorrência de gorduras processadas em recintos sem extracção de fumos, sobreaquecidos e sujos. As viatura de transporte público barulhentas e apinhadas de gente e há, sobretudo, uma espécie de sentimento de inevitabilidade na destruição e decadência de uma das belas e luminosas cidades do mundo.
Há ainda um grupo de doze candidatos a presidente desta cidade. Nós ouvimo-los e, no fundo, sabemos que nenhum deles vai conseguir seja o que for. Uns porque são totalmente inaptos para o que se lhes é exigido, outros, porque poderiam até ter capacidade para o lugar mas parecem totalmente enredados em histórias confusas, obscuras, dúbias e que tresandam a cumplicidades. Histórias, mal contadas, umas, disfarçadas, outras, puramente escamoteadas outras e neste capítulo, o poder instalado (e nunca a expressão teve tanto cabimento) bate todos os outros candidatos aos pontos. É a zona ribeirinha, o plano da baixa, é o aeroporto onde o nr. 1 diz que vai ser zona verde e o nr. 2 diz que vai ser uma zona de negócios, é a mais completa confusão de indícios de promiscuidade política que ressuma um grave desrespeito pelos cidadãos.
Domingo vamos ter um novo presidente, Nós sabemos que nada vai mudar e que o governo alargou a sua base de influência. E Lisboa vai continuar na mesma. Ou pior, com a enxurrada de obras novas que vem aí, ainda as velhas não acabaram.
Nota: A situação do Terreiro do Paço chega a embaraçar aqueles que, como eu, ainda sentem e vivem a cidade de Lisboa. Já me tem acontecido ser questionado por gente que vem a Lisboa com alguma periodicidade e que me pergunta porque é que “aquilo” está em obras há uma série de anos. E eu, com o pudor próprio de quem cá vive, lá vou dizendo que os túneis não sei quê, que os solos não sei quantos, em vez de dizer que “aquilo” é um dos mais acabados exemplos da nossa incapacidade, ineficiência e promiscuidade de interesses. Mas um dia destes, digo.
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Etiquetas: eleições intercalares, Lisboa
6 Comments:
Assino por baixo. Não deixa de ser impressionante o mau estado da cidade e a impotência que sentimos perante tais problemas que se tornaram quase impossíveis de resolver.
Um abraço.
-A melhor decisão da minha vida foi o dia em que comprei casa fora de Lisboa, uma cidade cada vez mais ingovernável, caminhando inexoravelmente para a sua ruína. E o pior é que não se vislumbram propostas capazes de inverter a marcha, estes 12 candidatos francamente, uns não têm ideias, outros só querem embargar qualquer ideia que surja, os restantes a única ideia que têm é a de enriquecer o seu próprio curriculum vitae, ambicionando outros voos.
Acima de tudo, penso que é a educação (falta dela) e a miséria humana que leva a este estado de coisas em Lisboa.
As pessoas usam carros em vez de transportes alternativos.
O lixo é depositado onde calha.
Os cafés são sujos porque os donos o são.
As fachadas estão a cair, aí sim, por causa da lei das rendas que não permitiu actualizações durante décadas.
bekx
Choca-me, sobretudo, o desleixo...
antónio de almeida
É a solução de muita gente. Morar fora de Lisboa. Mas mete pena...
cadeira do poder
A lei das rendas contribuiu, realmente, para muito do que se passa...
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