África deles
Quando ontem vi Francis Obikwelu a “voar” para a meta dos 100 metros dos JO de Atenas, fui sacudido por um ligeiro frémito de emoção. Aquele jovem ia ganhar uma medalha e, à noite, ia dormir com a bandeira nacional. Olhando para os outros corredores , reparei que todos eles eram negros, o que me fez pensar e recordar o continente africano. Conheço vários países africanos e vivi mesmo em alguns deles. E, sem querer, o rosto de Francis, o sorriso estampado naquele jovem de dentes muito brancos, remeteu-me de imediato para a visão que mantenho incólume dos bandos de miúdos que, seja nas grandes cidades seja no mato profundo daqueles países, vivem a correr e a rir. Muito. Nas cidades, quando estacionamos os carros e somos rodeados por revoadas de putos a pedir para “guardar o carro”, no mato, quando lhes pedimos uma informação sonbre um local, uma loja, qualquer coisa e eles, com a própria inocência a rir, nos dizem “é ali” e voam para “ali”. Às vezes, perguntamos se é longe e eles dizem, a rir, “é longe, mas é perto”. E continuam a correr e a rir. Em relação aos negros americanos a coisa é diferente. São, regra geral, de raíz urbana e estão perfeitamente ajustados a uma realidade e cultura diferentes. Mas o Francis... Nigeriano que fugiu da Nigéria e descobriu uns pais em Portugal, tinha estampado no rosto a tal alegria de correr e tenho a certeza que quando dedicou a vitória aos deficientes portugueses, ninguem lhe encomendou o sermão. Porque também ele, na sua Nigéria, país que também conheço e onde não encontro razões muito válidas para nos rirmos, também ele correu, também ele riu, nem sonhando que um dia a sua corrida haveria de servir para uma medalha para Portugal e que este País tinha uma bandeira em que ele se haveria de enroscar para dormir. E hoje, quando me desloco a Angola e Moçambique e revejo aqueles bandos de crianças a rir e a correr, vem-me à ideia que Deus, quando era pequenino e há muitos mundos atrás, (vamos esquecer o big-bang e Darwin, por um momento...) devia brincar à apanhada, a correr e a rir, nas florestas e savanas do mais místico, mágico e estonteantemente belo mundo, dos mundos que Ele fez... e devia estar a rir-se, com certeza.
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