Dias da Criança

[401] - Eu não gosto dos «dias de». Os dias da árvore, do não fumador, da mãe, dos fumadores de charuto e dos amigos da pinga. Acho que são uma expressão política (ainda por cima correcta) de celebração de coisas ou pessoas pelas quais, frequentemente, não temos respeito nenhum.

A criança, por exemplo. Todos os dias deveriam ser dias dela. De que serve organizar umas festarolas de escola, creches ou institutos sociais se, no dia seguinte e em muitos desses sítios de celebração, vamos violentá-las de novo, violá-las e roubar-lhes o que elas têm, quiçá, de mais precioso e que é a própria inocência, que há-de ser moldada à nossa imagem e semelhança e os há-de tornar um de nós? Hoje é dia da criança que amanhã vai ser abusada ou violentada. Faz algum sentido?

Celebrar o dia da criança deveria ser uma aposta no desenvolvimento de um povo que passasse a saber mais e melhor como formar e amar uma criança. Dar-lhe um chupa ou um peluche hoje e violentá-la amanhã é de uma enorme hipocrisia e sinal dos tempos.

Bem hajam todas as crianças deste mundo e que esse mundo lhes não pese demasiado no futuro. São os votos sinceros de um homem que ama as crianças, que gerou e criou três e que ainda hoje é, ele próprio, um puto. O puto que gosta de ser. Como expressão da sua alegria de viver, apesar de, e como vontade genuina que todos as crianças do universo pudessem ser felizes.