quinta-feira, maio 07, 2009

"Vánessa", limpaste o cu?


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Domingo passado fui ao Zoo, por imperativos de afectos familiares. Vi bichos civilizados, razoavelmente cuidados, bem instalados e indiferentes ao burburinho da turba humana que, vagueando pelos recintos dos “animais” ia, entre outras coisas, discutindo o que é que iam fazer para o jantar ou qualquer outro tema de “importância relacionada” com a visita.

Havia muitas famílias, como é natural. O pai, a mãe e os filhos pequeninos, o que é natural e bom sinal. Curiosamente poucos imigrantes, o que, à partida daria pano para as mangas de uma crónica bem “arrancada” do Dr. Pureza. Como denominador comum, uma forma de comunicação entre o conflito, o mal-estar e uma aflitiva falta de educação entre o pai para a mãe, a mãe para o pai, os pais para os filhos e estes para os pais. De um modo geral há uma degradação muito vincada na forma, nos modos e na substância da comunicação das famílias. Dificilmente ouvi pais a comentar os animais que observavam ou a ler os dísticos onde poderiam encontrar informação interessante para transmitir à prole. O grosso da comunicação situava-se entre a necessidade de comprar um “corneto”, o que é que havia para o jantar e ver as horas para não perder as focas e os “gólfinhos”. E depois, era a linguagem. Sinceramente que não me apercebia da forma como muitos portugueses comunicam hoje entre si. No meu tempo de miúdo já havia palavrões, mas sabíamos que eram palavrões. Deles se guardava a necessária reserva e respeito pela nossa condição de gente em ”processo educacional”, ao contrário de hoje quando, amiúde, oiço palavrões entre pais e filhos com a mesma naturalidade com que ouvia (muitas vezes) maridos a perguntar às mulheres o que é havia para jantar logo à noite. Palavrões, no mínimo termos ordinários que, parece-me, perderam por completo o sentido da inconveniência e da deseducação pela forma corrente como são utilizados.

Exemplificando, estava eu sentado a comer um “corneto” (lá está…) e a descansar das caminhadas, quando ouvi uma mãe, mulher de não mais que 30 anos, perguntar à filha de cerca de seis anos que tinha ido à casa de banho pública: “Vánessa”, limpaste o cu?

Olhei para uma neta de três anitos e julguei ver nela uma expressão de estranheza. Ou desconhecia o termo ou achou que a linguagem que lhe outorgavam em casa era demasiado pobre e que passava ao lado de expressões tão banais como o acto a que a mãe da “Vánessa” se referia.

Fiquei a penar neste episódio. Claro que devo poder pensar em mil causas para este efeito. Mesmo assim, deprime-me pensar na desconfiança que tenho que a mudança de padrões materiais que assolou a sociedade portuguesa, bem assim como o discurso de algumas luminárias que se empenharam na formação de um português novo estão na razão directa da naturalidade com que uma mãe pergunta a uma filha de seis anos, alto, claro e bom som, se já limpou o cu.

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9 Comments:

At 11:10 da manhã, Anonymous Anónimo disse...

Em 86 desloquei-me a Lisboa. Aproveitei a viagem para fazer uma espécie de romagem de saudade percorrendo sítios por onde tinha andado no final da década de 60, procurando reencontrar pessoas que também já há muito não via.
Fui a Algés - S.A.D., onde estive com o meu ex-treinador de natação de L.M. - Eurico Perdigão. Finalizado o treino, começou a miudagem a deixar a piscina em direcção aos balneários. É então que se ouvem três impropérios seguidos, encadeados uns nos outros. O Perdigão não perdeu tempo: passou à repreensão verbal, lembrando o autor que talvez não gostasse de ouvir um qualquer companheiro a falar daquele modo diante da sua irmã. O rapazinho, com alguns 9/10 anos, meteu o rabinho entre as pernas e lá foi à vida dele. Foi então que ouvi ao Perdigão uma declaração de que ainda não me esqueci: "No vosso tempo, os miúdos eram muito mais educados. Agora, sou frequentemente obrigado a chamadas de atenção desta natureza".
Serve este arrazoado todo para lhe dizer que essa degradação, que tão bem retrata, já vem de há muito tempo. Mas, bem pior que isso, é o facto de parecer ser "chique" falar mal e depressa.
Sendo que as modas vão e voltam, aguardemos pelo regresso da moda da boa educação.
Cila

 
At 11:14 da manhã, Anonymous Anónimo disse...

Permita-me ainda contar-lhe um outro episódio a que assisti, há cerca de 30 anos, no Mercado do Bolhão.
Uma família constituída por pai, mãe e filho. O rapaz foge à vigilância e começa a trepar uma rede. A mãe apercebe-se e diz-lhe, alto e bom som: "Sai daí, seu FDP!"
No comments - JH.
Cila

 
At 1:28 da tarde, Anonymous Anónimo disse...

não seria Bánessa?
eheh

 
At 7:16 da manhã, Blogger Nelson Reprezas disse...

CilaMais do que os palavrões, o que choca é o nível do diálogo...

 
At 7:16 da manhã, Blogger Nelson Reprezas disse...

AnónimoNão, era Vánessa, mesmo

 
At 7:51 da manhã, Blogger Madalena disse...

Lol lol lol. Quem te mandou ir ao Zoo?!

 
At 9:49 da manhã, Blogger Nelson Reprezas disse...

MadalenaGrandfatherhood oblige. E tu não perdes pela demora. Aproveito para te enviar um grande beijinho pelo casamento do teu filho. E um grande abraço para ele. E para o pai, também, claro. Ando há dias para te congratular mas depois a coisa passa-se e eu vou fazendo figura de malcriado. :))
beijinhos e perabéns.

 
At 3:28 da tarde, Blogger Carlota disse...

Loool! Mas tens a certeza que o que ouviste foi mesmo limpaste? É que esse nível geralmente é acompanhado do limpastes...
Eu compreendo perfeitamente o que queres dizer e estou 100% de acordo contigo.
Cá em casa, não se usam palavrões. Nem linguagem rasca. Até já bani a expressão "o gajo" ao meu marido quando percebi que o Migas a repetia. E claro que expliquei ao Migas que não deve dizer "o gajo", que é feio. Deve antes, no limite e se tiver mesmo de ser, usar "o tipo".
Os palavrões, o Migas conhece-os. Não adianta escondê-los. Já lhe expliquei o que querem dizer, mas disse-lhe que só as crianças mal-educadas é que os dizem e que eu não lhe admito que os utilize.
Quando vou a Portugal, noto que pessoas que até deveriam ter um certo nível, não têm a noção da linguagem que utilizam quando estão crianças ao pé. Sobretudo quando o assunto é futebol ou quando se trata de um incidente no trânsito. Sendo assim, não admira que os miúdos sejam malcriados.

 
At 7:52 da manhã, Blogger Nelson Reprezas disse...

Carlota

És capaz de ter razão. Deve ter sido limpastes, com certeza. Eu é que já estava tão entupido (umas horas a ouvir pérolas não é pera doce...) que já nem reagia :)
Repito, mais do que as palavrões (e o citado nem sequer é palavrão) chocou-me a baixaria de nível no diálogo de pais para filhos.

 

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