Os meus carros (8) Peugeot 404 SW
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Interrompi a minha lista de carros em fins de Abril. Hoje retomo-a, ainda que com uma espécie de falsa partida, a razão sendo o facto de que a partir daqui, durante muitos anos, não tive carro próprio. Tive vários carros de serviço (de resto, já antes tinha tido alguns, mas como paralelamente ia tendo carros próprios, descrevi-os) nos anos seguintes.
Mas este, uma prestimosa, espaçosa, reliable e robusta station, apesar de company car, foi o meu primeiro carro na África do Sul durante dois anos. Talvez por isso me recorde bem da matrícula, NPN 36339, que era um Pinetown number plate. Nesta Peugeot fiz a minha primeira longa viagem pela África do Sul, ainda na ressaca da saída de Angola. Foi entre Johannesburg e Durban, cidade onde fui colocado pela empresa que me deu trabalho e nela cabiam todos os meus pertences, incluindo a família, já que tudo o resto jazia algures (vim a saber depois) na avenida 5 de Outubro de Nova Lisboa, no bojo de um camião que rapidamente foi saqueado, depois de morto o motorista.
Este carro não foi só um meio de transporte. Foi, também, uma espécie de refúgio e confidente. O local onde me sentia rodeado de coisas pessoais, os óculos escuros, a carteira, os cigarros e isqueiros, o mapa de estradas, a garrafa de água, num meio inicialmente hostil, por estranho, e com o qual tive de lidar durante um período de tempo. Neste carro calcorreei praticamente toda a antiga província do Natal e Zululand… a North Coast até Pongola, depois Dundee, Vryheid, Newcastle, Glencoe, Estcourt (a terra do bacon!...), Mooi River, Pietermaritzburg e muitas outras cidades, em trabalho – basicamente pesquisa e experimentação de novos herbicidas industriais e selectivos para relvados e campos desportivos. Nele me sentava durante muitas centenas de quilómetros, ouvindo o rádio, fumando tabaco Virgínia (fui-me habituando, a par das coffee drinks, em vez de um bom AC e de uma boa bica…) e perguntando-me como é que uma pessoa passa de uma vida parametrizada no habitat que criou com gosto e denodo e de repente lhe dizem que perdeu uma guerra qualquer e sente que temos que baralhar e dar de novo. Na altura ainda não dava para irmos para a televisão reclamar contra a direita liberal e berrar e exigir que o Estado nos desse um emprego, por isso este carro ganhou alguma relevância no arquivo da minha memória. Pensei tanto dentro dele, que muitas vezes tinha até a sensação que ele me compreendia – só não me dava respostas porque não sabia falar. Mas, pelo menos, acomodou-me sempre por forma a regressar a casa safe and sound. E ainda me proporcionava bons momentos de fim-de-semana para a família, levando-nos a locais novos e bonitos da área como o maciço de Drakensberk, Midmar Dam, Howick ou a cosy Umhlanga Rocks (pronuncia-se Umxlhanga). Merece, por isso, destaque especial.
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Etiquetas: Os meus carros
2 Comments:
uma graça este post. E uma nostalgia
este emociona...tantos meninos da geração à rasca deveriam ler isto...
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